Segunda, 18 de setembro de 2017
Elaine Patricia Cruz - Repórter da Agência Brasil
O Cemitério Municipal de Campo Grande, na zona sul da capital
paulista, recebeu hoje (18) uma placa em memória de três vítimas da
ditadura militar, mortas por agentes do Estado, e que ali foram
sepultadas. A instalação da placa atende uma recomendação das comissões
da Verdade Nacional e Municipal de São Paulo, que recomendaram a criação
de marcos de memória relacionados às violações de direitos na época da
ditadura.
A placa homenageou Emmanuel Bezerra dos Santos e Manoel
Lisboa de Moura, militantes do Partido Comunista Revolucionário (PCR),
que morreram no dia 4 de setembro de 1973, após serem torturados no
DOI-Codi em São Paulo. Além deles, a placa também traz o nome de Santo
Dias da Silva, um operário metalúrgico que foi assassinado por um agente
do Estado quando tinha 37 anos, durante um piquete na frente da fábrica
onde trabalhava.
Ana Maria do Carmo Silva, viúva de Santo Dias,
como ele é mais conhecido, acompanhou a cerimônia de inauguração da
placa. "Fui casada durante 14 anos e fui separada brutalmente dele pela
ditadura. Foi uma morte estúpida, mas que não acabou. Hoje, se tem uma
árvore e se tem uma placa, é a luta do Santo Dias e de tantos
trabalhadores" , disse.
Ana Maria disse que Santo Dias foi morto
em frente a uma empresa metalúrgica onde trabalhava. "Ele estava em
greve. Veio a repressão. Reprimiram todos os trabalhadores e, neste
momento, o Santo, que era uma das lideranças, recebeu um tiro à
queima-roupa. E queriam desaparecer com o corpo".
Além da placa,
também foram plantados três ipês no local em memória das três vítimas.
"A árvore é a vida. A placa é uma memória que a gente acredita e que vai
continuar para mostrar que houve ditadura e que ela nunca pode voltar".
A
procuradora Eugênia Augusta Gonzaga, presidente da Comissão Especial
sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, disse que a instalação da placa é
uma medida de memória. "Muito mais do que uma homenagem, é você ter um
marco histórico demonstrando o que aconteceu naquele local, que
determinados cemitérios como este foram palco de ocultações de
cadáveres. É muito importante que a população de hoje saiba a maneira
como essas pessoas morreram", disse.
Para a secretária municipal
de Direitos Humanos, Eloisa Arruda, a placa é uma marca de memória que
ajuda a demonstrar que o "Estado brasileiro não compactua com os
desaparecimentos forçados, com o justiçamento com as próprias mãos.
Ninguém tem o direito de matar pessoas e fazer com que os corpos
desapareçam, e depois não prestar satisfações. Isto é um retrocesso e o
que queremos é que prevaleça o Estado de Direito. As pessoas, mesmo que
tenham cometido infrações penais, devem ser julgadas e processadas. Se
temos o próprio Estado como autor de atos desumanos, cruéis e de
tortura, aí a situação se torna muito mais grave", disse.
Segundo
a procuradora, além dos três corpos enterrados, outros corpos de
vítimas da ditadura podem ter sido sepultados no Cemitério de Campo
Grande, sem conhecimento da família. "Existem desaparecidos políticos,
dezenas deles em São Paulo, que foram mortos no período e não consta
para onde foram. Então é possível que outras pessoas tenham vindo para
cá. É preciso aprofundar as investigações".
Placas
Essa
é a segunda placa de memória instalada em um cemitério em São Paulo. A
primeira foi colocada no Cemitério de Perus, no início do mês. Na
próxima semana, uma placa será instalada no Cemitério de Vila Formosa,
na zona leste da capital.
Segundo documentos obtidos pela
Comissão da Memória e Verdade, 79 vítimas da repressão foram sepultadas
em São Paulo. Desse total, 53 tiveram como destino os cemitérios de
Lajeado, Campo Grande, Vila Formosa, Dom Bosco e Perus. Desses, 48 foram
enterrados sem o conhecimento da família, como indigentes ou com nomes
falsos. Pelo menos 17 não foram localizados até hoje, embora o Estado
tenha documentos que comprovem que eles foram enterrados nesses locais.
Por
causa de três incêndios ocorridos em Lajeado, apenas um caso foi
comprovado até o momento: o de Raimundo Eduardo da Silva. Mas a suspeita
é que vários militantes tenham sido enterrados em Lajeado.