Domingo, 16 de agosto de 2015
Da Tribuna da Internet
Pedro Beja Aguiar
Existe
nos estudos de teoria da História uma divergência nas análises dos teóricos
sobre a forma como entender os fatos que se desencadeiam no tempo: a primeira
forma são as noções de ruptura e continuidade na historiografia, enquanto a
segunda é a noção de um movimento contínuo da história, em que não haveria
nenhuma ruptura, mas sim oscilações com intensidade maior ou menor conforme os
fatos e as respostas a estes fatos fossem acontecendo.
Estas
duas possibilidades de interpretação do tempo e dos eventos na História – mesmo
que a primeira já esteja superada para alguns teóricos – se encaixam muito bem
a interpretação da História do Brasil, principalmente à história mais recente.
Poderíamos
pensar a atividade de inúmeros representantes políticos no Brasil como uma
continuidade. Ou então, pensar alguns momentos decisivos da nossa história que
possuem marcos de ruptura. Ou ainda, pensarmos a história do Brasil recente
através de uma leitura contínua, em que acontecimentos ora ganham importância
ora diminuem na medida em que os fatos vão sendo apurados.
Dos
dois casos, prefiro a interpretação de uma continuidade histórica, cotejada por
elementos mais ou menos importantes numa leitura do todo.
PRIMEIRO
TRAGÉDIA, DEPOIS FARSA
Em “O
18 Brumário”, a frase emblemática de Karl Marx – “A história se repete, a
primeira vez como tragédia e a segunda como farsa” – ilustra muito bem as duas
interpretações teóricas do tempo na História.
Pela
primeira vez na história do país a corrupção está passando por uma inspeção
criteriosa e direta em busca dos grandes mentores de um esquema escuso que tem
sua origem no século XVI, já na colonização portuguesa – quando funcionários
públicos efetuavam um comércio ilegal de produtos brasileiros, transgredindo as
ordens da Coroa.
Liderada
por juízes de alta índole, as diversas operações de “limpeza” do sistema
político e econômico brasileiro colidem, diariamente, com personalidades
políticas que são bastante conhecidas do público em geral. Figuras como José
Dirceu, Fernando Collor de Mello, Eduardo Cunha, José Genoíno, entre outros,
são personalidades repetidas nos noticiários. No entanto, a primeira vez que
tomamos conhecimento deles foi como tragédia. Agora, ao vemos como uma farsa da
nossa política.
UM
CASO RECENTE
Há
cerca de uma semana todos os livros de História do Brasil se tornaram
incompletos de uma maneira pouco vista. Não mais de punho cerrado, sem o
sorriso sarcástico de 2013, José Dirceu foi novamente levado pela Polícia
Federal em Brasília à penitenciária. Agora na Operação Lava Jato, não mais
pelos escândalos do Mensalão, Dirceu é um dos maiores representantes do que
tenho chamado aqui de uma continuidade da história do Brasil. Por ser adepto da
interpretação histórica de oscilações dos acontecimentos numa linha de tempo
imaginária, vejo o ex-ministro da Casa Civil como um marco da nossa história,
uma metáfora das últimas décadas da política brasileira recente, pois outrora
foi símbolo de defesa da democracia em meio a uma ditadura militar,
imortalizado mostrando os punhos algemados em foto com outros 14 presos
políticos que seriam trocados pelo embaixador norte-americano Charles Elbrick.
E hoje…
UM
MOMENTO AUSPICIOSO
De
toda a nossa história, vivemos hoje o momento mais auspicioso da política. Pode
parecer contraditório o que escrevo,até mesmo passível a inúmeras críticas, mas
se nos detivermos mais aos resultados das operações e menos as atividades
perpetradas pelos políticos, muitos leitores me darão razão.
Quando
tivemos tantas operações de caça à corrupção e aos corruptores no Brasil? Em
que outro momento as mídias puderam revelar tantos casos de políticos ladrões
e, ao mesmo tempo, noticiar prisões destes mesmos figurões?
Somos
um país embalado pela cordialidade, educado pela falácia de uma democracia
racial e amadurecido à custa da desigualdade, em todas as esferas. É de se
comemorar, mesmo que em nome de uma crise também nunca vista, que estejamos
vivendo um país em que a corrupção esteja sendo tratada no seu devido lugar: as
primeiras páginas dos jornais.