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(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Getúlio Vargas. Uma revisão necessária

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Segunda, 24 de agosto de 2015
Da Tribuna da Bahia
Geraldo Pereira
Na data de hoje, há sessenta e um anos, o saudoso presidente Getúlio Vargas foi levado ao suicídio pelas forças mais reacionárias, que, a serviço do imperialismo americano dispondo de uma imprensa escrita, falada e televisada, ontem como hoje, na acepção da palavra, numa campanha caluniosa até então nunca vista.
Quando atingimos uma certa idade, ela nos faz rever os acontecimentos, pessoais ou não, tornamo-nos proprietários de uma percepção mais ampla, de um poder de análise mais apurado. Sentimos que é verdadeira a sabedoria popular quando afirma que o tempo é o remédio inexorável para todos os males.
Levei grande parte da minha vida, bem mais de meio século, espinafrando Getúlio Vargas, quando não havia motivo, eu criava um pretexto. Escrevi artigos e mais artigos sempre mostrando a face criminosa da sua ditadura, tendo à sua frente o então Capitão Filinto Müller, chefe de polícia do DF, ex-integrante da Coluna Prestes, da qual foi expulso por roubo e covardia.
Na calada da noite a polícia de Filinto Müller retira da casa de detenção Olga Benário Prestes, mulher de Luiz Carlos Prestes: Olga estava grávida de 7 meses, foi metida no porão de um navio de carga, sendo entregue de presente à Alemanha Nazista de Hitler, internada num campo de concentração onde deu a luz a uma menina, sendo depois assassinada na câmara de gás da prisão. Hoje, a filha do produto do amor de Prestes e Olga, Anita Leocádia Prestes, é professora catedrática de História na Universidade do Rio de Janeiro. Esse crime da ditadura Vargas eu não poderia jamais perdoá-lo. Todas as vezes que o nome do ditador era citado, eu citava o assassinato de Olga e espinafrava Getúlio, que, como Presidente poderia ter impedido o embarque de Olga.
Chefe de Polícia da Ditadura, o capitão Filinto Müller tinha sido, como já escrevi, expulso da Coluna Prestes por motivo de roubo e covardia, era nazista, gozava de prestígio com Eurico Gaspar Dutra, Ministro da Guerra e com Góis Monteiro, chefe do Estado Maior do Exército, mandava mais do que o seu superior o Ministro da Justiça. Com um deles tinha discutido violentamente e há muito não cumpria suas ordens, não sei se com Agamenon Magalhães ou se com Macedo Soares. A coisa foi feia. O Ministro deu-lhe ordem de prisão. O grave incidente chegou ao conhecimento do presidente Getúlio Vargas, que ficou num dilema: sustentar a autoridade do seu Ministro, demitindo Filinto Müller, ou apaziguar o caso para não ferir outros interesses? Getúlio decidiu demitir Filinto Müller e meses após demitiu o Ministro.
Certa tarde um saudoso e respeitável colega, vendo-me fazer uma violenta intervenção verbal, na sede da ABI, sobre o assassinato de Olga, chamou-me a um canto e disse-me: “Você é um jornalista sério, como tal não pode falar sem conhecimento, procure ler o processo de Olga, ele está nos arquivos do Supremo Tribunal Federal em Brasília”. Minhas verdades sobre Getúlio começaram a ser questionadas. Meses após, um outro amigo, o companheiro David Capistrano Filho, na época prefeito de Santos, num dia 24 de agosto, ao me ver, veio ao meu encontro e disse: “Geraldo Pereira (era assim que ele me chamava), li seu artigo de hoje sobre Getúlio, você precisa refazer seu pensamento sobre ele”. Numa palestra que proferi em Belo Horizonte, no Encontro Nacional dos Trabalhadores Hoteleiros, meu fraterno companheiro Francisco Calasans Lacerda, com argumentos irrespondíveis aparteou-me diversas vezes, mostrando quanto foi valiosa a Ditadura de Getúlio para os trabalhadores.
O Grande Oscar Niemeyer, companheiro querido, sempre que o assunto era Getúlio, falava com simpatia sobre o seu governo, realçando o trabalho de Gustavo Capanema à frente do Ministério de Educação e Cultura. Certa tarde, após um gostoso almoço em casa de mestre Barbosa Lima Sobrinho, no bairro de Botafogo, na cidade Maravilhosa, ele com os seus 102 anos de idade e de dignidade, fixou-me, e, com os olhos cansados pela vigilância em defesa da nossa Pátria, declarou-me: “Sabe, Geraldo, cada dia que se passa eu acordo mais Getulista. Getúlio Vargas foi o único presidente que realmente defendeu o Brasil e olhou para o trabalhador”.
Outra grande figura que me fez mudar o pensamento sobre Getúlio, foi Celso Furtado, o filho mais ilustre que a Paraíba produziu, ele, uma década mais velho do que eu, depois de me ouvir por mais de 20 minutos, deu a sentença definitiva: “Geraldo, nossa geração foi educada para odiar Getúlio”.
Carlos Lessa outro mestre da Economia, ex-presidente do BNDES, ex-reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, me falava da importância de Getúlio no desenvolvimento nacional.
Heitor Manoel Pereira, meu saudoso companheiro do Partido Comunista, da década de 40, entrevistado por mim, na sede da AEPET – Associação dos Engenheiros da Petrobras, que ele presidia com raro brilho e dedicação, foi incisivo com relação aos sentimentos patrióticos e nacionalistas de Getúlio.
