Quarta, 19 de agosto de 2015
André Richter e Akemi Nitahara - Repórteres da Agência Brasil
Defensoria Pública de São Paulo alega
que o porte de drogas, tipificado no Artigo 28 da Lei de Drogas, não pode ser
configurado crime, por não gerar conduta lesiva a terceiros
O Supremo Tribunal Federal (STF)
começa a julgar hoje (19) a descriminalização do porte de drogas para uso
próprio. O julgamento estava previsto para ser iniciado na
semana passada, mas não entrou em pauta. A questão será
julgada por meio de um recurso de um condenado a dois meses de prestação de
serviços à comunidade por porte de maconha. A droga foi encontrada na cela do
detento. O recurso é relatado pelo ministro Gilmar Mendes.
O julgamento está previsto para
começar às 14h e será iniciado com a leitura do relatório do processo. Em
seguida, entidades de defesa e contra a descriminalização devem se manifestar,
como o Movimento Viva Rio, o Instituto Sou da Paz e a Associação dos Delegados
de Polícia do Brasil (Adepol). Após as sustentações orais, Mendes proferirá seu
voto, e os demais ministros começam a votar. O julgamento poderá ser adiado se
um dos ministros pedir mais tempo para analisar o processo.
No recurso, a Defensoria Pública de
São Paulo alega que o porte de drogas, tipificado no Artigo 28 da Lei de Drogas
(Lei 11.343/2006), não pode ser configurado crime, por não gerar conduta lesiva
a terceiros. Além disso, os defensores alegam que a tipificação ofende os
princípios constitucionais da intimidade e da liberdade individual.
O tema é polêmico. Ontem (18), entidades do setor médico divulgaram notas a favor e contra a descriminalização. O manifesto Implicações da Descriminalização do Uso de Drogas para a Saúde Pública, assinado por mais de 200 profissionais e pesquisadores da área de saúde, cita casos de diversos países e analisa o uso das drogas sob o ponto de vista da medicina, da saúde coletiva e das ciências sociais aplicadas à saúde.
O tema é polêmico. Ontem (18), entidades do setor médico divulgaram notas a favor e contra a descriminalização. O manifesto Implicações da Descriminalização do Uso de Drogas para a Saúde Pública, assinado por mais de 200 profissionais e pesquisadores da área de saúde, cita casos de diversos países e analisa o uso das drogas sob o ponto de vista da medicina, da saúde coletiva e das ciências sociais aplicadas à saúde.
Um dos defensores da descriminalização
é o presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Paulo Gadelha. De acordo com
ele, tratar o usuário de drogas ilícitas como criminoso faz com que o problema
não seja enfrentado corretamente.
“Como as drogas ilícitas estão em um circuito relacionado ao protecionismo, à exclusão e repressão, elas geraram uma questão de comercialização que está associado à violência do tráfico, discriminação à população mais vulnerável, quase um genocídio que acontece em territórios ocupados pelo tráfico. Todos esses componentes implicam problemas de saúde pública que devem ser tomados como centrais”.
“Como as drogas ilícitas estão em um circuito relacionado ao protecionismo, à exclusão e repressão, elas geraram uma questão de comercialização que está associado à violência do tráfico, discriminação à população mais vulnerável, quase um genocídio que acontece em territórios ocupados pelo tráfico. Todos esses componentes implicam problemas de saúde pública que devem ser tomados como centrais”.
Para Gadelha, o usuário de drogas é
vitimizado duas vezes, já que pode sofrer de um problema de saúde, que é a
dependência química, e é considerado criminoso por isso. “Alguém que está
sofrendo pelo uso de uma droga precisa ser acolhido, precisa ser tratado,
precisa ter uma sociedade que não o jogue na vala comum da criminalidade. Você
acha que alguém que é tachado como criminoso vai procurar o serviço de saúde?
Nunca”.
A nota assinada pelos presidentes da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), da Federação Nacional dos Médicos, Associação Médica Brasileira e do Conselho Federal de Medicina afirma que a descriminalização vai gerar aumento do consumo, levando à multiplicação de usuários, à dependência química, ao aumento de acidentes de trânsito, de homicídios e suicídios, além de fortalecer o tráfico, aumentando a violência.
A nota assinada pelos presidentes da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), da Federação Nacional dos Médicos, Associação Médica Brasileira e do Conselho Federal de Medicina afirma que a descriminalização vai gerar aumento do consumo, levando à multiplicação de usuários, à dependência química, ao aumento de acidentes de trânsito, de homicídios e suicídios, além de fortalecer o tráfico, aumentando a violência.
O presidente da ABP, Antônio Geraldo
da Silva, ressalta que as entidades representam mais de 400 mil médicos do
país. De acordo com ele, a categoria é contra a facilitação de acesso a
qualquer tipo de droga, seja ela legal ou ilegal. "Somos contra toda e
qualquer facilitação de uso de álcool, cigarro e qualquer droga. O motivo é
simples: essas substâncias provocam doenças e, como médicos, nós temos que
defender uma saúde pública adequada para toda a população. Liberar essas
substâncias é facilitar o aparecimento de doenças em geral, inclusive as da
mente”.
Ele alerta que o julgamento não trata
apenas de drogas consideradas menos nocivas, como a maconha. “As pessoas não
estão percebendo que o que está sendo votado é a liberação de toda e qualquer
droga, não é maconha pura e simplesmente. Se tiver um voto favorável, isso é a
liberação do porte de crack, de heroína, cocaína, LSD. E se
facilitar que as pessoas tenham acesso, nós vamos ter um aumento muito grande
de usuários e vai ser um caos na saúde pública”.
Segundo o presidente da Fiocruz,
Paulo Gadelha, em países como Portugal, onde houve um processo de definição de
quantidade para porte e a despenalização do uso de drogas, não houve aumento de
consumo. Mas, de acordo com Silva, os estudos em Portugal mostram que o número
de usuários no país passou de 8% para 16%.