Sexta, 1 de fevereiro de 2013
Denúncia de Gurgel ao Supremo, à qual ÉPOCA teve
acesso, revela que o senador forjou notas fiscais para justificar
operações com lobista – Renan responderá pelos crimes de peculato,
falsidade ideológica e uso de documentos falsos; pena pode chegar a 23
anos de prisão
Os 81 senadores da República irão eleger daqui a pouco como presidente
da Casa um colega denunciado na última semana pela Procuradoria-Geral da
República ao Supremo Tribunal Federal pelos crimes de peculato (desvio
de dinheiro público, 2 a 12 anos de cadeia), falsidade ideológica (1 a 5
anos de cadeia) e uso de documento falso (2 a 6 anos de cadeia). ÉPOCA
teve acesso na noite de quinta-feira (31), com exclusividade e na
íntegra, à devastadora denúncia oferecida pelo procurador-Geral da
República, Roberto Gurgel, contra o senador Renan Calheiros,
do PMDB de Alagoas, no dia 24 de janeiro. Gurgel é taxativo: Renan
apresentou, ao Senado da República, notas frias e documentos
falsificados para justificar a origem dos recursos que o lobista de uma
grande empreiteira entregava, em dinheiro vivo, à mãe de sua filha, a
título de pensão. Está provado, finalmente, que Renan não tinha
condições financeiras de arcar com a pensão – e que não fez, de fato,
esses pagamentos à mãe de sua filha. De quebra, descobre-se na denúncia
que Renan desviou R$ 44,8 mil do Senado. Nesse caso, também usou notas
frias para justificar o desfalque nos cofres públicos.
Se condenado pelos três crimes no STF, o novo presidente do Senado
poderá pegar, somente nesse processo, de 5 a 23 anos de cadeia – além de
pagar multa aos cofres públicos, a ser estipulada pela corte. (Há,
ainda, outros dois inquéritos tramitando contra Renan no STF.) A
denúncia de Gurgel está no gabinete do ministro Ricardo Lewandowski
desde segunda-feira. Caberá a ele encaminhar, aos demais ministros do
STF, voto favorável ou contrário à denúncia. Lewandowski não tem prazo
para dar seu voto.
A denúncia de Gurgel, fundamentada em anos de investigação da PGR e da
PF, centra-se no episódio que deu início ao calvário de Renan, em 2007,
quando ele era presidente do Senado e, após meses de incessantes
denúncias, viu-se obrigado a renunciar ao cargo – mas não ao mandato.
Naquele ano, descobriu-se que o lobista Cláudio Gontijo, da empreiteira
Mendes Júnior, pagava, em dinheiro vivo, R$ 16,5 mil mensais à
jornalista Mônica Veloso, com quem o senador tivera uma filha. No mesmo
período em que o lobista Gontijo bancava as despesas de Renan, entre
2004 e 2006, a Mendes Júnior recebia R$ 13,2 milhões em emendas
parlamentares de Renan destinadas a uma obra no Porto de Maceió – obra
tocada pela mesma Mendes Júnior. Abriu-se um processo no Conselho de
Ética no Senado. Renan assegurou aos colegas que bancara a pensão do
próprio bolso, e apresentou documentos bancários e fiscais que
comprovariam sua versão. O dinheiro seria proveniente de investimentos
do senador em gado. A denúncia da PGR derruba por completo a versão
bovina de Renan – e mostra que, para se montar a versão fajuta, Renan
cometeu muitos crimes.
Diz Gurgel na denúncia (leia o trecho abaixo): “Em síntese,
apurou-se que Renan Calheiros não possuía recursos disponíveis para
custear os pagamentos feitos a Mônica Veloso no período de janeiro de
2004 a dezembro de 2006, e que inseriu e fez inserir em documentos
públicos e particulares informações diversas das que deveriam ser
escritas sobre seus ganhos com atividade rural, com o fim de alterar a
verdade sobre fato juridicamente relevante, qual seja, sua capacidade
financeira”. Para piorar: “Além disso, o denunciado utilizou tais
documentos ideologicamente falsos perante o Senado Federal para embasar
sua defesa apresentada (ao Conselho de Ética)”. “Assim agindo”, diz
Gurgel, “Renan Calheiros praticou os delitos previstos nos artigos 299
(falsidade ideológica) e 304 (uso de documento falso), ambos do Código
Penal.”