Sexta, 29 de janeiro de 2016
Do Correio da Cidadania
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Escrito por Nildo Ouriques* nesta quinta, 28/2/2016 |
Nos
anos 80, quando algum jornalista perguntava ao Lula se ele era de
esquerda ou direita, com frequência ouvia como resposta um sonoro "sou
torneiro-mecânico".
A maior parte de seus apoiadores sorria como quem diz, "o chefe é
mesmo foda, sabe sair de qualquer armadilha montada pela imprensa
burguesa". Outros, mais afinados com o colonialismo bocó que comanda a
linguagem, davam de ombros e se deliciavam com a "boutade" do presidente
do partido.
Nós, desde uma perspectiva de esquerda, caíamos matando, numa
tentativa tão importante quanto ineficaz de empurrar o PT para uma
posição radical, pretensão que o tempo não tardou em demonstrar que era,
de fato, inútil.
No comando do PT, via Articulação, a antiga tenência majoritária,
Lula e Zé Dirceu indicavam que este tipo de definição não interessava
aos trabalhadores. Era coisa de intelectuais....
No entanto, mais tarde, quando necessário, a intelectualidade
paulista aderiu a Lula sem reservas e demonstrou o quanto pode ser útil
no terreno da política.
Marilena Chauí foi sem dúvida mais longe que qualquer outro com seu
desmedido brado segundo o qual Lula teria capacidade de iluminar o mundo
quando falava. Marco Aurélio Garcia, antes dela, "definia" o PT como
"pós-comunista" e "pós-socialdemocrata". Entre a apologia e a
indefinição, o PT se consolidava como principal partido da ordem no
país. Era o que importava, a vida demonstrou.
Eu sei que após tantos anos de petismo (na oposição e especialmente
no governo), é quase ocioso recordar para crescente parte da opinião
pública que os governos do PT nada possuem de esquerda. Os banqueiros,
latifundiários, industriais e comerciantes desfrutam de um governo
orgânico na defesa de seus interesses.
Porém, é também claro que a direita não perderá oportunidade de colar
no PT o rótulo de "esquerda", conhecida operação conveniente a ambos: o
sistema petucano não medirá esforços para impedir a erupção do
radicalismo político que precisamos construir, indispensável para
inaugurar no país as grandes transformações inerentes à Revolução
Brasileira.
Enfim, há um espaço à esquerda para ser ocupado e que não deve ser ocupado...
É neste contexto que a declaração de Lula em entrevista com blogueiros na semana passada (publicada no Valor, quarta-feira, 21 de janeiro)
tem valiosa serventia, pois agora, após tantos anos de clara
fidelidade, Lula finalmente assume o liberalismo como bandeira ou
ideário.
"Sou liberal", disse ele, sem vacilação. Não se trata de surpresa,
mas obviamente é um alívio para todos os socialistas, comunistas e
revolucionários. O cinismo moderno recebeu nova contribuição, mas o
desconforto agora não é mais nosso, é assunto dos liberais.
Nildo Ouriques é economista.
Retirado de Diário Liberdade.
A publicação deste texto é livre, desde que citada a fonte e o endereço eletrônico da página do Correio da Cidadania