Segunda,
4 de fevereiro de 2013
Por
Ivan de Carvalho

Lá,
o senador Renan Calheiros, que era líder do PMDB, foi eleito presidente do
Senado Federal, cargo que já ocupara antes e ao qual renunciara em um acordo
para não ter seu mandato cassado e suspensos, como pena acessória e automática,
seus direitos políticos.
Calheiros
fora acusado de “deixar” que uma empresa privada pagasse, a uma jornalista com
a qual tivera uma filha, a pensão devida a esta última. Era uma pensão polpuda.
O presidente do Senado, durante uma investigação interna, disposto a repelir a
acusação do pagamento de despesa pessoal por uma empresa privada, o que seria
fatal, alegou ser pecuarista e dispor de meios próprios para o pagamento. E
então apresentou como prova notas fiscais da venda de vacas realizada para o
pagamento da pensão.
Logo
os maledicentes – e em Brasília são mais numerosos que em qualquer outro lugar
do mundo – cismaram que as notas fiscais apresentadas eram (e continuariam
sendo) frias, assim como eram frias também as vacas. Aí a Procuradoria Geral da
República mete o nariz onde não é chamada e, faltando oito dias para a eleição
de Renan Calheiros para o mesmo alto cargo ao qual renunciara antes, apresenta,
por intermédio do procurador geral Roberto Gurgel, uma denúncia contra o
teimoso senador ao Supremo Tribunal Federal. Uma denúncia por peculato (desvio
de dinheiro público, com pena de 2 a 12 anos de prisão), falsidade ideológica
(1 a 5 anos de prisão) e o uso de documento falso (2 a 6 anos de prisão).
Um
absurdo. Como é que se acusa o então futuro e já agora atual presidente do
Senador e do Congresso, além de terceira pessoa na linha de sucessão do
presidente da República? É muita maldade. Uma denúncia dessa certamente deixa a
cidadania brasileira cabisbaixa, macambúzia, sorumbática e meditabunda. E
compromete profundamente a já abalada imagem do nosso país em âmbito
internacional.
Mas
essa atitude impensada do procurador geral da República não é tudo. Por mais
que se chegue ao fundo do poço, pode-se continuar cavando. No caso do
presidente Renan Calheiros, pior que a denúncia é a defesa. Não me refiro à
defesa judicial que ele terá de fazer caso a denúncia seja aceita pelo Supremo
Tribunal Federal. Aí, não tem problema, tem as vacas frias. Refiro-me à defesa
que já está sendo feita por alguns políticos.
Um
deles, José Sarney, que no discurso em que pela quarta vez se despediu de
mandato de presidente do Senado, ignorou os escândalos ocorridos durante sua
presidência, como o dos atos secretos, decisões que não obedeciam ao imperativo
constitucional da publicidade e não eram, assim, publicadas no Diário Oficial
da União. Mas não ignorou as excelsas qualidades de seu correligionário e sucessor
Renan Calheiros. Disse que a eleição dele garante ao Senado continuar “seu
caminho de transparência e equilíbrio democrático”. Não ficou claro se Sarney
ironizava o desempenho dele mesmo ou o futuro desempenho do sucessor.
Outro
amigo da onça que esmerou-se em defender publicamente Renan Calheiros foi o
ex-presidente da Câmara federal, deputado João Paulo Cunha, condenado por
peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo STF no processo do
Mensalão. “O Renan é um quadro político que já há muitos anos tem demonstrado
sua capacidade. O PT fez certo em apoiá-lo”, sentenciou o sentenciado.
Antes,
em seu blog, o ex-presidente do PT e ex-ministro-chefe da Casa Civil do
presidente Lula, José Dirceu, condenado por formação de quadrilha e corrupção
ativa, já havia defendido Renan Calheiros, melhor dizendo, havia jogado pedras
nos seus “detratores”, acusando haver uma “ofensiva midiática” respaldada pelo
Ministério Público Federal e um “falso moralismo” do tipo udenista, que...
Ah,
parem! Isso é um abuso com o novo presidente do Senado.
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Este arquivo foi publicado
originariamente na Tribuna da Bahia desta segunda.
Ivan de Carvalho é jornalista
baiano.