Segunda, 1º de fevereiro de 2016
Da Tribuna da Internet
Ministros esqueceram de julgar o mérito da questão…
Carlos Newton
Conforme anunciamos há alguns dias aqui na Tribuna da
Internet, vamos divulgar agora, com absoluta exclusividade, a íntegra do
Mandado de Segurança impetrado ao Supremo Tribunal Federal nesta segunda-feira,
dia 1º de fevereiro, pelos advogados Jorge Béja e João Amaury Belem, do Rio de
Janeiro, e José Carlos Werneck, de Brasília. Como se sabe, o objetivo da medida
judicial é fazer com que o STF retome o julgamento da ação proposta pelo PCdoB
para modificar o rito do impeachment da presidente Dilma Rousseff, para que
seja cumprido o trâmite determinado pela Lei Federal 9882/99. Ao arrepio desta
legislação, o Supremo deu por julgado o mérito da ação do PCdoB, sem anuência
das partes e da Procuradoria-Geral da República.
A seguir, leiam a íntegra do Mandado de Segurança, que
aponta os erros cometidos pelo Supremo ao dar como julgada a ação apresentada
pelo PCdoB, antes de haver o obrigatório e indispensável exame do mérito da
questão, na forma da Lei Federal 9882/99. Trata-se de uma peça jurídica que
definitivamente honra o Direito brasileiro.
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO
PRESIDENTE DO EGRÉGIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
“Todo o homem tem direito a receber dos tribunais nacionais
competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais
que lhes sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.” (art. 8º da
Declaração Universal dos Direitos Humanos)
“Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas
garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente,
independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de
qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus
direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer
outra natureza.” (art. 8º da Convenção de São José da Costa Rica)
Segundo o enunciado da Súmula 202 do STJ, “A impetração de
segurança por terceiro contra ato judicial não se condiciona à interposição de
recurso”.
Os impetrantes postulam a concessão da ordem para que a ação
de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental ajuizada pelo PCdoB e que
foi decidida, definitivamente, ao arrepio da Lei nº 9.882, de 03.12.1999, nas
sessões extraordinárias dos dias 16 e 17/12/2015, retome o seu curso previsto
no aludido diploma legal, a partir do seu artigo 6º.
“O Supremo Tribunal Federal, por decisão da maioria absoluta
de seus membros, poderá deferir pedido de medida liminar na argüição de
descumprimento de preceito fundamental.” (Art. 5º da Lei nº 9.882, de
03.12.1999)
“Apreciado o pedido de liminar, o relator
solicitará as informações às autoridades responsáveis pela prática do ato
questionado, no prazo de dez dias.” (Art. 6º da Lei nº 9.882, de
03.12.1999)
“Decorrido o prazo das informações, o relator
lançará o relatório, com cópia a todos os ministros, e pedirá
dia para julgamento.” (Art. 7º da Lei nº 9.882, de
03.12.1999)
Se, como
afirmado em seu preâmbulo, a Constituição da República foi
promulgada “sob a proteção de Deus”, reveste-se de juridicidade a invocação
dos seguintes preceitos da Lei de Deus, a Bíblia Sagrada:
“Antes de julgar, procura ser justo.” (Eclesiástico: 18,19)
“Não fica bem favorecer um perverso para prejudicar o
direito do justo.” (Provérbios: 18,5)
“O juiz não é nomeado para fazer favores com a justiça, mas
para julgar segundo as leis.” (Platão)
“Saber o que é certo e não fazê-lo é a pior covardia.”
(Confúcio)
Os homens “pela injustiça aprisionam a verdade.” (São Paulo
em Epístola aos Romanos: 1,18)
“(…) não se deve proceder contra a perversidade do tirano
por iniciativa privada, mas sim pela autoridade pública’, dito isto, reitera-se
a tese de que, cabendo à multidão prover-se de um rei, cabe-lhe também depô-lo,
caso se torne tirano…” (Santo Tomás de Aquino. Escritos Políticos. Petrópolis:
Vozes, 2001, p. 25)
“Em todo país civilizado, há duas necessidades fundamentais:
que o poder legislativo represente o povo, isto é que a eleição não seja
falsificada, e que o povo influa efetivamente sobre os seus representantes.”
(Ruy Barbosa in Migalhas de Ruy Barbosa, org. Miguel Matos)
CARLOS NEWTON LEITÃO DE AZEVEDO,
brasileiro, casado, jornalista, CPF nº 100.101.497/91, Título de Eleitor nº
040910980396, e FRANCISCO JOSÉ BENDL, brasileiro, casado,
aposentado, CPF nº 085.154.920-91, Título de Eleitor nº
3518530418, por seus advogados (mandatos anexos), vêm,
tempestivamente e com todo o respeito, fundados nos princípios constitucionais
explícitos do devido processo legal, da fundamentação das decisões
judiciais, legalidade, eficiência, impessoalidade e ampla defesa
e, sobretudo da moralidade, com base no art. 1º, II, parágrafo único, no
art. 102, I, “d”, nos §§ 1º e 2º do inciso LIV, no inciso LXIX e na alínea “a”
do inciso XXXIV do art. 5º, todos da Constituição Federal e no art. 1º, § 3o da
Lei nº 12.016 de 07.08.2009 que disciplina o mandado de segurança individual e
coletivo, impetrar
MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR
porque a autoridade coatora Sua Excelência o SENHOR
MINISTRO PRESIDENTE DO EGRÉGIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL na condição de
autoridade da máxima representatividade da Egrégia Corte não poderia
converter o julgamento da medida cautelar em julgamento de mérito, na
medida em que, conforme a norma inserta no art. 6º da Lei nº 9.882 de
03/12/1999 que dispõe sobre o processo e julgamento da arguição de
descumprimento de preceito fundamental, abaixo transcrita, apreciado o
pedido de liminar, o relator solicitará as informações às autoridades
responsáveis pela prática do ato questionado, no prazo de dez dias, e de
acordo com o dispositivo do art. 7º do aludido diploma legal, decorrido o
prazo das informações, o relator lançará o relatório, com cópia a todos os
ministros, e pedirá dia para julgamento, tudo em razão dos fatos e do
Direito expostos a seguir.
O direito a ser amparado pela via mandamental diz respeito à
observância do regular processamento legal das normas insertas na Lei 9.882 de
03/12/1999 que dispõe sobre o processo e o julgamento da ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO
DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF), o que, com todo o respeito, induvidosamente,
não foi observado pela Suprema Corte este DEVIDO PROCESSO LEGAL, como será
demonstrado a seguir. E quando o debate gira em torno do Direito, é cabível o
Mandado de Segurança, a teor da Súmula 625 desta Egrégia Corte: “CONTROVÉRSIA
SOBRE MATÉRIA DE DIREITO NÃO IMPEDE CONCESSÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA”.
Os impetrantes incluem no polo passivo da relação
processual, na condição de litisconsortes necessários (artigo 47, CPC), o PARTIDO
COMUNISTA DO BRASIL (PCdoB), a Excelentíssima Senhora PRESIDENTE DA
REPÚBLICA e o CONGRESSO NACIONAL (Câmara dos
Deputados e o Senado Federal), requerendo, desde logo, suas citações.
Postulam os impetrantes a intervenção do Excelentíssimo
Senhor Procurador-Geral da República, seja para o desempenho de seu “múnus”
de Fiscal da Lei, seja para participar e intervir neste processo a outro título
que entenda também ser de sua atribuição.
I – DA LEGITIMIDADE PASSIVA
De início, enfrenta-se eventual polêmica a respeito da
legitimidade passiva, para a causa e para o processo, no tocante à
presente impetração.
“MANDADO DE SEGURANÇA. Identificação
da autoridade coatora: irrelevância de a petição ser literalmente dirigida
contra o Presidente do Tribunal de Contas, se da sua exposição se conclui que o
ato impugnado é induvidosamente do colegiado, devendo-se ter a menção ao seu
Presidente como endereçada ao órgão individual de representação da Corte em
juízo” (Mandado de Segurança nº 21.268-3/160 – DF – Tribunal Pleno, Relator
Ministro Sepúlveda Pertence, Decisão Unânime de 5.12.1991, in RTJ 139,
páginas 133/139).
“PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. Em
se tratando de órgãos colegiados, o seu Presidente, além de responder por atos
de sua competência própria (oportunidade em que se manifestará, se for o caso,
como agente individual), tem também a representação externa do próprio órgão
que preside. Assim, quando o mandado de segurança visa atacar ato praticado
pelo colegiado, o Presidente é chamado a falar, não como agente individual, mas
em nome e em representação da instituição”( Recurso em Mandado de Segurança nº
32.880-SP (2010/0154143-9, 1ª Turma, Superior Tribunal de Justiça, decisão
unânime, Relator Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, julgado em 20 de Setembro de
2011, DJ 26.9.2011).
Em tais condições, inconteste a legitimidade passiva da
autoridade coatora, Sua Excelência o SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO EGRÉGIO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL na condição de autoridade da máxima
representatividade da Egrégia Corte.
II – QUANTO À POSSIBILIDADE E À
ADEQUAÇÃO DA IMPETRAÇÃO DESTE MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR
Por força do comando inserto nos incisos II e III do art. 5o
da Lei 12.016/2009, não é cabível mandado de segurança contra
decisão judicial “da qual caiba recurso com efeito suspensivo” ou “transitada
em julgado”.
Quanto à possibilidade e à adequação da impetração deste
Mandado de Segurança, é sabido que esta Egrégia Corte inadmite Mandado de
Segurança contra pronunciamento jurisdicional oriundo de órgão da Corte, seja
ele do Pleno, uma de suas Turmas, ou um de seus Ministros, desde que tais
decisões possam ser reformadas por meio de recursos previstos, ou, em se
tratando de mérito, com trânsito em julgado, por meio de ação rescisória[1].
No entanto, a situação que se apresenta neste Mandado de
Segurança é outra e não se enquadra naquelas vedações e isto por uma razão
muito simples. Aqui, o alvo é decisão proferida em ação de arguição de
descumprimento de preceito fundamental, que não comporta a interposição de recurso
cujo objetivo seja a sua reforma, nem ação rescisória, conforme disposto no
artigo 12 da Lei nº 9.882, de 1999.
III – TEMPESTIVIDADE DO MANDADO DE
SEGURANÇA
Em consonância com o estatuído no art. 23 da Lei
12.016/2009, “o direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á
decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do
ato impugnado”.
