Quarta, 7 de setembro de 2017
Da Agência Brasil*
Em
várias cidades de todas as regiões do Brasil, a 23ª edição do Grito dos
Excluídos reuniu milhares de pessoas no feriado de 7 de Setembro. O
mote deste ano da tradicional mobilização é “Por direito e cidadania, a
luta é todo dia”. Entre as reivindicações, estão a preservação e a
ampliação de direitos sociais, críticas às reformas propostas pelo
governo e a reversão do decreto que extingue uma reserva mineral na
Amazônia.
Em Brasília, a concentração começou às 9h. De um lado
da Esplanada dos Ministérios, a cúpula do governo federal assistia,
ladeada por milhares de pessoas, ao desfile cívico-militar. Do outro,
próximo ao Museu da República, movimentos sociais e ativistas
protestavam em defesa da democracia e contra as reformas em curso, como a
trabalhista e a previdenciária. O número de participantes não foi
divulgado.
Ao longo de toda a manhã, cantadores, rappers,
batuqueiros e outros integrantes da articulação “Artistas pela
Democracia” dividiram o palco com organizações da sociedade civil que,
uma a uma, apresentaram suas reivindicações. Crianças também
participaram do ato, pintando e erguendo cartazes em defesa da Amazônia,
da reforma agrária, da demarcação de terras indígenas e de direitos
sociais, como educação.
Por volta das 11h30, o grupo saiu em
caminhada em direção ao Congresso Nacional, pedindo a saída do
presidente da República Michel Temer. “O Grito dos Excluídos sempre faz a
defesa da vida. Neste ano, acrescentamos a questão da defesa da
democracia e também a luta por direitos, por conta da conjuntura que
estamos vivendo. Por isso, várias pessoas entoaram a palavra de ordem:
'nenhum direito a menos'”, disse José Boaventura Teixeira, educador
popular e integrante da Cáritas Arquidiocesana de Brasília.
Um
dos organizadores do ato, Teixeira explicou que o Grito dos Excluídos
nasceu da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e, ao longo
de mais de duas décadas, sai às ruas no 7 de setembro para denunciar a
injustiça social. “É uma prática que, de certa forma, sempre foi feita
com o envolvimento de grupos populares e fortemente da Igreja, na
perspetiva da opção pelos pobres e pelos excluídos, que é uma mensagem
antiga e que está sendo fortalecida pelo papa Francisco”, relembrou.
Apesar
de nem a polícia nem a organização do movimento terem divulgado o
número de participantes, Teixeira diz que número de participantes
diminuiu em relação aos 10 mil manifestantes do ano passado. Para ele, a
situação reflete o desânimo provocado pela crise política e pelo
comportamento da mídia. “A mídia não tem incentivado, de forma alguma, a
participação política, a organização do povo para repensar [a
sociedade]. Ao contrário, a mídia tem levado a sociedade a ficar cada
vez mais descrente com a Política, em letra maiúscula”, criticou. Ele
acrescentou que Executivo, Legislativo e Judiciário também têm efetivado
ações importantes sem a participação popular.
Rio de Janeiro
No
Rio de Janeiro, o 23º Grito dos Excluídos saiu pouco depois de 12h da
Rua Uruguaiana e seguiu pela Avenida Presidente Vargas até a Avenida Rio
Branco, logo após o fim do desfile cívico-militar de 7 de setembro. A
passeata ocupou cerca de um quarteirão e chegou à Praça Mauá às 12h30,
sem nenhuma violência ou confronto.
Durante o trajeto, muitas
palavras de ordem em cartazes, faixas e no carro de som em defesa dos
direitos da população e dos trabalhadores e contra as reformas propostas
pelo governo. O fechamento do ato está previsto para as 16h, na
Cinelândia.
Participaram representantes de diversos movimentos
sociais e centrais sindicais, como Frente Internacionalista dos Sem Teto
(Fist), Central de Movimentos Populares, Quilombo da Gamboa, SOS Jaconé
Porto Não, Movimento dos Atingidos por Barragem, de mulheres,
movimentos LGBT, Movimento Contra a Violência na Maré, Movimento
Antimanicomial. Também estiveram presentes trabalhadores da educação, da
Fiocruz e do setor de óleo e gás, além de representantes dos Fóruns de
Saúde do Rio de Janeiro e em Defesa da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (Uerj).