Nas muitas vezes que estive com o saudoso Cavalheiro da Esperança, Luiz Carlos Prestes, nunca o vi com ódio rancoroso de Getúlio, dizia-me sempre que Getúlio foi o melhor quadro da burguesia. Sem dúvida alguma, Filinto Müller foi o grande responsável pelas violências, torturas e mortes durante a ditadura de Getúlio, ditadura em que Getúlio com extrema habilidade, conseguiu permanecer como presidente, Presidente Ditador.
Uma análise daquela época me permite dizer que o Presidente da República, Getúlio Vargas, sob certos aspectos, era prisioneiro das Forças Armadas, principalmente do Exército, do seu Ministro da Guerra General Eurico Gaspar Dutra e do chefe de Exército General Góis Monteiro, ambos simpatizantes de Hitler, eram anticomunistas declarados.
Com o término da Segunda Grande Guerra Mundial, ocorrido em abril de 1945, o nazismo de Hitler e o fascismo de Mussolini foram militarmente derrotados. Da Itália, vitoriosos regressam os pracinhas (militares que retornaram da guerra). Getúlio Vargas, em 19 de abril de 45, assina o Ato anistiando todos os presos e exilados políticos. Os comícios retornam às praças públicas, depois de 8 anos sem liberdade. No momento em que o governo Vargas, vai ao encontro da democracia e da liberdade, afrontando a Nação os generais Eurico Gaspar Dutra, ministro da Guerra e Góis Monteiro, chefe do Estado Maior do Exército, juntos com o brigadeiro Eduardo Gomes, líder militar da Aeronáutica, em 29 de outubro de 1945, dá um golpe militar em Getúlio Vargas, depondo-o da Presidência da República. Aquele golpe preparado contra Getúlio em 1937 foi transferido para 1945. Getúlio admirava muito Luiz Carlos Prestes, e foi por ele convidado para chefiar a Revolução da Aliança Liberal, que o levou ao poder, em 1930.
Governava o Rio Grande do Sul, quando a seu convite recebe Prestes, em setembro de 1929, no Palácio Piratini. Prestes estava exilado na Argentina. O encontro durou duas horas. Getúlio, depois de ouvir Prestes atentamente discorrer sobre os problemas do País, declarou: “O Senhor tem a eloquência da convicção”. Foi acertado o envio de mil contos de réis, para a compra de armas. No final do encontro, ao se despedir de Prestes, com o braço no seu ombro, Getúlio disse-lhe: “Fique tranquilo, você não vai se decepcionar comigo”.
Na Argentina, Prestes recebe oitocentos mil pesos uruguaios, cerca de oitocentos contos de réis. “Fiquei num drama: O que fazer com o dinheiro? É o problema do pequeno burguês: devolvo, não devolvo? Comprar a mim, ele não me compra. Acabei depositando o dinheiro num banco. Foi usado em 1935, para a compra de armas”, nos diz Prestes, no livro Prestes – Lutas e autocríticas. Em 1935, Prestes usou esse dinheiro na compra de armamentos para derrubar o governo de Getúlio, com a Revolução da A.N.L. – Aliança Nacional Libertadora.
Em 1937, foi a vez dos integralistas, de Plínio Salgado, tentarem um golpe contra Getúlio, tomando de assalto o Palácio Guanabara. O presidente e os seus familiares dormiam quando o tiroteio começou. Recorro a um personagem que foi testemunha e vítima do “assalto”, a filha de Getúlio Vargas, Alzira Vargas do Amaral Peixoto, no seu livro ‘Getúlio Vargas, meu pai’: “Papai, pelo menos senta, não fica por aí, servindo de alvo e logo em frente a janela”. Alzira telefona: Filinto Müller atendeu logo e declarou que “assim que fora informado do ataque havia mandado uma tropa de choque, da Polícia Especial, já devia ter chegado...”. “Falei com o Chefe de Polícia novamente, confirmou o prévio envio de tropas e espantou-se que não houvesse chegado ao seu destino”. “Falei com o General Góis Monteiro, chefe do Estado Maior do Exército, que me disse nada poder fazer, porque também estava cercado em seu apartamento”. “Falei com o Sr. Francisco Campos, ministro da Justiça, que transmitia, através do telefone, palavras de solidariedade admirativa e passiva”. “Entrei no gabinete de Papai que continuava às escuras e onde se haviam concentrado as pessoas que estavam desarmadas. Hesitava ainda, escolhendo as palavras, quando a metralhadora recomeçou, uma bala solitária entrou zunindo dentro do gabinete, em direção à cadeira em que Papai costumava sentar para escrever e estraçalhou a encadernação de vários livros, na estante que ficava por trás dele. No dia seguinte, a perícia verificou que havia sido atirada do alto de uma árvore, perto da janela”.
Não se tem notícia de um ditador que tenha olhado mais para os trabalhadores do que Getúlio. Deu-lhe: 1931 – A Lei da Sindicalização – um sindicato por categoria; 1932 – Jornada de 8 horas; Carteira de Trabalho; 1933/36 – Os institutos de aposentadoria; 1939 – Cria a Justiça do Trabalho; 1940 – Salário Mínimo; 1943 – Cria a CLT;
No seu governo a Nação ganhou: Companhia Vale do Rio Doce – privatizada no governo do apátrida Fernando Henrique Cardoso; Companhia Siderúrgica Nacional – privatizada; Petrobras – 40% das suas ações foram vendidas na Bolsa de Valores dos Estados Unidos, no governo do apátrida Fernando Henrique Cardoso; BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.
Estive no Supremo Tribunal Federal pesquisando todo o processo de expulsão de Olga Benário Prestes, tirei cópia do mesmo. Foi a Suprema Corte, como era chamado o Supremo Tribunal Federal, que autorizou, por unanimidade, a entrega de Olga, grávida de 7 meses aos nazistas. O presidente da Suprema corte era o ministro Ataúlfo de Paiva.
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