A decisão onde a autoridade coatora Sua Excelência o SENHOR
MINISTRO PRESIDENTE DO EGRÉGIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, na condição de
autoridade da máxima representatividade da Egrégia Corte, converteu o
julgamento da medida cautelar em julgamento de mérito foi publicada no DJE
de 21/12/2015, conforme se constata pela ATA DE PROCLAMAÇÃO DO RESULTADO
DO JULGAMENTO que instrui a inicial. Assim, este writ of mandamus está
sendo impetrado tempestivamente.
IV – TRANSCRIÇÃO NA ÍNTEGRA DO QUE SE
CONTÉM NA LEI Nº 9.882 DE 03/12/1999 QUE DISPÕE SOBRE O PROCESSO E JULGAMENTO
DA ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (Dispõe
sobre o processo e julgamento da argüição de descumprimento de preceito
fundamental, nos termos do § 1o do art. 102 da
Constituição Federal)
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço
saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o A argüição prevista no § 1o do
art. 102 da Constituição Federal será proposta perante o Supremo Tribunal
Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental,
resultante de ato do Poder Público.
Parágrafo único. Caberá também argüição de descumprimento de
preceito fundamental:
I – quando for relevante o fundamento da controvérsia
constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal,
incluídos os anteriores à Constituição; (Vide
ADIN 2.231-8, de 2000)
II – (VETADO)
Art. 2o Podem propor argüição de
descumprimento de preceito fundamental:
I – os legitimados para a ação direta de
inconstitucionalidade;
II – (VETADO)
- 1oNa hipótese do inciso II, faculta-se ao interessado, mediante representação, solicitar a propositura de argüição de descumprimento de preceito fundamental ao Procurador-Geral da República, que, examinando os fundamentos jurídicos do pedido, decidirá do cabimento do seu ingresso em juízo.
- 2o(VETADO)
Art. 3o A petição inicial deverá
conter:
I – a indicação do preceito fundamental que se considera
violado;
II – a indicação do ato questionado;
III – a prova da violação do preceito fundamental;
IV – o pedido, com suas especificações;
V – se for o caso, a comprovação da existência de
controvérsia judicial relevante sobre a aplicação do preceito fundamental que
se considera violado.
Parágrafo único. A petição inicial, acompanhada de
instrumento de mandato, se for o caso, será apresentada em duas vias, devendo
conter cópias do ato questionado e dos documentos necessários para comprovar a
impugnação.
Art. 4o A petição inicial será
indeferida liminarmente, pelo relator, quando não for o caso de argüição de
descumprimento de preceito fundamental, faltar algum dos requisitos prescritos
nesta Lei ou for inepta.
- 1oNão será admitida argüição de descumprimento de preceito fundamental quando houver qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade.
- 2oDa decisão de indeferimento da petição inicial caberá agravo, no prazo de cinco dias.
Art. 5o O Supremo Tribunal Federal,
por decisão da maioria absoluta de seus membros, poderá deferir pedido de
medida liminar na argüição de descumprimento de preceito fundamental.
- 1oEm caso de extrema urgência ou perigo de lesão grave, ou ainda, em período de recesso, poderá o relator conceder a liminar, ad referendumdo Tribunal Pleno.
- 2oO relator poderá ouvir os órgãos ou autoridades responsáveis pelo ato questionado, bem como o Advogado-Geral da União ou o Procurador-Geral da República, no prazo comum de cinco dias.
- 3oA liminar poderá consistir na determinação de que juízes e tribunais suspendam o andamento de processo ou os efeitos de decisões judiciais, ou de qualquer outra medida que apresente relação com a matéria objeto da argüição de descumprimento de preceito fundamental, salvo se decorrentes da coisa julgada.(Vide ADIN 2.231-8, de 2000)
- 4o(VETADO)
Art. 6o Apreciado
o pedido de liminar, o relator solicitará as informações às autoridades
responsáveis pela prática do ato questionado, no prazo de dez dias.
- 1oSe entender necessário, poderá o relator ouvir as partes nos processos que ensejaram a argüição, requisitar informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a questão, ou ainda, fixar data para declarações, em audiência pública, de pessoas com experiência e autoridade na matéria.
- 2oPoderão ser autorizadas, a critério do relator, sustentação oral e juntada de memoriais, por requerimento dos interessados no processo.
Art. 7o Decorrido
o prazo das informações, o relator lançará o relatório, com cópia a todos os
ministros, e pedirá dia para julgamento.
Parágrafo único. O Ministério Público, nas argüições que não
houver formulado, terá vista do processo, por cinco dias, após o decurso do
prazo para informações.
Art. 8o A decisão sobre a argüição de
descumprimento de preceito fundamental somente será tomada se presentes na
sessão pelo menos dois terços dos Ministros.
Art. 9o (VETADO)
Art. 10. Julgada a ação, far-se-á comunicação às autoridades
ou órgãos responsáveis pela prática dos atos questionados, fixando-se as
condições e o modo de interpretação e aplicação do preceito fundamental.
- 1oO presidente do Tribunal determinará o imediato cumprimento da decisão, lavrando-se o acórdão posteriormente.
- 2oDentro do prazo de dez dias contado a partir do trânsito em julgado da decisão, sua parte dispositiva será publicada em seção especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União.
- 3oA decisão terá eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Público.
Art. 11. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato
normativo, no processo de argüição de descumprimento de preceito fundamental, e
tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social,
poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros,
restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a
partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.
Art. 12. A decisão que julgar procedente ou improcedente o
pedido em argüição de descumprimento de preceito fundamental é irrecorrível,
não podendo ser objeto de ação rescisória.
Art. 13. Caberá reclamação contra o descumprimento da
decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, na forma do seu Regimento
Interno.
Art. 14. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 3 de dezembro de 1999; 178o da
Independência e 111o da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
José Carlos Dias
José Carlos Dias
Este texto não substitui o publicado no DOU de 6.12.1999
V – O PEDIDO DE LIMINAR VEICULADO NESTE
WRIT TEM AMPARO NO FUMUS BONI IURIS E NO PERICULUM IN MORA
Como sabido de todos, a nação está diante de uma grave crise
institucional, havendo sido acolhido pelo Presidente da Câmara dos Deputados o
pedido veiculado pelos cidadãos e juristas Helio Bicudo, Miguel Reale Jr. e
Janaina Paschoal de IMPEACHMENT da senhora Presidente da República.
Em tais condições,“Em processo de tamanha magnitude
institucional, que põe a juízo o mais elevado cargo do Estado e do Governo da
Nação, é pressuposto elementar a observância do devido processo legal, formado
e desenvolvido à base de um procedimento cuja validade esteja fora de qualquer
dúvida de ordem jurídica”[2].
Com efeito, o PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL (PCdoB) ajuizou a
ação de ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL nº 378, por meio da
qual requereu incidentemente no bojo do processo principal ao SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL a concessão de várias MEDIDAS CAUTELARES, dentre as quais aquela que
paralisasse imediatamente na Câmara dos Deputados o processo do IMPEACHMENT,
sendo que algumas foram concedidas e outras não.
É cediço que o pedido de liminar para que seja concedido há
que estar amparado no fumus boni iuris e no periculum in mora. O
primeiro requisito (a fumaça do bom direito) resulta das exposições, de fato e
de direito, feitas nesta petição inicial. Já o segundo (o perigo da demora)
importa no prejuízo que a Nação sofrerá, se a determinação para que a
retomada do curso da ação de descumprimento de preceito fundamental da
autoria do PCdoB não venha a ser ordenada já e agora, mas somente mais tarde e
muito mais tarde. E entre o agora e o mais tarde e o muito mais
tarde ocorrerá um hiato de tempo considerável, em prejuízo do
cumprimento do princípio constitucional do devido processo legal previsto na
Lei nº 9.882/99, e que esta Egrégia Corte não observou ao pleito do
PCdoB, de modo que este writ pede que seja obedecido.
Talvez a tramitação deste Mandado de Segurança não terá a
mesma celeridade que teve a ADPF ajuizada pelo referido partido político.
Levará tempo até que o Plenário do STF venha apreciar seu mérito. E
tudo isso irá colaborar para o retardamento da volta à normalidade
política, econômica, social e moral que o Brasil, dolorosamente, vem
sofrendo.
E na eventualidade da concessão, a posteriori, da ordem
que os Impetrantes buscam (daqui a um, dois ou três anos), certamente alcançará
o processo de Impeachment junto ao Congresso Nacional concluído, na trilha que
esta Egrégia Corte estabeleceu, liminar e provisoriamente. Aí será tarde
demais para o restabelecimento do curso da ação da ADPF do
PCdoB, nos exatos termos legais determinados pela Lei 9.882/99.
Assim, o processo de Impeachment no Congresso já estará
findo. E a decisão de mérito deste Mandado de Segurança, se procedente
e deferida, não fará mais sentido, não terá mais valor. Será
uma decisão inexequível pelo exaurimento do tempo.
Por todo o exposto, os impetrantes requerem o
deferimento da liminar, com a determinação para que o processo da
ação ADPF do PCdoB retome o seu curso, avançando para as etapas previstas
na lei e que esta Egrégia Corte ceifou ao decidir pela conversão de
decisão sobre liminares em julgamento de mérito, já que a sua concessão não
trará o menor prejuízo, pois o processo de Impeachment no Congresso não sofrerá
solução de continuidade e prosseguirá em todas as etapas estabelecidas pelas
liminares concedidas.
VI – DO DEVIDO PROCESSO LEGAL,
BREVÍSSIMA CONSIDERAÇÃO
Estreme de dúvida, o princípio do devido processo legal é
uma das garantias constitucionais mais festejadas, pois dele decorrem todos os
outros princípios e garantias constitucionais, pois é a base legal
para aplicação de todos os demais princípios, independente do ramo do direito
processual, inclusive no âmbito do direito material ou administrativo.
Assim sendo, o devido processo legal assegura inúmeros
outros postulados como os princípios do contraditório, da ampla defesa e da
motivação, embora autônomos e independentes entre si, integrando-se totalmente
os incisos LIV e LV, ambos do artigo 5º de nossa Lei Maior. Tais princípios
induvidosamente ajudam a garantir a tutela dos direitos e interesses
individuais, coletivos e difusos.
Certamente, o princípio do devido processo legal garante a
eficácia dos direitos garantidos ao cidadão pela nossa Constituição Federal,
uma vez que seriam insuficientes as demais garantias sem o direito a
um processo regular, com regras para a prática dos atos processuais e
administrativos.