O advogado da Fist, André de Paula, explicou que a
manifestação ocorre em todo o país e representa o grito da maioria. “É o
grito dos excluídos, que é a maioria, denunciando que o Brasil, na
verdade, não é independente, mas sim subordinado ao capital
internacional. A Fist tem como bandeira denunciar as remoções e
despejos. Temos hoje 5 mil prédios vazios enquanto tem pessoas morando
nas ruas”, disse.
O diretor de comunicação do Sindicato dos
Trabalhadores da Fiocruz, Gutemberg Brito, disse que a entidade
participa do ato para defender o Sistema Único de Saúde (SUS). “A
Fiocruz é de estado, trabalhamos para a população brasileira e a nossa
defesa é a defesa do SUS público e de qualidade, contra os retrocessos
que temos visto nos últimos tempos no Brasil. Eles tiram os nossos
direitos e nós tiramos o sossego deles”.
Diretora do
Sindipetro-RJ, Ana Patrícia Laier explica que o sindicato é contra a
venda de ativos da Petrobras. “Estamos tentando fazer uma reação a essa
privatização fatiada da Petrobrás, que vem vendendo os nossos ativos,
malha de gás, campos gigantes do pré-sal, como Carcará, agora vai atacar
o excedente da cessão onerosa”, declarou.
Belo Horizonte
Na
capital mineira, movimentos sociais reuniram-se na Praça Rio Branco, em
frente à rodoviária, de onde seguiram pelas ruas do centro da capital
mineira. A principal bandeira desta edição foi a revogação da reforma
trabalhista.
“Foi lançada uma campanha em todo o país para colher
assinaturas para um projeto de lei de iniciativa popular que prevê a
anulação dos efeitos da reforma trabalhista. Nosso objetivo é construir
uma resistência pra impedirmos que as mudanças entrem em vigor em 11 de
novembro, conforme a data prevista na lei”, explicou Beatriz Cerqueira,
presidente da Central Única dos Trabalhadores em Minas Gerais (CUT-MG).
Os
manifestantes também protestaram com faixas e gritos de ordem contra o
Poder Judiciário, a quem acusam de atuar de forma seletiva. De acordo
com Beatriz Cerqueira, alguns partidos estão sendo criminalizados em
detrimento de outros. Segundo ela, há pessoas sendo presas apenas com
base nas delações e outros, mesmo com provas concretas de corrupção,
permanecem soltos. A presidente da CUT-MG também criticou o instituto da
delação premiada.
“Honestamente, acho que é um novo mecanismo de
tortura. No regime militar, as pessoas eram colocadas no pau-de-arara e
forçadas a entregar seus companheiros. Agora, eles prendem as pessoas
sem provas até minar a resistência e elas falarem o que os procuradores
querem ouvir. E as pessoas acabam falando o que pedem para poder reduzir
a pena e restabelecer o mínimo de seu direito à liberdade”, reclamou
Beatriz.
Também hoje, cerca de 70 famílias sem-teto ocuparam um
imóvel na Pedreira Prado Lopes, comunidade na região noroeste de Belo
Horizonte. Movimentos sociais ligados à moradia dão suporte à Ocupação
Pátria Livre, como foi apelidada. Eles alegam que o local está
abandonado há mais de 10 anos e não cumpre função social, conforme
estabelecido pela Constituição Federal.
De acordo com os
sem-teto, a Polícia Militar ameaçou dar início à reintegração de posse,
mas recuou após o governo de Minas Gerais concordar em receber as
famílias para uma reunião na terça-feira (12). A Agência Brasil
tentou fazer contato com o governo mineiro para confirmar o encontro,
mas não obteve sucesso. A PM informou ter sido acionada pelo
proprietário do imóvel e foi até o local para atender a ocorrência, mas
negou que tivesse a intenção de fazer a reintegração de posse.
Histórico
O
Grito dos Excluídos surgiu dentro da Igreja Católica, em 1995, com o
objetivo de aprofundar o tema da Campanha da Fraternidade do mesmo ano.
Em 1999, o Grito rompeu fronteiras e estendeu-se para as Américas. No
Brasil, os atos ocorrem em diferentes cidades, no dia da Independência, e
reúnem pessoas, grupos, entidades, igrejas e movimentos sociais
comprometidos com as causas dos excluídos.
* Reportagem de Helena Martins (Brasília), Akemi Nitahara (Rio de Janeiro) e Léo Rodrigues (Belo Horizonte)