Quinta, 14 de setembro de 2013
Do TJDF
A juíza de Direito substituta da Primeira Vara da Fazenda
Pública do Distrito Federal condenou o Distrito Federal ao pagamento de
indenização, à título de danos morais, no valor de R$ 200 mil a
paciente, pois sua filha recém-nascida veio a óbito devido a ausência de
leito de UTI neo-natal. O DF também foi condenado ao pagamento de
pensão mensal à autora, à título de indenização por danos materiais, no
valor de 2/3 do salário mínimo, a partir da data que a filha da autora
completaria 14 anos até os 25 anos, e de 1/3 do salário mínimo dos 25
até os 65 anos de idade, ou eventual falecimento da mãe, o que ocorrer
primeiro, em face de renda mensal que a filha poderia contribuir para a
manutenção da família de baixa renda se estivesse viva.
Segundo a paciente, grávida de gêmeos, estava sentindo muitas dores e
por isso procurou o Hospital Universitário de Brasília - HUB, onde foi
medicada e mandada para casa. Contudo, não passando os sintomas, se
deslocou ao posto de saúde da rede pública distrital mais próximo, onde
deu a luz a duas filhas, tendo uma delas já nascido sem vida. A mãe e a
outra criança, esta em estado grave, foram encaminhadas para o hospital
do Gama, onde não havia leitos disponíveis na UTI neo-natal naquela
ocasião. Três dias depois foi concedida uma liminar determinando que o
Distrito Federal internasse a menor em um prazo máximo de 12 horas, na
rede pública, ou na falta de vaga, em hospital da rede particular, às
custas do poder público. A determinação judicial não foi cumprida, vindo
a criança a falecer dois dias depois.
O Distrito Federal advogou pela ausência de nexo de causalidade entre
o fato da morte da filha da autora e o atendimento prestado pelos
hospitais da rede pública distrital procurados, que justificasse a
responsabilidade objetiva do ente estatal. Da mesma forma, sublinhou que
não houve omissão específica do Distrito Federal causadora da situação
propícia para a ocorrência do evento danoso, razão pela qual não se
configuraria sua responsabilidade subjetiva. A título de argumentação,
rogou pela diminuição dos valores indenizatórios, em caso de eventual
condenação.
A juíza decidiu que os documentos juntados à inicial, bem como os
acostados pelo réu, não deixam margem para dúvida sobre o estado grave e
delicado em que se encontrava a filha da autora sobrevivente ao parto. O
relatório médico é categórico ao afirmar que a criança se encontrava em
estado grave e instável, e ainda ao advertir de forma clara que o
recém-nascido necessitava de cuidados intensivos com risco iminente de
morte. A situação era merecedora de especial e dedicada atenção por
parte do poder público, em seu dever de garantir à população o direito
fundamental à saúde, e exigia-lhe uma ação instantânea. Descumprida a
ordem judicial mencionada, o réu assumiu o risco de ser responsabilizado
pela morte da criança em face da sua desídia.
O ente estatal, além de ter agido em total desobediência à
determinação que lhe foi imposta pelo Poder Judiciário, também se
conduziu em completo descompasso com o que lhe ordena a Constituição
Federal e a Lei Orgânica, no que se refere à assistência integral da
saúde de seus cidadãos. No contexto dos autos, até mesmo a possível
alegação de falta de recursos não socorre, e muito menos justifica a
reticência do Distrito Federal. Visível perfeitamente, portanto, a
caracterização da responsabilidade civil subjetiva do Estado no dano
sofrido pela autora, mãe da criança falecida. O réu podia e devia ter
agido - por obrigação legal e constitucional e por mandamus judicial,
para garantir o procedimento adequado ao tratamento intensivo da
recém-nascida, e assim não o fez, por completa e injustificável
omissão. Se a paciente necessitava de específico tratamento para a sua
sobrevida e o réu que estava obrigado a fornecê-lo, inclusive por
determinação judicial, em um prazo de 12 horas, não agiu diligentemente
nesse sentido, não pode argüir em seu favor, na tentativa de dirimir a
culpa, que despendeu todos os esforços e recursos financeiros
necessários à melhora do estado da paciente, por ser certo e evidente
que assim não o fez. O dano sofrido pela autora com a morte da filha é
evidente. Na esfera moral, está concretizado pelo desamparo e angústia
por ela vivenciados, superiores aos admitidos como inerentes à vida em
sociedade, e ainda agravados pelo sentimento de total impotência ao ver
sua segunda filha sucumbir sob o descaso do Poder Público.