Como sabido de todos, o devido processo legal possibilita o
maior e mais amplo controle dos atos jurídico-estatais, nos quais se incluem os
atos concernentes ao direito eleitoral, gerando uma ampla eficácia do princípio
do Estado Democrático de Direito, no qual o povo não só sujeita-se a imposição
de decisões como participa ativamente delas.
Não pode existir a menor dúvida que, para a manutenção do
Estado Democrático de Direito e efetivação do princípio da igualdade, o Estado
deve atuar sempre em prol do público, através de um processo justo e com
segurança nos trâmites legais do processo, proibindo decisões voluntaristas e
arbitrárias.
Oportuna a transcrição das palavras de Paulo Henrique dos
Santos Lucon[3]: “A cláusula genérica do devido
processo legal tutela os direitos e as garantias típicas ou atípicas que
emergem da ordem jurídica, desde que fundadas nas colunas democráticas eleitas
pela nação e com o fim último de oferecer oportunidades efetivas e equilibradas
no processo. Aliás, essa salutar atipicidade vem também corroborada pelo art. 5o,
§ 2o, da Constituição Federal, que estabelece que “os direitos e
garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime
e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a
República Federativa do Brasil seja parte”.
E arremata :
“por não estar sujeito a conceituações apriorísticas, o
devido processo legal revela-se na sua aplicação casuística, de acordo com o
método de “inclusão” e “exclusão” característico do case system
norte-americano, cuja projeção já se vê na experiência jurisprudencial pátria.
Significa verificar in concreto se determinado ato normativo ou decisão
administrativa ou judicial está em consonância com o devido processo legal.”
O devido processo legal é garantia de liberdade em sua
plenitude, é um direito fundamental do homem consagrado na Declaração Universal
dos Direitos Humanos:
Art.8º “Todo o homem tem direito a
receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que
violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou
pela lei.”
E ainda na Convenção de São José da Costa Rica da qual o
Brasil é um dos seus signatários, o devido processo legal é assegurado no art.
8º:
Art. 8o – “Garantias judiciais
1. Toda pessoa terá o direito de ser
ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou
Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por
lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na
determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista,
fiscal ou de qualquer outra natureza.
(…)”
Não tenhamos qualquer dúvida de que é o que se verifica
também no sistema jurídico pátrio, os nossos tribunais entendem que a defesa
das garantias constitucionais faz-se necessária para conceder ao cidadão a
efetividade de seus direitos e garantias individuais, como ocorre
induvidosamente com o princípio do devido processo legal. É neste sentido
que o devido processo legal passa a simbolizar a obediência as
normas processuais estipuladas em lei, garantindo aos
jurisdicionados-administrados-eleitores um julgamento justo e igualitário com
atos e decisões devidamente motivadas.
Em tais condições, o devido processo legal resguarda as
partes de atos arbitrários, imprevisíveis, surpreendentes e improvisados por
parte das autoridades jurisdicionais ou executivas, seja em pleito
próprio, sejam naqueles outros em que o Direito debatido é o de Ordem Pública
insuscetível de preclusão e que poder ser arguido em qualquer tempo e grau de
jurisdição e o pronunciamento judicial a seu respeito afeta, direta ou
reflexamente, direitos subjetivos de terceiros e de toda a coletividade,
como são os direitos dos eleitores na Democracia brasileira. E mais que isso,
um Direito Cívico, cujos ordenamentos legais que o compõem formam
uma espécie de Super Direito, a todos destinados a cumpri-los
e defendê-los. Em suma: normas pétreas para o eleitorado e para a Democracia.
VII – DIREITO ELEITORAL, BREVÍSSIMA
CONSIDERAÇÃO
Lê-se nas mais resumidas cartilhas que o Direito Eleitoral é
o Direito que se destina a regulamentar os direitos políticos dos cidadãos
e o processo eleitoral, além de organizar e disciplinar o funcionamento do
poder do sufrágio popular, e estabelecer precisa equação entre a vontade do
povo e a atividade governamental.
Em suma: o Direito Eleitoral cuida do exercício da
cidadania. E suas principais fontes não são apenas aquelas indicadas na
literatura jurídica, tais como, a Constituição Federal, o Código Eleitoral, a
Lei das Eleições, a Lei das Inelegibilidades, a Lei Etelvino Lins, a Lei dos
Partidos Políticos, as Respostas do TSE e dos TRE´s às consultas, as Resoluções
do TSE…
Há uma outra lei, de idêntico peso e importância, mas que
não se lê nem se vê incluída no rol dos diplomas legais que formam e
compreendem o Direito Eleitoral. Trata-se da Lei 1.079, de 10 de Abril de
1950, publicada no DOU de 12.4.1950, denominada Lei do Impeachment. Seu
frontispício tem o seguinte enunciado: “Define os crimes de Responsabilidade
e regula o respectivo processo”.
Dos seus 83 artigos, sente-se que os mais pungentes são os
artigos 14 a 38, justamente por cuidarem da denúncia, da acusação e do
julgamento do presidente da República, pela prática de crime (ou crimes)
de Responsabilidade.
Como é dura aquela pena inscrita no artigo 34 “Proferida
a sentença condenatória, o acusado estará, ipso fato, destituído do cargo”!
É o afastamento do exercício da presidência daquele que o eleitorado
brasileiro, no exercício de seus direitos políticos, da cidadania e do poder
que detém do sufrágio popular, foi à urna e de forma livre, republicana e
democrática, elegeu para conduzir o destino do país e de seu povo.
Logo, não se pode excluir a Lei 1.079/50 do elenco das
fontes que alicerçam o Direito Eleitoral. Assim, como todo eleitor tem o
direito pleno e absoluto de participar do processo eleitoral que elege um
presidente da República, como é o caso desta impetração, tem ele também o mesmo
direito de participar do processo que culmina com a demissão daquele presidente
que o seu voto elegeu.
É um Direito Coletivo, Difuso e Público. Indisponível e
Absoluto. Insusceptível de amesquinhamento, dele ser contornado, e nem
ficar sujeito a sofrer mínimo obstáculo ao seu exercício, em
juízo ou fora dele. Todas as facilidades, todas as franquias, todos
os privilégios e, acima de tudo, todas as imunidades, há de se dar e
reconhecer devido a cada eleitor para o pleno gozo da sua cidadania, junto
à Mesa Eleitoral e/ou perante as Cortes de Justiça.
Michelangelo Bovero, cientista italiano, faz a seguinte
reflexão na sua obra[4]:
“Os cidadãos não devem se transformar, de
eleitores por um dia, em sujeitos passivos durante anos, simples
espectadores mais ou menos alheios ou, pior, súditos ignaros,
mas devem conservar um papel ativo, assumindo a figura da opinião
pública crítica”.
E também aqui, entre nós brasileiros, outro grande e
renomado Jurista, o Professor-Doutor GUSTAVO BINENBOJM[5], após traçar linhagem familiar entre os
institutos da ADIN, da ADC e da ADPF, nos mostra o caminho evolucionista para o
aperfeiçoamento do mais verdadeiro, legítimo e avançado Estado Democrático
de Direito e das garantias, pétreas, soberanas e intocáveis, a respeito dos direitos
individuais e coletivos dos cidadãos, do Direito de Cidadania:
“A existência do incidente de
inconstitucionalidade, por si só, não aparenta violação à garantia; todavia,
seu julgamento pela Corte Suprema, sem que as partes diretamente afetadas (no
caso deste writ o cidadão, o eleitor, todo o eleitorado, acrescentam os
Impetrantes) possam apresentar razões, realizar sustentação oral
e suscitar qualquer outro incidente necessário à defesa de seus interesses (no
caso aqui, este Mandado de Segurança, acrescentam os Impetrantes), configura,
à evidência, afronta ao devido processo legal e aos princípios do contraditório
e da ampla defesa”.
Do Direito Eleitoral Brasileiro, tratemos, com brevidade,
dos princípios da Igualdade, da Lisura das Eleições, da Legalidade e da
Proporcionalidade.
Segundo o festejado mestre Marcos Ramayana “toda a
atuação da Justiça Eleitoral, do Ministério Público, dos Partidos
Políticos, inclusive dos eleitores, deve pautar-se pela lisura
das eleições” (In, Direito Eleitoral, Impetus, 2008, p. 35).
É princípio que está inscrito no artigo 23 da Lei
Complementar nº 64, de 18.5.90:
“Art. 23 – O Tribunal formará sua convicção pela livre
apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova
produzida, atentando para circunstâncias de fato, ainda que não indicados ou
alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público da lisura do
processo eleitoral”.
É intuitivo que a referência que o texto faz a Tribunal
abrange toda a hierarquia do Judiciário, fundamentalmente a Suprema Corte, nos
processos que lhe são endereçados e que versem sobre matéria eleitoral.
Legalidade, Proporcionalidade.
Está na Constituição Federal (artigo 5º, § 2º) e, com vista
à hipótese em tela, tem a finalidade de impedir distorções que empresta
efetividade à equidade, à justiça do caso singular, incorporando-o à ordem
jurídica para ser aplicada, na “ausência de disposições expressas”, passível de
invocação em qualquer juízo, instância ou tribunal, como enfatiza Djalma Pinto[6].
O Voto, o Eleitor.
Sufrágio e voto são usualmente empregados como sinônimos.
Mas não são. A Constituição Federal dá-lhes sentidos diferentes. E é CÁRMEN
LÚCIA ANTUNES DA ROCHA[7] quem ensina: “voto é o
instrumento jurídico pelo qual, solene e formalmente, a opção por
alguém (candidato) ou por alguma coisa (instituição, regime, etc.). Sufrágio
é participação para aclamar ou proclamar uma vontade, a qual se emite
por meio do voto. Sufraga-se uma opinião mediante o voto vale dizer,
esse é o veículo de manifestação daquele”
O eleitor, por sua vez, é o principal ator, o protagonista
desta sublimação que se chama Democracia. Ele é o destinatário das normas
eleitorais. Ele é o mandante. Ele é o eleitor. E num processo judicial, a
ser instaurado, ou já em curso e que tenha por finalidade do reexame
dos artigos de lei antiga (quase consuetudinária) que culmina com
a demissão do ocupante do mais alto cargo político da República, que
seu voto elegeu, ele, o eleitor, tem a mais ampla legitimidade para no
processo intervir, com instrumentos nominados ou inominados. Até
mesmo fundado no Constitucional Direito de Petição, de mera petição, desde
que seja ele eleitor.
