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(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 2 de abril de 2021

BOLSONARO APROVA ISOLAMENTO E QUARENTENA NO COMBATE AO NOVO CORONAVÍRUS

Sexta, 2 de abril de 2021

Aldemario Araujo Castro
Professor
Advogado
Mestre em Direito
Procurador da Fazenda Nacional
Brasília, 2 de abril de 2021

            O Presidente Jair Messias Bolsonaro defende expressa e formalmente o isolamento e a quarentena como medidas para o combate à disseminação do novo coronavírus. A afirmação anterior está documentada, com a assinatura do Chefe de Estado, de Governo e da Administração Pública Federal, em pelo menos dois documentos públicos.

            No dia 30 de janeiro de 2020, por meio do Decreto n. 10.212, o Presidente da República promulgou a nova redação do Regulamento Sanitário Internacional (2005). Esse normativo prevê a adoção de medidas ou regimes de isolamento e quarentena em situações específicas de comprometimento da saúde pública.

            Segundo o Regulamento, isolamento “significa a separação de pessoas doentes ou contaminadas ou bagagens, meios de transporte, mercadorias ou encomendas postais afetadas de outros, de maneira a evitar a propagação de infecção ou contaminação”. Já a quarentena “significa a restrição das atividades e/ou a separação de pessoas suspeitas de pessoas que não estão doentes ou de bagagens, contêineres, meios de transporte ou mercadorias suspeitos, de maneira a evitar a possível propagação de infecção ou contaminação”.

            No dia 6 de fevereiro de 2020, o Presidente da República sancionou (e assinou) a Lei n. 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. O referido diploma legal “dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019”. A Lei n. 13.979/2020, em seu artigo terceiro, estabelece que (destaques inexistentes no original):

“Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, as seguintes medidas:

I – isolamento;

II – quarentena; [...]

III-A – uso obrigatório de máscaras de proteção individual; [...]

VI – restrição excepcional e temporária, por rodovias, portos ou aeroportos, de:

a) entrada e saída do País;

b) locomoção interestadual e intermunicipal;

VII - requisição de bens e serviços de pessoas naturais e jurídicas, hipótese em que será garantido o pagamento posterior de indenização justa”.
           

             As definições legais de isolamento e quarentena praticamente repetem as presentes no Regulamento Sanitário Internacional (2005).

            Portanto, o Presidente da República reconhece explicitamente as medidas de isolamento, quarentena e uso de máscaras de proteção como viáveis para o combate à propagação do novo coronavírus. Também reconhece que as autoridades competentes podem adotar as referidas medidas. Admite a restrição à locomoção de pessoas como medida sanitária e a requisição de bens e serviços privados como ação eventualmente necessária.

            A assinatura do Presidente Bolsonaro, com a famosa caneta Bic, embora podendo, não foi usada para vetar os dispositivos legais mencionados. Quem veta manifesta discordância. Quem sanciona aponta concordância. O Chefe de Governo optou, corretamente, pela sanção, pela concordância, pela aprovação.

            Uma palavra acerca do lockdown. Ele não está expressamente previsto no Regulamento Sanitário Internacional (2005). Também não figura explicitamente na Lei n. 13.979/2020. A tradução do inglês para o português encontra correspondência nas palavras “confinamento” e “bloqueio”. Mas não é o confinamento ou bloqueio próprios da quarentena, considerados como relativos ou parciais. No lockdown temos um confinamento ou bloqueio total (ou quase total) com impedimento de movimentação das pessoas (fechamento de vias e locais públicos e privados), salvo em casos extremos. Deve ser utilizado quando a quarentena não é suficiente ou respeitada e os níveis de propagação da doença combatida persistem crescentes.

            Assim, não parece correto qualificar as ações de isolamento, quarentena e toques de recolher noturnos, atualmente observados em inúmeros Municípios, Estados e Distrito Federal, ante o momento mais crítico da pandemia do novo coronavírus, como medidas de lockdown. Entretanto, o avanço na deterioração do atual quadro sanitário pode reclamar providência dessa envergadura, preferencialmente como decorrência de amplo entendimento entre o Poder Público (federal, estadual, distrital e municipal) e a sociedade civil organizada. Até porque o rol de providências elencadas no mencionado artigo terceiro da Lei n. 13.979/2020 é meramente exemplificativo (atente-se para a cláusula “entre outras”).

            Uma das facetas inafastáveis do amplo entendimento social referido, agora ou num ambiente de lockdown, consiste no equacionamento da situação dramática dos brasileiros mais pobres ou vulneráveis. Dois conjuntos de iniciativas precisam ser articulados: a) auxílios financeiros realizados pela União e complementados pelos Estados, Distrito Federal e Municípios e b) uma ampla rede de coleta e distribuição de donativos pelos setores mais abastados da sociedade.   

            Por fim, já disse e repito, não me convence a “conversa” da exaustão de recursos públicos. A manutenção de um auxílio financeiro decente para quem precisa, durante a pandemia (e talvez depois dela, na forma de renda mínima), pode buscar recursos em quatro frentes: a) endividamento público (boa parte das maiores economias do mundo possuem Estados bem mais endividados do que o brasileiro); b) aumento de receitas (majoração seletiva da tributação sobre bancos, aplicações financeiras, patrimônios volumosos e diminuição de benefícios fiscais e subsídios, a título de exemplos); c) redução de despesas (cortes criteriosos e socialmente justos) e d) emissão de moeda (afastados os dogmas da inviabilidade e inadequação, mesmo de forma transitória).
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As opiniões expressas pelo autor no texto acima, não necessariamente coincidem com as do Blog Gama Livre.