Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Brasilianas

Quarta, 16 de novembro de 2011 
Por Ivan de Carvalho
Duas pessoas possivelmente com olhos de aves de rapina, que os têm de extrema eficiência, estão surpreendentemente se comportando como cegos em tiroteio. O ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, do PDT, e o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, do PT.

             1. O primeiro, de acordo com o noticiário, ouviu da presidente Dilma uma orientação no sentido de desafiar e confrontar a mídia, que vinha veiculando e levantando denúncias contra ele, mas num sintoma de que talvez esteja também com problemas de audição, mira na direção errada e lança desafio à autoridade da presidente da República, confrontando-a na medida em que diz que é “indestrutível”, que “a Dilma não vai me tirar” e que só sai do ministério “abatido por bala e bala forte”, porque ele, Lupi, é “pesadão”.

Caneta, assinatura da presidente, tudo isso seria uma futilidade. Mas um Colt 45, ah, aí vamos respeitar.

No entanto, ante outra bronca presidencial, desta vez por intermédio da ministra-chefe da Casa Civil, senadora licenciada Gleisi Hoffmann (que, como afirmam da presidente, também adoraria dar ou mesmo transmitir broncas), o ministro Lupi pede desculpas à presidente e faz uma declaração pública abrasadora (e abraçadora): “Presidenta, eu te amo”.

A nação aguarda, emocionada e ansiosa, o próximo capítulo.
2. Enquanto isso, também em Brasília, desenrola-se outra novela, com indicação de horário – como a anterior – para lá de meia noite. O personagem principal é o governador Agnelo Queiroz, que, como o ministro, emerge do meio de muitas denúncias. Ou submerge no meio delas, tanto faz.

Uma das denúncias é a de que, quando era, representando o PC do B, o dirigente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) – veja o leitor a responsabilidade da coisa, já que o órgão fiscaliza a qualidade de alimentos e medicamentos e os licencia, entre outras funções – teria recebido uma propina de R$ 50 mil. R$ 45 mil em dinheiro e mais uma transferência (a prova material) de R$ 5 mil, no dia 28 de janeiro de 2008, paga por Daniel Tavares, que trabalhava como lobista da União Química.

A Folha de S. Paulo de ontem conta uma história. Na quarta-feira da semana passada, Agnelo Queiroz, hoje do PT e governador de Brasília, disse que podia provar que fizera apenas um empréstimo pessoal de R$ 5 mil a Daniel Tavares e que este, com a transferência, pagara o empréstimo. A Folha questionou quais eram as provas que tinha, mas o governador do DF não respondeu. Depois, por meio de sua assessoria, voltou à versão anterior: “O que o governador disse é que, de modo geral, há provas de que ele fala a verdade”. Mas radicalizou: “A palavra de um governador de Estado já é, por si, uma prova”.

Ah, então prova mais forte é a palavra de um presidente da República. E, mais ainda, da República mais poderosa do planeta. No entanto, Richard Nixon renunciou à Presidência para não sofrer impeachment por haver mentido. O presidente francês Sarkozy chamou há dias o então primeiro ministro da Itália, Silvio Berlusconi, de “mentiroso”. E, para voltar ao Distrito Federal, quão indestrutíveis foram as provas representadas pela palavra dos então governadores Joaquim Roriz e José Roberto Arruda!

Até quando, ó Catilina, abusarás de nossa paciência?
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.