Sim, porque seu voto não é facultativo, mas obrigatório. E
se ele, injustificadamente, falta com sua obrigação eleitoral (o de ir à
urna e votar) as penas que lhe são impostas são de tamanha severidade que,
quase, o deixa sem condições de sobreviver: a) não poderá inscrever-se em
concurso público ou prova para cargo público, autárquico ou paraestatal, bem
como fundações governamentais, empresas, institutos e sociedades de qualquer
natureza, mantidas ou subvencionadas pelo governo ou que exerçam serviço
público delegado; b) não pode obter empréstimo nas autarquias, nos institutos e
caixas de previdência social, bem como em qualquer estabelecimento de crédito
mantido pelo governo, ou de cuja administração este participe, e com essas
entidades celebrar contratos; c) não pode obter passaporte ou carteira de
identidade; d) não pode renovar matrícula em estabelecimento de ensino oficial
ou oficializado pelo governo; e) não pode praticar qualquer ato para o qual
exija quitação do serviço militar ou imposto de renda. Eis algumas das
proibições legais que recaem sobre o eleitor injustificadamente faltoso com o
seu dever cívico de ir à urna e sufragar o seu voto.
Em contrapartida, porém, a tantas sanções que sufocam e
deixam o cidadão, se não despido, quase despido de seus direitos de
cidadania, nada mais justo e legítimo do que facultar-lhe o livre acesso ao
processo eleitoral e seus processos derivados, como é o caso desta ADPF
378 da autoria do PCdoB que esta Egrégia Corte acabou de decidir ao traçar
os caminhos, formas e diretrizes dirigidas ao Congresso Nacional para
que o processo de impeachment do Presidente da República, eleito pelo
voto dos cidadãos tenha prosseguimento.
A legitimidade que o artigo 14 da Lei nº
1.079/50 confere a qualquer cidadão para apresentar denúncia contra o
Presidente da República é a mesma legitimidade que o cidadão
continua a ter e não a perde para recorrer ao Judiciário quando este, acionado,
decide a respeito do processo que o próprio cidadão iniciou contra o Chefe da
Nação e que foi instaurado com base na mesma lei (a 1.079/50) que o
cidadão dela se valeu para exercer a sua prerrogativa.
É o Direito de Cidadania pleno, completo, e que não admite
amputação ou seccionamento. Legitimidade para denunciar e legitimidade também
para intervir no processo, político ou judicial, decorrente da denúncia que o
cidadão apresentou e o Poder Legislativo Federal acatou. Admitir o contrário é
o mesmo que proclamar a meia-Democracia, a meia-Cidadania, a meia-Soberania
popular. “A Constituição assegura os direitos do cidadão e faz da cidadania
a manifestação mais nobre de Democracia. Pelo que, no processo eleitoral,
é ele que tem o papel central de tutela insubstituível do poder. Somente
com a sua participação efetiva, sensível, engajada e responsável é que se tem
Democracia operante. Não se há frustá-lo, seja como for. Qualquer tentativa ou
consumação de tal aniquilamento importa em violação do princípio da
cidadania, e não pode ser considerado lícito, legítimo e fundado no sistema
constitucional democrático”, como asseverado pela então advogada CÁRMEN
LÚCIA ANTUNES ROCHA[8] e hoje Ministra desta
Egrégia Corte, no artigo que assinou em Maceió, em 27.3.1998,
intitulado “O processo eleitoral como instrumento para a democracia”.
Esperam os Impetrantes que esta Suprema Corte não lhes feche
as portas e que aceite este debate. Debate que sabem ser avançado, inédito
e pioneiro, eis que batem à porta da Suprema Corte da Justiça Brasileira
dois cidadãos-eleitores na plenitude do gozo dos seus direitos políticos, que
pedem que suas argumentações sejam lidas, debatidas e seus
pedidos decididos democraticamente e tendo como causa de pedir a observação do
Devido Processo Legal previsto na Lei nº 9.882 de 1999.
A situação trazida com este Mandado de Segurança guarda
similitude com a hipótese que vai narrada a seguir, e aqui posta apenas
como exercício de raciocínio. Que o Direito de Voto é um direito
pessoal e constitui dever cívico fincado na garantia e na
responsabilidade da cidadania, ninguém coloca em dúvida. Tão cívico quanto o
respeito que todos os brasileiros devem dispensar aos Símbolos Nacionais que
são, a Bandeira, o Hino, as Armas e o Selo (CF, artigo 13, § 1º).
Eis a hipótese: Digamos se amanhã ou depois chegue
ao Supremo Tribunal Federal um pleito no qual se pede a declaração de
inconstitucionalidade ou de descumprimento de preceito fundamental do
artigo 31, II e III da Lei nº 5.700, de 1º de Setembro de 1971 (e
consequentemente o artigo 35), lei que cuida dos Símbolos Nacionais.
O pretexto seria — hipoteticamente — que tais disposições
desta referida lei estariam ultrapassadas, que foram elaboradas pelo
governo militar, que não encontram receptividade na Constituição Federal de
1988, Carta elaborada para regime democrático. Que conflita com o comportamento
moderno do povo que não se conduz e nem observa mais aquelas
imposições da mencionada lei, a saber:
“Artigo 31 – São consideradas manifestações de
desrespeito à Bandeira Nacional, e portanto proibidas, I – Mudar-lhe a forma,
as cores, as proporções, o dístico ou acrescentar-lhe outras inscrições; II –
Usá-la como roupagem, reposteiro, pano de boca, guarnição de mesa, revestimento
de tribuna, ou como cobertura de placas, retratos, painéis ou monumentos a
inaugurar”.
“Artigo 35 – A violação de qualquer disposição
desta lei é considerada contravenção, sujeito o infrator à pena de multa de uma
a quatro vezes o valor do salário mínimo nacional vigente no País, elevada ao
dobro nos casos de reincidência”.
E digamos que esta Suprema Corte decidisse pela procedência
da demanda, após o cumprimento integral de todas as fases e etapas da lei que
se valeu o autor da ação para apresentá-la ao STF, daí resultando que todas
aquelas proibições tidas pela lei considerada “inconstitucional” e não
recepcionada pela Carta Republicana, passassem a não valer mais?
Ainda que não tenha ocorrido a falta de observância do
devido processo legal nesta hipótese aventada, indaga-se: qual o
impedimento que poderia recair sobre qualquer cidadão brasileiro para
apresentar, neste mesmo Pretório Excelso, sua irresignação com o veredicto que
a Corte expediu? Faltar-lhe-ia legitimidade e interesse? Escapava-lhe
instrumento para a irresignação? Ser-lhe-ia negada a via mandamental para
a defesa de um dos mais caros valores da Democracia que o cidadão possui, como
é o civismo, tal e qual o direito ao voto e o direito à rigorosa observância do
devido processo legal no tocante à solução judicial que esta Egrégia Corte
adotou e a ser observada pelo Congresso Nacional, a respeito do processo
de impeachment do presidente que o voto do eleitor elegeu para presidir o
Brasil?
Tudo é civismo. Símbolos Nacionais e Soberania Popular. Tudo
é da Democracia. É do povo, para o povo e para ninguém mais.
VIII – SOBRE O PROCESSAMENTO DA ADPF Nº
378 DO PCdoB
É público e notório, pertencendo, portanto à categoria dos
fatos que não dependem de prova (CPC, artigo 334, I), que o Partido Comunista
do Brasil (PCdoB) ingressou nesta Suprema Corte com a ação de Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) tombada sob o nº 378.
Com alentadas 73 páginas que compõem a petição inicial,
o referido Partido postulou o que chamou de “filtragem” da Lei nº 1.079/50, bem
como de alguns artigos dos Regimentos Internos, da Câmara e do Senado, em
face da Constituição Federal.
Ora com pedidos de Interpretação conforme à Constituição de
determinados artigos da Lei 1.079/50; ora com a “não receptividade”, isto é, a
negativa de constitucionalidade de certos artigos desta mesma referida lei
e de artigos outros dos Regimentos Internos, da Câmara Federal e do Senado.
E tanto se deu em razão do ato do presidente da Câmara dos
Deputados que ao receber denúncia firmada por três eleitores e
também juristas (Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal),
deflagrou o processo de Impeachment contra a senhora Presidente da República.
Daí sobreveio a propositura da referida ADPF do
PCdoB, entregue nesta Egrégia Suprema Corte na mesma ocasião que
ocorreu a votação secreta procedida pela Câmara dos Deputados para a
eleição da Comissão Especial de que cuida o artigo 19 da Lei nº 1.079/50.
IX – SUSPENSÃO E LIMINARES EM MEDIDA
CAUTELAR INCIDENTAL NA ADPF
A petição da ADPF do PCdoB, embutiu no seu bojo, pedido para
a suspensão imediata do curso do processo de impeachment na Câmara dos
Deputados (item 96) e, em seguida e na mesma petição, pedidos de
deferimento das liminares postos na Medida Cautelar (item 97).
Ou seja, buscou primeiro a paralisação do curso do processo
de Impeachment, como consta no item 96 da referida peça: “Em face do
exposto, requer o autor, cautelarmente, o deferimento da decisão monocrática
para suspender de imediato o processo de impeachment iniciado contra a
Presidente da República, até que seja julgada a Medida Cautelar ora pleiteada”.
Traduzindo: no item 96, a ADPF do PCdoB pedia liminar para
suspender de imediato o curso do processo de afastamento da presidente já
instaurado na Câmara. E no item seguinte, o 97, que fossem
(posteriormente) deferidas as liminares solicitadas na Medida Cautelar, no
bojo e posta incidentalmente na ADPF.
E no mesmo dia, Sua Excelência, o Senhor Ministro
Edson Fachin, sorteado Relator, ordenou à Câmara a paralisação do curso do
processo. E o próprio Ministro, após conceder o prazo de 5 dias
previsto na lei (art. 5º, § 2º), para que as partes suplicadas prestassem
informações, Sua Excelência designou o dia 16 de Dezembro passado
para o exame, pelo Plenário da Corte, de todos os pedidos de liminares
feitos na Medida Cautelar posta no bojo e incidentalmente na ADPF.
Tudo foi muito rápido, como não poderia deixar de ser. A
questão dizia respeito aos interesses da Nação, à Cidadania e à
Democracia e aqueles pedidos de liminares eram para ser examinados e
decididos no mais curto espaço de tempo. E assim foi: 6 ou 7 dias.
