Domingo, 9 de dezembro de 2012
Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil
São
Paulo – Na manhã deste sábado (08), no Memorial da Resistência, em São
Paulo, a Caravana da Anistia julgou e concedeu anistia política ao padre
José Eduardo Augusti, que foi considerado vítima da repressão política
ocorrida no país durante a ditadura militar. O sacerdote foi declarado
anistiado político por unanimidade.
Em entrevista à Agência Brasil,
logo após o julgamento, Maria Tereza contou que seu irmão foi “muito
torturado” e quase ficou cego em um dos episódios de prisão. “Ele ficou
20 dias [sumido] e não sabíamos onde ele estava. E estava sendo
torturado. Ele quase perdeu a vista e precisou ser operado, pois recebeu
50 horas de luzes no rosto”, falou.
“Estas
são pessoas que, mesmo nos momentos mais difíceis, foram corajosas ao
se colocar ao lado da defesa dos direitos e das liberdades. Mas pagaram
um preço por isso. E são a elas que devemos a liberdade que hoje
usufruímos. Então, o Estado tem o dever e a obrigação de olhar para cada
uma delas e oficialmente pedir desculpas por esses erros e, por esse
gesto, reconhecer o legítimo de resistência que elas tiveram no
passado”, disse Paulo Abrão, secretário nacional de Justiça e presidente
da Comissão de Anistia.
Padre Augusti exercia suas atividades pastorais como defensor dos
direitos humanos em Botucatu (SP). Em julho de 1968, foi preso acusado
de ter participado de um comício estudantil em São Paulo (SP). Em agosto
daquele mesmo ano, foi libertado por meio de um habeas corpus. Foi indiciado pela Lei de Segurança Nacional e, em junho de 1969, condenado a um ano de prisão.
Em outubro daquele ano, o padre Augusti foi preso e permaneceu no
Departamento de Ordem Política e Social (Dops), onde relatou ter sido
torturado. Em 1970, foi transferido para o Presídio Tiradentes e, em
outubro do mesmo ano, foi posto em liberdade. O padre Augusti morreu em
1997.
“Esse é um ato de reparação do governo dos atos de arbítrio que
foram feitos em relação ao padre Augusti e muitos outros. Ele sempre foi
um sacerdote que se pautava pela denúncia das questões sociais e que
confrontou os poderosos na época em Botucatu”, disse a irmã do padre,
Maria Tereza Augusti.
Segundo Maria Tereza, a família não pediu indenização ao Estado,
“somente a reparação [reconhecimento] do governo brasileiro da injustiça
cometida”. Para ela, o atendimento da Caravana da Anistia representa “o
reconhecimento de que se tem uma história construída, que a juventude
não sabe, e que pode não se repetir”.
As Caravanas da Anistia são promovidas pela Comissão de Anistia do
Ministério da Justiça e existem desde 2008. Elas consistem na realização
de sessões públicas de apreciação de requerimentos de anistia política,
com o objetivo de resgatar, preservar e divulgar a memória política
brasileira, principalmente do período relativo à ditadura militar.
À tarde, a Caravana da Anistia julga o pedido de anistia política de
oito militantes da Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo. Serão
apreciados os pedidos de anistia política referentes a Jorge Luiz dos
Santos Oliveira, Iria Molina Farinazzo, Salvador Pires, Maria Arleide
Alves, Antonio Fernandes Neto, João Prado de Andrade, Luiz Carlos Prates
(conhecido como Mancha, ex-diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São
José dos Campos-SP) e Alexandre Giardini Fusco. Caso o julgamento seja
favorável, os operários deverão receber anistia política e reparação
econômica pela perseguição sofrida.
Raimundo Perillat, coordenador da Casa da Solidariedade do Ipiranga e
ex-metalúrgico, esteve hoje no Memorial da Resistência para acompanhar o
julgamento. Durante a ditadura, contou, ele chegou a ser preso.
“Naquela época, eu trabalhava em São Caetano. Teve a ocupação no
sindicato e toda a liderança chegou aqui no Dops, em 1979”, contou.
Segundo Abrão, no caso do Padre Augusti, a comissão reconheceu que
ele “foi preso de forma arbitrária, sofreu torturas e lesões à sua
integridade física, sofreu monitoramento ilegal da sua vida ao longo do
tempo e foi cerceado no exercício de suas atividades religiosas e
políticas”.
Com relação aos membros da Oposição Sindical, pedido que está sendo
julgado à tarde, Abrão falou que eles participaram de mobilizações
consideradas subversivas à época. “Além de terem sido presos em razão de
suas manifestações, foram demitidos arbitrariamente de seus empregos,
tiveram seus nomes colocados em listas-sujas - o que dificultou que
encontrassem novos empregos - e, principalmente, tiveram seus direitos
legítimos a um projeto de vida interrompidos”, disse Abrão.
O prédio onde se encontra instalado o Memorial da Resistência foi,
entre 1940 e 1983, sede do Departamento Estadual de Ordem Política e
Social de São Paulo (Deops), considerado setor de uma das polícias
políticas mais truculentas do país na época da ditadura militar. No
local, militantes políticos eram presos e torturados.
“Todas as caravanas são importantes, mas imagine fazer uma aqui
nesse prédio. Tantas pessoas tiveram suas vidas interrompidas, foram
presas e torturadas e os responsáveis não foram punidas. Então, esses
atos são pequenas reparações”, disse o deputado estadual Adriano Diogo,
presidente da Comissão Estadual da Verdade.