Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 15 de junho de 2023

Olhos D´Água: A Praça é do Padre? A Feira é do Povo!

Quinta, 15 de junho de 2023


Olhos D´Água: A Praça é do Padre? A Feira é do Povo!

Da Xapuri Socioambiental —15/06/2023
Iolanda Rocha
Cultura  Democracia 

Olhos D´Água: A Praça é do Padre? A Feira é do Povo! 

O Distrito de Olhos D’água, localizado no município de Alexânia, estado de Goiás, vive um triste dilema neste momento:  Depois de acontecer a 96ª Feira do Troca no primeiro final de semana de junho, o Padre Cleyton Garcia, da paróquia de Alexânia,  informou a comunidade que essa foi a última Feira do Troca a se realizar na praça Santo Antônio. 

Por Iolanda Rocha

O padre quer acabar com um projeto comunitário que duas vezes por ano – no primeiro final de semana de junho e no primeiro final de dezembro – ocorre na praça central do povoado desde data década de 1970.

A primeira Feira do Troca ocorreu em 1974, criada pela Professora da UNB Laís Aderne. Portanto há quase 50 anos. A professora Laís percebendo as dificuldades da comunidade local e o potencial das pessoas em criarem as obras de artesanatos, além da agricultura que não conseguiam fazer girar a economia, resolveu criar uma feira comunitária para fortalecer a economia local de subsistência. 

Ela teve a ideia de levar as pessoas das proximidades, principalmente de Brasília, que fica a 100 km do distrito, para trocarem os objetos, roupas, calçados, utensílios domésticos que não estavam mais sendo utilizados, por artesanatos e produtos da agricultura local.

 A coisa deu tão certo que Olhos D’Água passou a ser conhecido por toda a região.  O Distrito havia sofrido um impacto depois da transferência da sede do município para Alexânia, em função da rodovia que liga Brasília a Goiânia. 

A ideia da Feira do Troca foi tão brilhante que se tornou o evento mais importante do município de Alexânia e de toda esta região do entorno mais próximo de Brasília e praticamente no meio entre Brasília e Goiânia. 

Importante ressaltar que a Feira do Troca nasceu com o caráter de solidariedade e também de valorização dos pequenos produtores da região. Esta feira apresenta as características defendidas por Paul Singer no aspecto da economia solidária, na ótica do desenvolvimento humano. 

Diante desta explanação feita aqui queremos chamar a atenção para o fato, de que a Feira do Troca não deva mais acontecer na praça principal de Olhos d’Água. Com o devido respeito à doação da área da praça para a construção da igreja de Santo Antônio, isso não dar o direito à paróquia de Alexânia de se sentir dona da praça, principalmente porque a tradição da Feira já acontece há quase cinco décadas. 

A comunidade se pergunta: 

Se o povo não pode frequentar a praça, trocar as energias, vender as obras de artesanatos criadas durante o ano, os produtos da agricultura familiar, encontrar amigos e amigas, confraternizar suas alegrias, qual o sentido da praça de Olhos D’Agua? 

Será que faz sentido esta área pertencer a apenas um grupo de pessoas, uma vez que a praça é mantida com recursos públicos, iluminação pública, segurança pública? 

Está na hora de juntar os argumentos e defender a manutenção da Feira do Troca de Olhos D’Água no local onde teve início com a nossa querida professora Laís Aderne:  Na Praça Principal em frente à Igreja de Santo Antônio. E que o povo seja abençoado pelo padroeiro da comunidade. 

E evidencia-se o fato de que é necessário manter a cultura popular como patrimônio do povo de Olhos D’Água. Como diz o poeta “A praça é do povo como o céu é do condor”. 

Por que tirar a Feira do Troca da Praça? Por que acabar com a Feira do Troca?

Iolanda Rocha – Educadora. Socioambientalista. 

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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Professora da Secretaria de Educação do DF.Pedagoga, com especialização em Educação, Democracia e Gestão. Atua na Educação do Campo. Ex-dirigente do Sinpro/DF e da CUT/DF. Ecofeminista. Socioambientalista. Uma das fundadoras do Movimento Popular e Histórico de Canudos, na Bahia; e do movimento de defesa do Parque Três Meninas em Samambaia, no Distrito Federal. Twitter:@IolandaRocha18