X – O QUE FOI DECIDIDO NAQUELA SESSÃO
EXTRAORDINÁRIA
Nos dias 16 e 17 de dezembro último, em sessão
extraordinária, o plenário do Supremo Tribunal Federal se reuniu,
portanto, para decidir a respeito das liminares requeridas na Medida
Cautelar inserida no bojo e como prefacial da ação de Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental da autoria do PCdoB.
Cumpriu-se assim e à risca, o que dispõe o artigo 5º da Lei
nº 9.882, de 3.12.1999 que “Dispõe sobre o processo e julgamento da arguição
de descumprimento de preceito fundamental, nos termos do § 1º do art. 102 da
Constituição Federal”.
Tem-se, pois, que este é o “devido processo legal” a ser
rigorosamente cumprido em todas as suas fases e etapas. Reza o artigo 5º: “O
Supremo Tribunal Federal, por decisão da maioria absoluta de seus membros,
poderá deferir pedido de medida liminar na arguição de descumprimento de
preceito fundamental”.
E foi o que aconteceu. O plenário da Egrégia Corte, naqueles
dois dias de sessão extraordinária, a pedido do Relator Ministro Edson
Fachin, examinou e decidiu tão somente as liminares requeridas na
Medida Cautelar.
Terminada aquela sessão extraordinária, ao invés de
prosseguir o processo da ADPF, avançando nas demais etapas e fases previstas
na Lei 9.882/99, a Corte decidiu converter o
julgamento da Medida Cautelar em julgamento do
mérito da ADPF e terminou o processo.
Uma decisão provisória, fincada apenas na fumaça do bom
direito e do perigo da demora, foi convalidada em decisão definitiva,
terminativa e extintiva do processo. É o que consta expressamente da Ata de
Proclamação do Resultado do Julgamento da MC da ADPF 378: “Ao final, o
Tribunal, por unanimidade, converteu o julgamento da medida cautelar em
julgamento de mérito”.
X.1 – DA INAPLICABILIDADE DA ADPF 144
NA APRECIAÇÃO DAS LIMINARES SOLICITADAS NA MEDIDA CAUTELAR POSTA NO BOJO E
INCIDENTALMENTE DA ADPF 378 AJUIZADA PELO PCDOB
No caso da apreciação das liminares solicitadas na Medida
Cautelar posta no bojo e incidentalmente da ADPF 378 ajuizada pelo PCdoB,
partiu do próprio ministro-relator, Edson Fachin, a proposta de transformar em
julgamento do mérito a sessão de simples exame de liminares. O acolhimento da
sua sugestão se deu a posteriori, dia 18 de dezembro de 2015, quando já se
estava redigindo a Ata de Proclamação do resultado do julgamento dos dias 16 e
17 de dezembro último das medidas cautelares da referida ADPF.
Foi feita então uma intervenção do decano dessa Egrégia
Suprema Corte, Ministro Celso de Mello, que utilizou a seguinte argumentação
para apoiar a proposta do relator, que, descumpria o rito imposto pela Lei
Federal 9.882/99:
“Relembro que quando do julgamento da ADPF 144 ajuizada
pela AMB, o pedido era de mera cautelar, mas o Tribunal o converteu em
julgamento definitivo, uma vez que todos os sujeitos da relação processual
intervieram com sustentações orais que denotaram exame em profundidade e não
apenas cognição sumária (…) Como há pelo menos um precedente, ele autoriza a
proposta do eminente ministro Fachin” – declarou o Ministro Celso de Mello.
Com a devida vênia, é mister salientar que este Colendo
Supremo Tribunal Federal não pode dar idêntico tratamento a situações tão
desiguais e tão distintas.
Primeiro, deve-se lembrar que, no caso da ADPF 144, a
decisão de promover a conversão em julgamento do mérito foi proposta pelo
relator, A PRIORI, ou seja, durante o julgamento perante o representante da
Procuradoria-Geral da República e os advogados de todas as partes, conforme se
constata pela transcrição da Ementa da Decisão de Julgamento publicada no DJE
de 26/02/2010.
Decisão:
Por unanimidade, o Tribunal acolheu a Questão de Ordem suscitada pelo
Senhor Ministro Celso de Mello (Relator), no sentido de julgar, desde
logo, o mérito da argüição de descumprimento de preceito
fundamental. Em conseqüência do acolhimento desta Questão de Ordem, o
Procurador-Geral da República, Dr. Antônio Fernando Barros e Silva de Souza,
proferiu, oralmente, parecer na presente sessão. Em seguida, o Tribunal, por
maioria, vencidos os Senhores Ministros Marco Aurélio, Menezes Direito e Eros
Grau, reconheceu a legitimidade da Associação dos Magistrados Brasileiros-AMB, rejeitando,
por unanimidade, as demais preliminares suscitadas.
No mérito, o Tribunal, por maioria, vencidos os Senhores
Ministros Carlos Britto e Joaquim Barbosa, julgou improcedente a argüição de
descumprimento de preceito fundamental, nos termos do voto do Relator,
decisão esta dotada de efeito vinculante, segundo a Lei nº 9.882/1999. Votou o
Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Falaram: pela argüente, Associação dos
Magistrados Brasileiros-AMB, o Dr. Alberto Pavie Ribeiro; pelo amicus curiae,
Partido Progressista-PP, o Dr. Marcus Vinicius Furtado Coelho e, pela
Advocacia-Geral da União, o Ministro José Antônio Dias Toffoli. O Relator
comunicou ao Plenário que, em decorrência de pedido, somente nesta data
formulado, admitiu a Associação dos Juízes Federais do Brasil-AJUFE como amicus
curiae. Plenário, 06.08.2008.”
Mas no caso da sessão que apreciou e decidiu a respeito das
liminares postas no bojo e incidentalmente da ADPF 378 ajuizada pelo PCdoB, a
sugestão foi feita A POSTERIORI, na sessão do dia 18, ou seja, no dia seguinte,
frise-se mais uma vez, quando já se estava redigindo a Ata de Proclamação do
resultado do julgamento dos dias 16 e 17 de dezembro último das medidas
cautelares da referida ADPF, sem a indispensável presença e aceitação das
partes e do representante da ilustríssima PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA,
conforme se constata pela transcrição da Ementa da Decisão de Proclamação do
Resultado de Julgamento publicada no DJE de 21/12/2015.
“Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do
voto do Relator, rejeitou as preliminares e conheceu da ação. O
Tribunal, nos termos do voto do Ministro Roberto Barroso, que redigirá o
acórdão: quanto ao item A, por unanimidade, indeferiu
o pedido para afirmar que não há direito à defesa prévia ao ato do Presidente
da Câmara; quanto ao item B, por unanimidade,
deferiu parcialmente o pedido para estabelecer, em
interpretação conforme à Constituição do art. 38 da Lei nº 1.079/1950, que
é possível a aplicação subsidiária dos Regimentos Internos da Câmara e do
Senado ao processo de impeachment, desde que sejam compatíveis
com os preceitos legais e constitucionais pertinentes; quanto ao item C,
por maioria, deferiu parcialmente o pedido para (1)
declarar recepcionados pela CF/88 os artigos 19, 20 e 21 da Lei nº 1.079/1950,
interpretados conforme à Constituição, para que se entenda que as “diligências”
e atividades ali previstas não se destinam a provar a improcedência da
acusação, mas apenas a esclarecer a denúncia; e (2) para declarar não
recepcionados pela CF/88 o artigo 22, caput, 2ª parte [que se inicia com
a expressão “No caso contrário…”], e §§ 1º, 2º, 3º e 4º, da Lei nº 1.079/1950,
que determinam dilação probatória e segunda deliberação na Câmara dos
Deputados, partindo do pressuposto que caberia a tal casa pronunciar-se sobre o
mérito da acusação, vencidos os Ministros Edson Fachin (Relator), Dias Toffoli
e Gilmar Mendes; quanto ao item D, por unanimidade,
indeferiu o pedido, por reconhecer que a proporcionalidade na
formação da comissão especial pode ser aferida em relação aos partidos e blocos
partidários; quanto ao item E, por maioria, deferiu
integralmente o pedido, para estabelecer que a defesa tem o direito de
se manifestar após a acusação, vencido o Ministro Marco Aurélio; quanto ao item
F, por unanimidade, deferiu integralmente o pedido,
para estabelecer que o interrogatório deve ser o ato final da instrução
probatória; quanto ao item G, por maioria, deferiu
parcialmente o pedido para dar interpretação conforme a Constituição ao
art. 24 da Lei nº 1.079/1950, a fim de declarar que, com o advento da CF/88, o
recebimento da denúncia no processo de impeachment ocorre apenas após a
decisão do Plenário do Senado Federal, vencidos, nessa parte, os Ministros
Edson Fachin (Relator), Dias Toffoli e Gilmar Mendes, e declarar que a votação
nominal deverá ser tomada por maioria simples e presente a maioria absoluta de
seus membros, vencidos, nesse ponto, os Ministros Edson Fachin (Relator),
Gilmar Mendes e Marco Aurélio; quanto ao item H, por
maioria, deferiu parcialmente o pedido para declarar
constitucionalmente legítima a aplicação analógica dos arts. 44, 45, 46, 47, 48
e 49 da Lei nº 1.079/1950 – os quais determinam o rito do processo de impeachment
contra Ministros do Supremo Tribunal Federal e o Procurador-Geral da República
– ao processamento no Senado Federal de crime de responsabilidade contra
Presidente da República, vencidos os Ministros Edson Fachin (Relator), Dias
Toffoli e Gilmar Mendes; quanto ao item I, por maioria,
deferiu integralmente o pedido para declarar que não foram
recepcionados pela CF/88 os arts. 23, §§ 1º, 4º e 5º; 80, 1ª parte; e 81, todos
da Lei nº 1.079/1950, porque estabelecem os papeis da Câmara e do Senado
Federal de modo incompatível com os arts. 51, I; 52, I; e 86, § 1º, II, da
CF/88, vencidos, em menor extensão, os Ministros Edson Fachin (Relator), Dias
Toffoli e Gilmar Mendes; quanto ao item J, por unanimidade, indeferiu
o pedido para afirmar que os senadores não precisam se apartar da
função acusatória; quanto ao item K, por unanimidade, indeferiu
o pedido para reconhecer a impossibilidade de aplicação subsidiária das
hipóteses de impedimento e suspeição do CPP relativamente ao Presidente da
Câmara dos Deputados. Quanto à cautelar incidental (candidatura avulsa), por
maioria, deferiu integralmente o pedido para declarar que não é possível a
formação de comissão especial a partir de candidaturas avulsas, vencidos os
Ministros Edson Fachin (Relator), Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello.
