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(Millôr Fernandes)

sábado, 10 de junho de 2023

Vinte descobertas que iluminam a genialidade literária de Machado de Assis

Sábado, 10 de junho de 2023

Hemerotecas digitais e bancos de dados e registros genealógicos online foram fundamentais para descobertas sobre escritor - Reprodução

Editor e jornalista Cláudio Soares enumera algumas curiosidades históricas sobre o escritor brasileiro

Cláudio Soares*
Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) | 09 de Junho de 2023

Nos últimos anos, temos presenciado uma série de revelações surpreendentes que têm encantado o público e agitado estudiosos e admiradores de Machado de Assis. A seguir, comentaremos vinte descobertas impressionantes, incluindo duas revelações exclusivas que ainda não foram oficialmente anunciadas. É importante ressaltar que os acessos às hemerotecas — coleções ou conjuntos organizados de periódicos (jornais, revistas ou obras em série) — digitais e aos bancos de dados e registros genealógicos online desempenharam um papel fundamental no sucesso da maioria dessas incríveis descobertas.

Em 1972, Galante de Sousa, grande pesquisador machadiano, fez um verdadeiro achado: o primeiro poema de Machado, oculto nas páginas obscuras do Periódico dos Pobres. O soneto intitulado À Ilma. Sra. D. P. J. A. (1854) continua a nos intrigar, deixando uma pergunta no ar: quem era a musa inspiradora desse poema? Ao final deste artigo, apresentaremos algumas pistas promissoras que ajudarão a desvendar esse enigma.


Em 1989, o professor Arnaldo Saraiva, da Universidade do Porto, revelou um poema inédito de Machado de Assis intitulado A uma atriz, datado de 1867. Saraiva encontrou esses versos preciosos em abril de 1986, em um sebo na cidade do Porto, acrescentando assim mais um tesouro literário à obra do autor.

Em 1991, o escritor Haroldo Maranhão redescobriu o conto Terpsícore. Esse texto estava guardado nos arquivos da Biblioteca Nacional, e sua redescoberta despertou grande interesse. Naquele mesmo ano, Maranhão lançou o romance Memorial do fim, uma obra de ficção que aborda a morte de Machado de Assis.

No ano de 2008, o professor Mauro Rosso resgatou o conto Um para o outro (1879), considerado perdido, do acervo de Galante de Sousa, disponível na Fundação Casa de Rui Barbosa. Esse conto seria posteriormente publicado no livro Contos de Machado de Assis: relicários e raisonnés, trazendo à luz mais uma preciosidade da obra do autor.

Em 2015, a Academia Brasileira de Letras recebeu dos herdeiros do crítico literário José Veríssimo (1857-1916) um material extraordinário contendo 61 cartas, sendo que 11 delas eram desconhecidas até então. Além disso, uma foto inédita de Machado de Assis também foi encontrada nesse acervo, enriquecendo ainda mais o conhecimento sobre o escritor.

No mesmo ano, o professor Wilton José Marques resgatou o poema O grito do Ipiranga, um dos primeiros textos de Machado de Assis, publicado originalmente no jornal Correio Mercantil em setembro de 1856. Wilton também lançou um livro detalhando essa importante descoberta literária.

Em 2015, ocorreu uma identificação surpreendente: Machado de Assis foi reconhecido em uma foto da Missa Campal, realizada em 17 de maio de 1888, que celebrou a assinatura da Lei Áurea. Essa descoberta foi possível graças a um meticuloso estudo realizado pela Brasiliana Fotográfica, uma colaboração entre o Instituto Moreira Salles e a Biblioteca Nacional. Esse estudo permitiu a identificação precisa do ilustre escritor naquela imagem histórica, lançando uma nova luz sobre sua participação em eventos importantes da época.

Essas descobertas recentes têm enriquecido nosso entendimento sobre Machado de Assis / Campanha da Faculdade Zumbi dos Palmares / Irmãos Bernardelli

No ano de 2016, o pesquisador Felipe Rissato fez descobertas impressionantes. Ele encontrou uma fotografia de Machado de Assis presidindo uma sessão na Academia Brasileira de Letras em 1905, além de uma crônica apócrifa intitulada Lembranças de minha Mãe, atribuída indiretamente a Machado. Outra fotografia fascinante foi encontrada na revista Brasil-Portugal, datada de 1900, na qual Machado já aparece com mais de 60 anos de idade.

