Quinta, 20 de agosto de 2015
Do MPF
Fato criminoso envolve o recebimento de propina para construção de dois
navios-sondas da Petrobras
O procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, enviou denúncia ao Supremo Tribunal Federal em que acusa o
presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, de ter recebido propina no
valor de ao menos US$ 5 milhões para viabilizar a construção de dois
navios-sondas da Petrobras, no período entre junho de 2006 e outubro de 2012.
Janot pede a condenação de Cunha pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de
dinheiro e da ex-deputada Federal Solange Almeida por ter participado de
pressão pelo pagamento de valores retidos, incorrendo em corrupção passiva.
Segundo a denúncia, dentro do esquema ilícito
investigado na Operação Lava Jato, Eduardo Cunha recebeu vantagens indevidas
para facilitar e viabilizar a contratação do estaleiro Samsung, responsável
pela construção dos navios-sondas Petrobras 10000 e Vitoria 10000, sem
licitação, por meio de contratos firmados em 2006 e 2007. A intermediação foi
feita por Fernando Soares, operador ligado à Diretoria Internacional da
Petrobras, de indicação do partido PMDB. A propina foi oferecida, prometida e
paga por Júlio Camargo.
O procurador-geral explica que, para
dar aparência lícita à movimentação das propinas acertadas, foram celebrados
dois contratos de comissionamento entre a Samsung e a empresa Piemonte, de
Júlio Camargo. Dessas comissões saíram as propinas prometidas a Fernando
Soares, Eduardo Cunha e ao então diretor da área internacional da Petrobras,
Nestor Cerveró, que levou a questão à Diretoria Executiva e obteve a aprovação
dos contratos relativos aos navios-sondas, nos termos propostos pela Samsung.
Por causa dos contratos, a Samsung
transferiu, em cinco parcelas pagas no exterior, a quantia total de US$ 40,355
milhões para Júlio Camargo, que em seguida transferiu, a partir da conta
mantida em nome da offshore Piemonte, no Uruguai, parte destes valores para
contas bancárias, também no exterior, indicadas por Fernando Soares. Cunha é
acusado de lavagem de dinheiro por ocultar e dissimular o recebimento dos
valores no exterior em contas de empresas offshore e por meio de empresas de
fachada.
Pressão pelo pagamento - As
investigações demonstraram que, a partir de determinado momento – mais
especificamente após os recebimentos das sondas, a Samsung deixou de pagar as
comissões para Júlio Camargo, acabando por inviabilizar o repasse da propina
aos destinatários finais. Com isso, Eduardo Cunha passa a pressionar o retorno
do pagamento das propinas, valendo-se de dois requerimentos perante a Comissão
de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, formulados pela
então deputada Solange Almeida, em julho de 2011.
Os requerimentos solicitavam
informações sobre Júlio Camargo, Samsung e o Grupo Mitsui, envolvido nas
negociações do primeiro contrato. Um foi dirigido ao Tribunal de Contas da
União e outro ao Ministério de Minas e Energia. Segundo Janot, a ex-deputada
tinha ciência de que os requerimentos seriam formulados com desvio de
finalidade e abuso da prerrogativa de fiscalização inerente ao mandato popular,
para obtenção de vantagem indevida. Para ele, não há dúvidas de que o
verdadeiro autor dos requerimentos, material e intelectual, foi Eduardo Cunha.
De acordo com as investigações,
Eduardo Cunha elaborou os dois requerimentos, logado no sistema da Câmara como
o usuário “Dep. Eduardo Cunha”, utilizando sua senha pessoal e intransferível,
e os arquivos receberam os metadados do usuário logado no momento de sua
criação. Depois, os requerimentos foram autenticados pelo gabinete da então
deputada Solange Almeida, sendo que ela não era integrante ou suplente da
Comissão de Fiscalização e não havia apresentado nenhum outro requerimento à
comissão naquele ano.
Na denúncia, Janot informa que, em
razão da pressão exercida, os pagamentos foram retomados, por volta de setembro
de 2011, após reunião pessoal entre Fernando Soares, Júlio Camargo e Eduardo
Cunha. O valor restante foi pago por meio de pagamentos no exterior, entregas
em dinheiro em espécie, simulação de contratos de consultoria, com emissão de
notas frias, e transferências para igreja vinculada a Eduardo Cunha, sob a
falsa alegação de que se tratava de doações religiosas.
Além da condenação criminal, o
procurador-geral pede a restituição do produto e proveito dos crimes no valor
de US$ 40 milhões e a reparação dos danos causados à Petrobras e à
Administração Pública também no valor de US$ 40 milhões.