Quanto à cautelar incidental (forma de votação), por maioria, deferiu
integralmente o pedido para reconhecer que a eleição da comissão especial
somente pode se dar por voto aberto, vencidos os Ministros Edson Fachin
(Relator), Teori Zavascki, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello. O
Tribunal, por maioria, resolveu questão de ordem suscitada da tribuna para
reafirmar o quorum de maioria simples para deliberação do Senado quanto
ao juízo de instauração do processo, vencidos os Ministros Edson Fachin e Marco
Aurélio, que estabeleciam o quorum de 2/3. Ausente, nesta deliberação, o
Ministro Gilmar Mendes. Ao final, o Tribunal, por
unanimidade, converteu o julgamento da medida cautelar em
julgamento de mérito. Ausente, nesta questão,
o Ministro Gilmar Mendes. Presidiu o julgamento o Ministro
Ricardo Lewandowski. Plenário, 17.12.2015.”
Se alguém ajuíza uma ação para ser indenizado porque as melancias
que comprou lhe foram entregues estragadas, o Poder Judiciário não pode se
pronunciar a respeito do estado de uma carga de melões.
Uma decisão judicial não pode se contrapor “à realidade
das coisas” e à “realidade dos fatos”. Assim, a reiterada repetição
de uma falsa assertiva em inúmeras decisões judiciais não a torna verdadeira,
pois o Poder Judiciário não tem o condão de transformar a realidade.
Com efeito, ainda que mil decisões afirmem equivocadamente
que quadrado é redondo, aquela figura geométrica continuará sendo um “quadrilátero
cujos lados são iguais entre si e cujos ângulos são retos”.
Interpretando a contrario sensu,
pode-se afirmar, então, onde não existe a mesma razão fundamental, não
prevalece a mesma regra de Direito, como asseverado pelo MINISTRO CARLOS
VELLOSO no RE 352.940/SP, “ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio, ou
em vernáculo: onde existe a mesma razão fundamental, prevalece a mesma regra de
Direito”.
É de MÁXIMA importância que se leve em consideração que as
duas ações são inteiramente diversas. A ADPF 144 foi ajuizada pela Associação
dos Magistrados Brasileiros (AMB), que peticionava acerca de declarações de
inelegibilidades, e TODAS AS LIMINARES PEDIDAS FORAM REJEITADAS POR
UNANIMIDADE pelo plenário dessa Egrégia Suprema Corte.
Mas o caso da ADPF 378 foi totalmente diverso: liminares
foram concedidas integralmente, outras parcialmente, e algumas denegadas, A
UNANIMIDADE FICOU LONGE DE SER ATINGIDA, pois ocorreu votação até de 6 a 5.
Portanto, constata-se uma colossal diferença entre as duas
ações – uma, a ADPF 144, com todas as liminares rejeitadas por unanimidade; a
outra, a ADPF 378, caracterizada por dúvidas e interpretações altamente
passíveis de questionamentos.
Assim, a Colenda Suprema Corte não pode aplicar o exemplo da
ADPF 144 ao julgamento das medidas cautelares da ADPF 378 ajuizada pelo PCdoB,
porque não pode dar idêntico procedimento a causas tão diferentes, tão
distintas, em nome da Justiça, em sua mais ampla abrangência.
Em tais condições, foi transformada em julgamento do mérito
da referida ação do PCdoB uma controvertida decisão tomada ao término de uma
sessão convocada e instalada, exclusivamente, para apreciar e decidir tão
somente a respeito dos pedidos de concessão de liminares, uma iniciativa que
induvidosamente precisa ser revista para que a ADPF 378 siga seu caminho
jurídico em conformidade com a Lei Federal 9.882/99, permitindo assim que sejam
recebidas as manifestações definitivas de todas as partes e da Procuradoria
Geral da República, e em seguida seja lavrado o parecer definitivo do relator e
após o almejado julgamento do seu mérito.
XI – A MAIS ALTA CORTE DE JUSTIÇA DO
PAÍS NÃO OBSERVOU O QUE SE CONTÉM NA LEI Nº 9.882 DE 03/12/1999 QUE DISCIPLINA
O PROCESSO E JULGAMENTO DA ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL,
NOS TERMOS DO § 1º DO ART. 102 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Ou seja, a sessão para julgar o mérito da ADPF é a sessão
prevista no artigo 7º. Não, no artigo 5º. Nada mais claro, portanto. E também
exige o artigo 12 da Lei nº 9.882 de 1999 que o tribunal, ao julgar o
mérito, faça expressa menção e referência sobre sua “procedência” ou
“improcedência”, não sendo suficiente mencionar que a decisão sobre os
pedidos de liminares foi convertida em decisão de mérito:
“Artigo 5o O
Supremo Tribunal Federal, por decisão da maioria absoluta de seus membros,
poderá deferir pedido de medida liminar na argüição de descumprimento de
preceito fundamental.”
“Artigo 7o Decorrido
o prazo das informações, o relator lançará o relatório, com cópia a todos os
ministros, e pedirá dia para julgamento.”
“Artigo 12 – A decisão que julgar
procedente ou improcedente o pedido em arguição de descumprimento de preceito
fundamental é irrecorrível, não podendo ser objeto de ação rescisória.”
Não obstante, apenas consta da Ata de Proclamação do
Resultado do Julgamento que o Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do
Relator, rejeitou as preliminares e conheceu da ação.
E seguem-se os itens que vão da letra “a” à “k”, indicando o
resultado (placar) da votação sobre cada pedido de liminar posto na Medida
Cautelar e suas disposições conformes.
Com a devida vênia, indaga-se: em que parte se lê que a
ADPF foi julgada procedente? É oportuno salientar que na Ata de
Proclamação do Resultado do Julgamento consta apenas que o Tribunal conheceu da
ação. E conhecer de uma ação não é indicativo de que a
mesma tenha sido julgada procedente ou improcedente. Na linguagem jurídica
o verbo CONHECER significa dizer que o
pleito (ou um recurso) foi ADMITIDO. Tão somente admitido.
Nada mais do que isso.
Portanto, CONHECER e ADMITIR são
verbos de mesmo significado. São sinônimos, no mundo processual
jurídico. Faltou, contudo, o mais importante, que era dizer
se o conhecimento da ação, tal como consta na Ata de Proclamação do Resultado
do Julgamento importou na procedência ou não da mesma (ou no provimento ou não
do recurso, quando se tratar de recurso), como determina expressamente o artigo
12 da mencionada lei.
É oportuno destacar que a Lei 9.882/99 ao disciplinar o
processo e julgamento de uma ADPF que contenha pedido de liminar em Medida
Cautelar inserida no seu bojo, prevê duas etapas: a primeira foi rigorosamente
cumprida sob a relatoria do Eminente Ministro Edson Fachin. Mas a segunda
etapa não se verificou, comprometendo a garantia do devido processo
legal.
Esta segunda etapa começa a partir do artigo 6º que diz; “apreciado
o pedido de liminar (e isso já havia ocorrido, acrescente-se) o
relator solicitará informações às autoridades responsáveis pela prática do ato
questionado no prazo de 10 (dez) dias”.
E avança para o artigo 7º: “Decorrido o prazo das
informações, o relator lançará o relatório, com cópia a todos os ministros e
pedirá dia para julgamento”.
É de se observar — e observação de suma
importância — que é somente nos artigos 7º (e também no 10º) que o
legislador menciona a palavra “julgamento”, dando a ensejar que a
ADPF venha receber julgamento final, isto é, julgamento de mérito.Tanto é
imprescindível e impossível de contorno ou descumprimento, que a própria
petição inicial da ADPF do PCdoB faz pedido expresso (e não dedutório) para que
a ADPF seja julgada procedente. A conferir: página 71 item 98 da inicial da
ADPF:
“Em face do exposto, requerem os autores que:
1. a) seja recebida e julgada procedente a
presente ADPF;
……………………………………………………………………………..
1. e) seja julgada procedente a presente
ADPF para que o STF profira decisão….”
Ou seja, a sessão para julgar o mérito da ADPF é a sessão
plenária prevista no artigo 7º. Não, no 5º. Nada mais claro, portanto. E a
ausência da sessão plenária de que cuida o artigo 7º tornou impossível constar
da Ata (ou de qualquer outro registro, pretérito ou futuro) aquela parte
indispensável às Sentenças e Acórdãos e que a processualística
dá o nome de PARTE DISPOSITIVA. Enfim, a afirmação expressa
de que o pedido foi julgado procedente, como determina o artigo 12 da Lei nº
9.882/1999 e como foi pedido e reiterado na petição inicial da referida ADPF. É
outra lacuna que não pode mais ser suprida, aditada ou complementada, a não
ser com a retomada do curso da ação proposta pelo PCdoB para que o procedimento
avance com o atendimento das etapas previstas a partir do artigo 6º da
mencionada lei, sendo este o objeto da impetração do
presente Mandado de Segurança. São normas de ordem pública que, quando
desatendidas, decompõem, desarticulam e desrespeitam o princípio do Devido
Processo Legal. Sentença e/ou Acórdão, com relatório, fundamentação, mas sem
parte dispositiva, é (ou são) ineficazes e inexequíveis. Não têm força de lei
entre as partes que litigaram e àquelas outras, às quais projetam reflexos e
consequências.
Quis o legislador estabelecer duas etapas, para as ADPF´s
que contivessem pedido de liminar em Medida Cautelar. Certamente para que as
partes acionadas — e mesmo a parte autora — tivessem mais tempo para elaborar
suas defesas (na primeira fase, 5 dias, na segunda, 10 dias), mormente quando
já votadas pelos Ministros as liminares prefacialmente solicitadas na Medida
Cautelar.
No caso em tela, as liminares foram concedidas e o processo
terminou. Caso não tivessem sido deferidas, é intuitivo que a parte autora e outras
partes interessadas na obtenção das liminares, também impetrariam Mandado de
Segurança, visando a garantir o direito líquido e certo de obterem por parte
dos tribunais a observância do devido processo legal.
E ainda: se o legislador pretendesse esgotar e findar o
processo apenas com o exaurimento do exame das liminares pelo Plenário, a
própria lei assim disporia.
E assim não dispondo — como não dispõe — a observância de todas as suas etapas e fases estão acobertadas pelo manto sagrado do “devido processo legal”.
E assim não dispondo — como não dispõe — a observância de todas as suas etapas e fases estão acobertadas pelo manto sagrado do “devido processo legal”.