No mesmo ano, a pesquisadora Cristiane Garcia Teixeira, da UFSC, atribuiu a Machado um artigo apócrifo publicado na revista O Espelho em 1859. Esse texto é um perfil de D. Pedro II, e em 2020, a pesquisadora publicou um artigo detalhando os aspectos literários que confirmam a autoria de Machado.

Através de pesquisas na Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional, o professor Wilton Marques encontrou vestígios do que poderia ser o primeiro livro de Machado, intitulado Livro dos vinte anos, possivelmente influenciado por Álvares de Azevedo.

Ainda em 2016, Alex Sander Luiz Campos e José Américo Miranda descobriram um texto de crítica literária escrito por Machado de Assis, originalmente publicado no Jornal do Commercio em 1898. O texto abordava o livro de poemas Procelárias, de Magalhães de Azeredo.

No ano de 2017, Felipe Rissato encontrou mais uma fotografia inédita de Machado de Assis. Essa foto, tirada em 1880 no estúdio de Insley Pacheco, faz parte da mesma sessão fotográfica de outra imagem mais conhecida, porém com ângulo e pose diferentes. Ambas as fotografias retratam Machado aos 40 anos de idade.

Em 2018, Rissato fez outra descoberta significativa ao encontrar, em um exemplar da revista argentina Caras y Caretas de janeiro de 1908, aquela que até agora é considerada a última foto de Machado de Assis. Essa descoberta foi realizada através de pesquisas na Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional da Espanha.

Ainda em 2018, Rissato encontrou uma composição de Machado de Assis datada de 1867 para o hino nacional. A letra foi descoberta em um antigo jornal de Florianópolis, revelando mais uma faceta do talento literário do autor.

Em 2019, Fernando Borsato fez uma descoberta intrigante ao encontrar um texto de Machado de Assis publicado em 1858 no Correio da Tarde. Intitulado A Lanterna de Diógenes, esse texto que seria parte de um livro nunca lançado é assinado apenas pelo sinal ?.

No ano de 2021, uma descoberta relacionada ao universo machadiano trouxe à tona a primeira aparição do epíteto Bruxo do Cosme Velho, popularizado por Drummond em seu famoso poema de 1958. Em 1964, o próprio poeta mineiro confessou que a "invenção" desse apelido não era dele, mas sim do gaúcho Moyses Vellinho, que o publicou pela primeira vez, em 1944, no livro Letras da província.

Mais novidades

E, para encerrar, temos duas descobertas exclusivas que ainda não foram divulgadas oficialmente na imprensa. No mês de julho do ano passado, foi revelada a identidade de um primo e de uma tia paterna de Machado de Assis, trazendo à luz os segredos do passado do renomado escritor. O sociólogo Ricardo Costa de Oliveira conduziu uma pesquisa minuciosa, mergulhando nas intricadas árvores genealógicas e nos registros históricos, desvendando assim novos laços familiares e influências que moldaram a trajetória do grande mestre das letras brasileiras.

Ricardo também solucionou um enigma que intrigava há mais de meio século: a identidade da ilustre Sra. D. P. J. A., musa inspiradora do primeiro soneto de Machado de Assis, datado de 1854. Por meio de suas incansáveis investigações, Ricardo descobriu que se tratava de dona Petronilha Júlia de Almeida e Silva, mãe de Júlia de Almeida e Silva, musa de outros dois poemas machadianos igualmente icônicos: Julia e A uma menina, ambos escritos em 1855. Vale destacar que anos mais tarde, Julia se tornaria mãe de Alcindo Guanabara, um homem de letras, jornalista, político e membro da prestigiada Academia Brasileira de Letras. Essas revelações são verdadeiros tesouros que iluminam ainda mais a história e a influência de Machado de Assis.

Essas descobertas recentes têm enriquecido nosso entendimento sobre Machado de Assis, revelando facetas desconhecidas do escritor e lançando luz sobre sua vida e obra. Através do trabalho árduo de pesquisadores dedicados, da utilização das hemerotecas digitais e bancos de dados de registros genealógicos, da busca incansável de desvendar os segredos do passado, cada nova revelação nos aproxima ainda mais desse grande ícone da nossa literatura, tornando sua figura ainda mais cativante e fascinante. À medida que desvendamos os enigmas que envolvem Machado de Assis, seu legado literário brilha com uma intensidade renovada, inspirando novas gerações a explorar sua genialidade e apreciar sua contribuição inestimável para a cultura e a literatura brasileira.

* Cláudio Soares é editor, escritor e jornalista. Atualmente, está escrevendo a biografia de Machado de Assis.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.


Edição: Eduardo Miranda