Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Dirceu defende Lula

Segunda, 17 de dezembro de 2012 
Por Ivan de Carvalho
O ex-ministro-chefe da Casa Civil nos anos dourados do Mensalão, José Dirceu, disse que há uma “tentativa clara de atingir” o ex-presidente Lula, porque as eleições mostraram que o Mensalão não teve efeito (efeito eleitoral contrário ao PT, ele quis dizer).

Como elemento participante dessa tentativa – José Dirceu deixou implícito, mas sem qualquer obscuridade – está a Operação Porto Seguro, da Polícia Federal, que mandou inquérito ao Ministério Público Federal, indiciando, entre outras pessoas, Rosemary Nóvoa Noronha, chefe do gabinete da Presidência da República em São Paulo.

Esta será certamente a prova maior que Dirceu tem a apresentar quanto à participação da Operação Porto Seguro na “tentativa clara de atingir Lula”. Porque Rosemary sempre foi muito ligada a Lula, que a colocou na chefia do gabinete da Presidência da República em São Paulo e, ao término dos seus dois mandatos presidenciais, cuidou de que a presidente Dilma Rousseff, entre os afastamentos de pessoas não concursadas funcionárias da Presidência, não incluísse o afastamento de Rosemary, que, no cargo, pintou e bordou.

Infelizmente a estreita ligação de Rosemary a Lula foi o fator que permitiu à graduada funcionária – caso a Polícia Federal haja feito seu trabalho com a mínima competência aceitável – atuar a favor de interesses particulares às custas de interesses públicos, inclusive alguns de extrema relevância, porque relacionados com ação indevida de agências reguladoras da União. Se isso atingir o ex-presidente, é uma fatalidade, ainda que pareça não ser uma mera coincidência.

Mas vale alguma consideração sobre o ataque de José Dirceu à Polícia Federal por investigar os “malfeitos”, como diria a presidente Dilma Rousseff para poupar-nos da palavra corrupção, tão impronunciável em certas áreas do governo quanto corda em casa de enforcado.

Muito aplaudido em um evento petista em Porto Alegre, o ex-presidente do PT e ex-ministro José Dirceu defendeu a atuação das agências reguladoras, cuja atuação, digamos, heterodoxa, foi o principal alvo da Operação Porto Seguro, queixando-se de que, nunca antes neste país, as agências reguladoras sofreram tão severa vigilância.

Como se isto, esta vigilância severa, que ele supõe que agora a Polícia Federal, que é subordinada ao governo do PT, anda fazendo, não seja uma coisa adequada. Mesmo considerando que, como se noticiou recentemente e a própria Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) confirmou, esta agência liberou para uso no Brasil um pesticida agrícola mais tóxico (para as pessoas que vão comer o produto agrícola, claro) do que um similar menos tóxico que já vinha sendo comercializado no país.

A Anvisa reconheceu que a política era de não autorizar o pior se já houvesse no mercado um similar melhor ou menos ruim. E reconheceu também que – não explicou a razão – essa política mudou. Um produto pior liberado aqui, outro acolá, um proibido alhures que continua permitido no Brasil e assim a Anvisa vai envenenando o povo pelo qual tanto lutam Dirceu e Lula, entre outros.

Ah! Mas em diversos momentos de seu discurso de 40 minutos, o ex-ministro José Dirceu criticou os meios de comunicação, defendendo o “fim do monopólio” do setor (?!) e insistindo na “regulação” da mídia, um mantra que o PT não cessa de entoar.

Agora, imagine o leitor uma agência reguladora da mídia, do tipo dessas que estão aí, a exemplo da Anvisa, e, conforme José Dirceu deu a entender que gosta, sem muita fiscalização.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta segunda.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.