As partes que protagonizam esta ADPF da autoria do PCdoB e
todo o eleitorado nacional, como é o caso dos Impetrantes que estão
rigorosamente em dia com as suas obrigações eleitorais, portanto na plenitude
do gozo dos seus direitos políticos, conforme se comprova através das suas
certidões de quitação eleitoral expedidas pelo TSE, cidadãos brasileiros e
eleitores, não poderiam ser surpreendidos.
Juiz e Tribunais não podem surpreender as partes no curso de
um processo, nem sujeitá-las ao imprevisto e ao imprevisível. A conversão de
uma decisão sobre pedido de liminar em Medida Cautelar em julgamento de mérito
da causa principal certamente causou surpresa. A todos pegou
desprevenidos. É algo desproporcional.
A obediência à observância das etapas de um processo
judicial, como garantia de não causar surpresa às partes, é de tal ordem que
até mesmo nos Juizados Cíveis Especiais, por onde tramita a maioria dos feitos
consumeristas que tem na oralidade sua marca, o juiz não pode, sem prévia e
fundamentada decisão e de súbito, decidir pela inversão do ônus da prova. As
partes precisam ser alertadas antes. Não pode haver surpresa. “A INVERSÃO DO
ÔNUS DA PROVA, PREVISTA NO ARTIGO 6º, INCISO VIII, DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR,
COMO EXCEÇÃO À REGRA DO ARTIGO 333 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, SEMPRE DEVE VIR
ACOMPANHADA DE DECISÃO FUNDAMENTADA, E O MOMENTO APROPRIADO PARA TAL
RECONHECIMENTO SE DÁ ANTES DO TÉRMINO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL, INADMITIDA A
APLICAÇÃO DA REGRA SÓ QUANDO DA SENTENÇA FOR PROFERIDA”[9].
É oportuno destacar que, Liminar em Medida Cautelar encontra
apoio e base, tanto para a sua postulação quanto para seu exame pelo Judiciário
para concedê-la ou não, em mera plausibilidade do Direito invocado e dos fatos
apresentados. São decisões provisórias, precárias, modificáveis ou revogáveis a
qualquer momento, por mais que seja extensa e juridicamente fecunda sua
fundamentação e por mais que tenha sido divulgada, concorrida e pomposa a
sessão plenária que nela veio ser tomada.
Pode, até mesmo, ser mantida e convolada em definitiva, mas
somente ao término de todas as etapas de um processo, com a Sentença na
primeira instância, e com o Acórdão de Mérito nos Tribunais e de tudo cientes
as partes litigantes e terceiros interessados.
O processo cautelar desenvolve-se sob cognição sumária. Pela
natureza da urgência do processo perante situação perigosa e periclitante,
indispensável se faz a sumarização de cognição e de procedimento, para se poder
alcançar seu objetivo. E não mais que isso. E decisão, concessiva ou não de
liminar em Medida Cautelar, preparatória ou incidental, é mera decisão
interlocutória, insusceptível de ser convertida em julgamento de mérito.
Com todo o respeito, não se pode admitir que em um processo
de tamanha envergadura para os interesses da Nação e de seu povo, uma decisão
meramente provisória (toda e qualquer liminar é provisória; dure pouco ou dure
muito, é sempre provisória), proferida ab initio, se torne definitiva no
mesmo momento em que ela foi tomada.
A propósito da natureza de liminares e sentenças, em
qualquer pleito, na primeira e na segunda instâncias, os Impetrantes
transcrevem este importante julgado da relatoria do Eminente Ministro TEORI
ZAVASCHI[10], quando Sua Excelência integrava o
Egrégio Superior Tribunal de Justiça: “Liminar e sentença são provimentos
com natureza, pressupostos e finalidades distintas e com eficácia temporal em
momentos diferentes. Por isso mesmo, a decisão que defere ou indefere liminar,
mesmo quando proferida por tribunal, não inibe a prolação e nem condiciona o
resultado da sentença definitiva…”.
Se houver precedente, a situação fática foi outra e jamais a
mesma. Mormente processo em que as autoridades responsáveis pelo ato
questionado são chamadas, efetivamente e num primeiro momento, para dizer tão
somente sobre os pedidos de liminares na Medida Cautelar (art. 5º, § 2º, Lei
9.882/99). Não, mais. E dizerem em prazo curto de 5 dias.
Já os seus chamados, agora para a prestação de informação a
respeito do mérito, se dá em outro momento posterior, com prazo maior e em dobro:
10 dias, após apreciado o pedido de liminar (art. 6º, Lei 9.882/99).
Como sabido de todos, o Direito é regido pela lógica do
razoável (princípio da razoabilidade) e deve ser interpretado de maneira
inteligente. Por isso Carlos Maximiliano estava coberto de razão quando
ensinava que “a interpretação das leis é obra de raciocínio e de lógica, mas
também de discernimento e bom senso, de sabedoria e experiência”[11].
Assim, há de ser afastada qualquer interpretação que vulnere
princípios constitucionais como a que ocorreu na ADPF 378 ajuizada pelo PCdoB
com o do devido processo legal.
Com todo o respeito, diante da interpretação daquele preceito
feita pelo PLENÁRIO de nossa mais alta Corte de Justiça, faz-se mister trazer à
colação as seguintes palavras de Ruy Barbosa.
“Estudante sou. Nada mais. Mau sabedor,
fraco jurista, mesquinho advogado, pouco mais sei do que saber estudar, saber
como se estuda, e saber que tenho estudado. Nem isso mesmo sei se saberei bem.
Mas, do que tenho logrado saber, o melhor devo às manhãs e madrugadas.”
“Mas, senhores, os que madrugam no ler,
convém madrugarem também no pensar. Vulgar é o ler, raro o refletir. O saber
não está na ciência alheia que se absorve, mas, principalmente, nas idéias
próprias, que se geram dos conhecimentos absorvidos, mediante a transmutação,
por que passam, no espírito que os assimila. Um sabedor não é armário de
sabedoria armazenada, mas transformador reflexivo de aquisições digeridas.”[12]
Com efeito, atento às colocações acima o intérprete não pode
se restringir à simples leitura do que aparentemente se contém na norma legal,
o que, não raro, conduz a equívocos a exemplo do que ocorreu no julgamento das
liminares da ADPF 378.
De fato, “interpretar um texto normativo é algo mais do
que ler a seqüência de palavras que o integram”, pois, como salientado por
Adilson Abreu Dallari, “qualquer pessoa alfabetizada é capaz de ler um texto
normativo, mas somente alguém dotado de conhecimentos técnicos científicos em
Direito é capaz de apreender todo o seu conteúdo”[13].
Para alcançar tal desiderato torna-se necessário recorrer à
interpretação sistemática, que pode ser definida como a “operação que
consiste em atribuir a melhor significação, dentre várias possíveis, aos
princípios, às normas e aos valores jurídicos, hierarquizando-os num
todo aberto, fixando-lhes o alcance e superando antinomias, a partir da
conformação teleológica, tendo em vista solucionar os casos concretos”[14].
Em abono da interpretação sistemática, acertadamente
Adilson Abreu Dallari ensina que “o universo normativo não é um amontoado
caótico de prescrições, mas, sim, um sistema, organizado, articulado e
hierarquizado, no qual as contradições são apenas aparentes”, acrescentando
que “nunca se pode apreender a totalidade do conteúdo normativo de um
dispositivo legal isolado, sem relacioná-lo com outros dispositivos e, muito
especialmente, com princípios contidos no ordenamento jurídico do qual ele é
apenas uma parte”, pois, como sabido de todos, “o princípio, por sua
importância, serve exatamente para orientar a interpretação e a aplicação de
toda e qualquer norma”[15].
Com efeito, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, princípio
é o “mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele,
disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o
espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência”.
Consequentemente, os princípios presidem “a intelecção das diferentes partes
componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo”[16].
Nesse sentido, ao proceder à interpretação o aplicador da
lei “deve considerar as idéias que mais se aproximam da universalidade dos
princípios maiores; com isto, formará proposições e terá verdades menos gerais”
e, em seguida, descer “dos princípios gerais às normas jurídicas mais particulares”,
tendo em vista que “o Direito, longe de ser um mero conglomerado de normas,
é um conjunto bem estruturado de disposições que, interligando-se por
coordenação e subordinação, ocupam, cada qual, um lugar próprio no ordenamento
jurídico”[17].
Por último há de ser lembrada a lapidar lição do inolvidável
Geraldo Ataliba expressa nas passagens adiante reproduzidas.
“Os princípios são as linhas mestras, os grandes nortes,
as diretrizes magnas do sistema jurídico. Apontam os rumos a serem seguidos
por toda a sociedade e obrigatoriamente perseguidos pelos órgãos do governo
(poderes constituídos). Eles expressam a substância última do querer popular,
seus objetivos e desígnios, as linhas mestras da legislação, da administração e
da jurisdição. Por estas não podem ser contrariados; têm que ser
prestigiados até as últimas conseqüências. A relevância dos princípios
constitucionais e sua supremacia, sobre as normas ordinárias ou até mesmo
constitucionais foi admiravelmente apreendida e exposta por Agustin Gordillo,
com as seguintes luminares palavras: ‘(…) El princípio, exige que tanto
la ley como el acto administrativo respeten sus limites y además tengan su
mismo contenido, sigan su misma dirección, realicen su mismo espiritu. (…)’
(Introducción al Derecho Administrativo, 2ª ed., Abeledo Perrot, 1966, págs.
176 e 177).”[18].
Levando em consideração os ensinamentos daqueles grandes
juristas, para não cometer equívocos o aplicador da lei deve analisar
inicialmente o que se contém nos princípios e nas normas insertas na Constituição
da República e só posteriormente proceder ao exame do conteúdo das normas
infraconstitucionais, sendo descabido trilhar caminho interpretativo inverso
ou, o que é ainda pior, pretender aplicar determinado dispositivo legal
considerando-o isolado do todo harmônico em que se encontra inserido, como
feito pelo PLENÁRIO do STF no julgamento das liminares da ADPF 378.
Interpretando-se o disposto na Lei 9.882/99, levando em
consideração os SUPERPRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS da IMPESSOALIDADE e da JUSTIÇA,
que, segundo afirmado no preâmbulo de nossa Lei Maior, são valores supremos de
nosso Estado Democrático de Direito, assim como a norma constitucional que
assegura a todos o devido processo legal, é preciso que esta Suprema Corte
retome o curso previsto na aludida lei, a partir do seu artigo 6º.
