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(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

Órgão de combate à tortura é impedido de inspecionar unidades no Ceará e PFDC pede esclarecimentos ao governo federal

Sexta, 15 de fevereiro de 2019
Do MPF
Ministério tem até cinco dias para informar sobre obstrução ao funcionamento do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, criado pela Lei 12.847/2013
Foto que mostra a grade de uma cela repleta de braços dos presos ali encarcerados.
Imagem: Agência Brasil
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal, deu prazo de cinco dias ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos para que sejam prestadas informações acerca da garantia das prerrogativas legais que regem o funcionamento do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), órgão instituído pela Lei Federal 12.847/2013.
Nesta sexta-feira (15), o MNPCT informou que teve negada pelo Ministério autorização de viagem para inspeção que seria realizada em unidades do sistema prisional e do sistema socioeducativo do Ceará, assim como durante audiências de custódia no estado. Desde o início do ano, o Mecanismo vem recebendo e acompanhando graves denúncias de maus tratos, tratamentos degradantes, desumanos, cruéis e tortura em estabelecimentos da localidade. 

Para a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, a negativa para a realização da inspeção impede o cumprimento da função primordial do MNPCT, violando frontalmente a legislação vigente e desrespeitando os preceitos legais que orientam o funcionamento do órgão, criado em 2013 como resultado da lei que instituiu o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura no Brasil.
O Mecanismo é composto por 11 especialistas independentes, que têm como prerrogativa a visita e identificação de violações de direitos humanos em instituições de privação de liberdade – tais como centros de detenção, estabelecimentos penais, hospitais psiquiátricos, abrigos para idosos, unidades socioeducativas ou centros militares de detenção disciplinar.

Em conjunto com o Comitê Nacional de Combate à Tortura, o órgão atende a compromisso internacional assumido pelo Estado brasileiro em 2007, com a ratificação do Protocolo Facultativo à Convenção Contra Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes da Organização das Nações Unidas (ONU).

Independência e autonomia

No ofício encaminhado à ministra Damares Alves, a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, ressalta que a Lei 12.847/2013 assegura aos membros do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura independência em sua atuação. A PFDC lembra que o  mesmo ato normativo, em seu artigo 10, inciso VI, assegura aos integrantes do órgão a escolha dos locais a visitar e das pessoas a serem entrevistadas.
  
O órgão do Ministério Público Federal esclarece também que, de acordo com a recente organização administrativa promovida pela MP 870/2019, compete ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos garantir “o apoio técnico, financeiro e administrativo necessários ao funcionamento do SNPCT, do CNPCT e do MNPCT, em especial à realização das visitas periódicas e regulares previstas no inciso I do caput do art. 9º por parte do MNPCT, em todas as unidades da Federação”.

No documento, a Procuradoria ressalta que a proibição à tortura e a outros tratamentos desumanos ou degradantes foi afirmada enfaticamente pela Constituição de 1988 em dois incisos diferentes do artigo 5º e que a preocupação em impedir e prevenir tais práticas também se traduziu em inúmeros compromissos em âmbito internacional – entre eles, a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, assinada em Assembleia Geral das Nações Unidas em 1984 e promulgada pelo Decreto 40/1991, e o próprio Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes.

“Assim, e diante da gravidade da situação, a ausência de resposta pelo Ministério no prazo assinalado implicará o encaminhamento da questão para a adoção das providências cabíveis nos planos judicial e extrajudicial”, ressalta o documento.