Sexta, 8 de fevereiro de 2013
Alex Rodrigues
Repórter Agência Brasil
Brasília - Catorze dias após a juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima, da Justiça Federal em Belo Horizonte (MG), declarar-se incompetente para julgar os réus
da chamada Chacina de Unaí, transferindo o tribunal de júri de Belo
Horizonte para a cidade onde, em 2004, quatro servidores do Ministério
do Trabalho foram assassinados, o Ministério Público Federal em Minas
Gerais (MPF-MG) ainda aguarda a cópia do processo para poder concluir o
recurso contra a decisão judicial.
Na última segunda-feira (4), a procuradora da República Mirian
Moreira Lima apresentou à 9ª Vara a manifestação preliminar do MPF
contra a sentença. O recurso, contudo, depende da análise dos autos. Só
após conhecer as justificativas da juíza para não presidir o julgamento
da ação penal – que há nove anos tramita na capital mineira –, a
procuradora terá condições de preparar os argumentos com os quais vai
tentar demonstrar que a transferência do júri é “infundada” e “contraria
ao que estabelece a legislação”.
“A decisão da juíza não observou as normas constitucionais. A lei de
organização do Judiciário Federal e Estadual são diferentes e a juíza
não levou em conta o artigo da legislação federal que determina que o
juiz onde a ação foi proposta deve presidir o tribunal”, disse a
procuradora à Agência Brasil, ao se referir ao Decreto-Lei nº 253, de 1967.
No Artigo 4º, o decreto-lei estabelece que, nos crimes de
competência da Justiça Federal, a presidência do Tribunal do Júri cabe
ao “juiz a que competir o processamento da respectiva ação penal”. Ou
seja, onde o processo foi ajuizado. De acordo com a procuradora, o
Tribunal Regional Federal (TRF), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o
Supremo Tribunal Federal (STF) já avalizaram esse entendimento.
“Esse será o principal fundamento do Ministério Público para tentar
reverter a decisão no Tribunal Regional Federal. A legislação não
permite que, neste estágio, os autos devam ser encaminhados para a vara
recém-criada em Unaí”, acrescentou a procuradora, adiantando que, caso o
recurso seja rejeitado, o MPF vai pedir o desaforamento do caso, que é a
transferência do júri de Unaí para outro local a fim de preservar as condições de um julgamento imparcial, seguro e rápido.
“As pessoas denunciadas tem um poder econômico e político muito
grande em Unaí, razão por que a cidade pode não ser o melhor local para o
julgamento deste júri”, argumentou Mirian.
O crime, que chegou a repercutir mundialmente, ocorreu em 28 de
janeiro de 2004. Emboscados enquanto faziam uma fiscalização de rotina
na zona rural de Unaí, a cerca de 500 quilômetros de Belo Horizonte, os
auditores fiscais do Trabalho Erastótenes de Almeida Gonçalves, João
Batista Soares Lage e Nelson José da Silva e o motorista Ailton Pereira
de Oliveira foram mortos a tiros.
Ao fim de seis meses de investigação, a Polícia Federal pediu o
indiciamento de nove pessoas por homicídio triplamente qualificado: os
fazendeiros e irmãos Antério
(ex-prefeito da cidade e um dos maiores produtores de feijão do país) e
Norberto Mânica; os empresários Hugo Alves Pimenta, José Alberto de
Castro e Francisco Elder Pinheiro; além de Erinaldo de Vasconcelos Silva
e Rogério Alan Rocha Rios, apontados como autores do crime; Willian
Gomes de Miranda, suposto motorista da dupla de assassinos, e Humberto
Ribeiro dos Santos, acusado de ajudar a apagar os registros da passagem
dos pistoleiros pela cidade.
Um dos réus, o empresário Francisco Elder, morreu no último dia 7,
aos 77 anos. Ele aguardava o julgamento em liberdade. Erinaldo, Rogério e
Willian estão presos em Contagem, região metropolitana de Belo
Horizonte, à espera da sentença judicial. Ribeiro dos Santos foi solto a
pedido do próprio MPF, pois o crime pelo qual foi denunciado
prescreveu. Os outros réus aguardam o julgamento em liberdade,
beneficiados por habeas corpus. Um deles, Antério Mânica, foi eleito prefeito de Unaí pouco depois do crime e reeleito em 2008.
Ao comentar as ações da defesa dos réus para protelar o julgamento e
a demora da própria Justiça para levar o assunto a júri, a procuradora
Mirian Moreira Lima disse não saber estimar quanto tempo mais a
discussão sobre a decisão da juíza poderá atrasar o julgamento.
“O Ministério Público vai ser bem célere, mas isso ainda comporta
intervenções da defesa [dos réus]. Então, é difícil e não podemos
responder quanto tempo vai demorar. Pode ser uma questão de meses ou de
dias. Tudo vai depender da reação da defesa, já que se a Justiça acatar o
recurso do Ministério Público, a defesa poderá voltar também a
recorrer”, concluiu a procuradora.
A Agência Brasil entrou em contato com a assessoria
do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) para saber se há
previsão de quando a procuradora deve ser intimada para apresentar as
razões do recurso. A assessoria do órgão informou que o assunto segue “a
tramitação processual normal” e que a juíza Raquel Vasconcelos Alves de
Lima só se manifesta sobre o processo nos autos.