Daí se impetra este Mandado de Segurança com Pedido de
Liminar para que a ação de Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental da autoria do PCdoB e que foi decidida, definitivamente, nas
sessões extraordinárias dos dias 16 e 17 de dezembro último, retome o seu curso
previsto na Lei nº 9.882, de 1999, a partir do seu artigo 6º, e ao final
esperam os impetrantes vê-lo PROVIDO e a ORDEM CONCEDIDA.
As partes se encontram bem representadas e são
legitimadas, muito mais do que o terceiro interveniente de que cuidam os
artigos 50 e seguintes do CPC, a quem a lei também lhe outorga poder
e legitimidade para integrar a lide pendente entre terceiros.
Aqui, a legitimidade é muito mais decisiva e forte,
justamente por se tratar de matéria eleitoral que toca diretamente ao
eleitor, de participar dos processos que elegem e dos processos que
demitem um presidente da República.
A propósito, Flávio Cheim Jorge e Marcelo Abelha Rodrigues[19] em seu cuidadoso trabalho publicado na
Revista Brasileira de Direito Eleitoral, intitulado “Mandado de Segurança
Contra Ato Judicial no Processo Eleitoral”, os dois renomados autores, no item
4 da página 96, ao tratar do “Mandado de Segurança e o Terceiro Prejudicado”
são taxativos: “Outro aspecto relacionado ao mandado de segurança contra ato
judicial, diz respeito à sua possibilidade por terceiros, isto é, por pessoas
que não figuraram como autor ou réu na relação jurídica processual deduzida em
juízo. A multiplicidade de situações legitimadoras é tamanha que no âmbito da
Justiça Comum o STJ resolveu editar a Súmula 202, consagrando tal possibilidade
nos seguintes termos “A IMPETRAÇÃO DE SEGURANÇA POR TERCEIRO, CONTRA
ATO JUDICIAL, NÃO SE CONDICIONA À INTERPOSIÇÃO DE RECURSO”.
E prosseguem os doutores Cheim Jorge e Abelha Rodrigues,
listando três situações possíveis da utilização do writ: “a) o litisconsorte
necessário não citado que vem a ser atingido pela sentença; b) o terceiro
totalmente estranho à relação jurídica, que também vem a ser atingido pelos
efeitos diretos da sentença; c) e o terceiro, titular de relação jurídica
dependente ou conexa com aquela deduzida em juízo, que vem a ser alcançado
pelos efeitos indiretos da sentença”.
E concluem os Juristas: “Quanto à segunda categoria –
terceiro completamente estranho à relação jurídica – parece-nos adequado o
Mandado de Segurança para que este terceiro, que não é parte e tampouco possui
relação com o objeto do processo, possa se insurgir e afastar os efeitos da
decisão judicial que o prejudica”.
Vejam, senhores Ministros, que o eleitor (e todos os eleitores
brasileiros, dentre estes os impetrantes) mesmo que não se enquadre bem nesta
segunda categoria, justo por ser ele eleitor, não ser completamente estranho à
lide, induvidosamente os efeitos da decisão tomada na apreciação dos pedidos de
liminares da Medida Cautelar da ADPF 378 do PCdoB atinge em cheio os seus
direitos de cidadania, tem ele em seu prol, mesmo assim, o amparo do Mandado de
Segurança para se insurgir contra a decisão tomada por esta Suprema Corte.
Assim decidindo esta Egrégia Suprema Corte pelo deferimento
integral deste Mandamus, todos os jurisdicionados-eleitores terão
garantidos a proteção que a Constituição Federal a todos atribui e
assegura: a observância do devido processo
legal.
XII – DISPOSIÇÕES FINAIS
Os impetrantes afirmam que este remédio constitucional diz
respeito à observância do regular processamento legal das normas insertas na
Lei 9.882 de 03/12/1999 que dispõe sobre o processo e o julgamento da ARGUIÇÃO
DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF).
Em atendimento à determinação contida no inciso II do art. 7o
da Lei 12.016/2009 os impetrantes requerem a esse órgão jurisdicional que mande
cientificar a Procuradoria Geral da República em seu prédio-sede localizado em
Brasília, Distrito Federal.
Em seguida, requer a esse órgão jurisdicional que mande
ouvir “o representante do Ministério Público dentro de 10 (dez) dias” e
profira o almejado acórdão de concessão da ordem (Lei 12.016/2009 – art. 12).
Segundo o preâmbulo da Constituição da República a JUSTIÇA é
um dos valores supremos de nosso Estado Democrático de Direito.
A Carta Magna contém princípios que, no dizer da maioria dos
juristas, são vigas mestras que alicerçam o sistema jurídico brasileiro.
Nos termos do art. 1.º, inciso II, da Constituição Federal
de 1988, a cidadania é um dos fundamentos da República. Alguns doutrinadores a
relacionam com a perda ou aquisição dos direitos políticos de votar e ser
votado.
Se a ação é direito subjetivo público genérico e abstrato
que se traduz no “direito de invocar o exercício da função jurisdicional”[20];
Se a cidadania é um dos fundamentos da República Federativa
do Brasil (CR – art. 1o, II);
Se “a defesa do interesse público” constitui
exercício de cidadania (Lei 9.265/96 – art. 1o, V);
Se aos litigantes é assegurado direito de “ampla defesa,
com os meios e recursos a ela inerentes” (CR – art. 5o, LV);
Se “os cidadãos não devem se transformar, de
eleitores por um dia, em sujeitos passivos durante anos, simples
espectadores mais ou menos alheios ou, pior, súditos ignaros,
mas devem conservar um papel ativo, assumindo a figura da opinião
pública crítica”; e
Se a referida ação do PCdoB foi transformada em julgamento
do mérito, uma controvertida decisão tomada ao término de uma sessão convocada
e instalada, exclusivamente, para apreciar e decidir tão somente a respeito dos
pedidos de concessão de liminares, induvidosamente de interesse do POVO BRASILEIRO,
consoante a norma inserta no § 3o do art. 1o da
Lei 12.016/2009 que disciplina o mandado de segurança individual e coletivo,
abaixo transcrita, é evidente a legitimidade dos impetrantes para a
impetração deste writ of mandamus para que a ADPF 378 siga seu caminho jurídico
em conformidade com a Lei Federal 9.882/99, a partir do seu artigo 6º.
Art. 1o Conceder-se-á
mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado
por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente
ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer
violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade,
seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.
- 3o Quando o direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer delas poderá requerer o mandado de segurança.
A respeito da alusão ao § 3º do artigo 1º da Lei nº
12.016/2009, como lastro legal e pano de fundo que sustenta e comporta a
presente impetração por parte de dois cidadãos brasileiros, eleitores e que
integram a coletividade do eleitorado nacional, todos com os mesmos
democráticos direitos e deveres e todos sujeitos às mesmas apenações, caso
desatendam, sem justificativa ao cívico chamado para irem às urnas, as melhores
doutrinas lhes são favoráveis e amparadoras.
Salvo uma ou outra divergência tão somente de nomenclatura
jurídica que lhes são atribuídas no tocante à legitimação ativa, o certo é que
vozes como as de LUIZ FUX, SERGIO FERRAZ, ENRICO FRANCAVILLA e
SCARPELLA BUENO soam alto e num só tom, compondo harmônico
entendimento de que os Impetrantes são partes legítimas para o aforamento deste
pioneiro, inovador e evolucionista Mandado de Segurança.
Do Excelentíssimo Ministro LUIZ FUX[21], quando integrava o Egrégio Superior
Tribunal de Justiça: “Outrossim, a Lei nº 12.016, no § 3ª do
seu artigo 1º, reitera a previsão, antes contida no art. 1º, §
2º, da Lei nº 1533, de legitimidade concorrente na
hipótese de comunhão de direitos. Assim, quando o direito
ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer delas
poderá requerer o Mandado de Segurança; com o que, consagra-se
a legitimidade de quaisquer cotitulares de um direito para propor isoladamente
o writ, não obstante a unitariedade da decisão”.
De SCARPELLA BUENO e SÉRGIO FERRAZ[22]: Não parece ser, dentro da
técnica processual, hipótese de legitimação extraordinária, como
defende Scarpella Bueno. Sendo os Impetrantes também titulares do
direito lesado, condição de aplicabilidade do dispositivo, o
instituto que dele decorre é o da Solidariedade Ativa, que é o liame
derivado da comunhão do direito por vários sujeitos, indistintamente.
É o que possibilita que qualquer dos co-titulares vá a juízo para defender
seu interesse legítimo, compartilhado igualmente, pelos demais.
A tutela, uma vez concedida, alcançará de forma idêntica a
totalidade dos interessados, ou também legitimados.
E de ENRICO FRANCAVILLA[23]: “O direito que cabe a várias pessoas
pode ser individual plúrimo, quando as pessoas titulares forem
determinadas e não houver coletividade com relação jurídica; pode ser
individual plúrimo homogêneo, quando as pessoas titulares forem
determinadas e houver origem comum e relação com a pessoa impetrante; pode
ser coletivo, quando as pessoas forem determinadas, houver
relação jurídica entre elas e a pessoa impetrante e os direitos forem
indivisíveis; pode ser difuso, quando houver titularidade
indeterminada, o direito for indivisível e houver relação de
circunstâncias”.
E FRANCAVILLA termina dizendo:
“Estes direitos são todos protegidos pelo mandado de
segurança, seja por força da disposição expressa da lei seja por força
da interpretação que decorre da atribuição de legitimidade por substituição
processual que consta da lei. A interpretação por substituição
processual é admitida na lei para os direitos individuais homogêneos e
coletivos (mandado se segurança coletivo), para os direitos
individuais plúrimos (mandado de segurança individual por substituição) e para
os direitos difusos (mandado de segurança difuso)”
Seguros quanto à admissão, deferimento da liminar conforme
justificado, exposto e requerido no capítulo V (páginas 9 e 10) que ora
reiteram, e quanto ao integral provimento deste Mandado de Segurança, que
por não ter conteúdo econômico ao mesmo se atribui o valor de R$ 100,00 (cem
reais) para fins tributários.
Rio de Janeiro, 1 de fevereiro de 2016.
JORGE DE OLIVEIRA BÉJA
OAB/RJ no 19.310
JOÃO AMAURY BELEM
OAB/RJ no 110.450
JOSÉ CARLOS DE ANDRADE WERNECK
OAB/DF no 1.240