Da Tribuna da Internet
Marcelo Odebrecht parecia ter certeza da impunidade
Carlos Newton
Desde o início da Lava Jato, muitos dos principais envolvidos
julgavam que seria possível anular as investigações por vícios de
origem, da mesma forma como já aconteceu em outras importantes operações
da Polícia Federal, que acabaram sepultadas por erros cometidos por
delegados ou agentes, como a Satiagraha e a Castelo de Areia.
Eles acreditam que conseguiram o mesmo efeito da impunidade do
banqueiro Daniel Dantas, que na operação Satiagraha conseguiu se livrar
de uma sentença de 10 anos de prisão. Na época, ele até ironizou a
Justiça e declarou só se preocupar com a primeira instância, porque “lá
em cima eu resolvo”. Referia-se, é claro, aos tribunais superiores.
Diante dessa perspectiva, empreiteiros relutaram em fazer delação
premiada, o ex-diretor da Petrobras Renato Duque chegou a processar o
antigo colega Paulo Roberto Costa, operadores do esquema também achavam
que poderiam escapar impunes, a certeza da impunidade prevalecia.
Pouco a pouco, porém, foi surgindo uma nova realidade, com o Superior
Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal mantendo as decisões
de primeira instância e deixando os envolvidos mofando na cadeia antes
mesmo de serem julgados, coisa rara na Justiça brasileira. E as delações
foram aumentando.
A ODEBRECHT INSISTE
Renato Duque acabou jogando a toalha, assim com muitos outros
envolvidos, mas o principal empresário da construção civil, Marcelo
Odebrecht, continuou cultivando o sonho da impunidade. Muitos meses
antes de sua empresa ser denunciada, Marcelo Odebrecht já preparava um
esquema preventivo. Segundo a Polícia Federal, com base em uma auditoria
realizada em Curitiba, partiu do empresário o golpe de plantar um
aparelho de escuta ilegal dentro da cela do doleiro Alberto Youssef,
para que fosse encontrado e anulasse as investigações.
Simultaneamente foram cooptados o delegado Mário Renato
Castanheira Fanton e o agente Dalmey Fernando Werlang, que passaram a
dar declarações de que o equipamento estava operante e tinha sido
plantado na cela por ordem da Superintendência da Polícia Federal de
Curitiba. Com isso, criou-se uma grande confusão.
NA CPI, A SEGUNDA FASE
Simultaneamente, em Brasília entrava no circuito o deputado federal
Aluísio Mendes (PSDC-MA), ex-agente da PF e hoje integrante da CPI da
Petrobras, que passou a propagar que sindicância que apurou o grampo na
cela de Youssef tinha sido “criminosa” e poderia ensejar a anulação da
operação, citando os exemplos da Satiagraha e da Castelo de Areia.
Mendes é autor do requerimento para tomada de depoimento de Dalmey
Fernando Werlang, agente da Polícia Federal, supostamente responsável
pela instalação do grampo na cela de Youssef. Mendes diz haver “fatos
contundentes” que poderiam questionar a primeira sindicância feita pela
PF sobre a questão.
O deputado não esperava que o Ministério Público Federal entrasse em
ação e denunciasse criminalmente o delegado Mário Fanton e o agente
Dalmey Werlnag por calúnia e difamação, por terem apontado a existência
de grampos ilegais na cela do doleiro. Eles são acusados de se
associarem para desestabilizar as apurações e tentar algum tipo de
nulidade legal da Lava Jato.
MARCELO, O MANDANTE
No relatório que pediu o indiciamento, a Polícia Federal aponta como
figura central desse suposto plano justamente o empresário Marcelo
Odebrecht, que ainda reluta em fazer delação premiada. Pode ser que
tenha outros trunfos na manga, mas o fato é que ele já está preso desde o
início de julho e será julgado pelo juiz Sérgio Moro, porque não tem
foro privilegiado. Como diz Daniel Dantas, é aí que mora o perigo.