Sábado,
2 de janeiro de 2016
Por
Celso Lungaretti
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Dilma em 1972, na auditoria militar de Juiz de Fora. |
Como a vida é curta e nunca sabemos quando ela vai terminar, decidi
finalmente esclarecer esta questão. Não quero que aconteça comigo o que
aconteceu em 1967 com o cel. Américo Fontenelle, surpreendido por um
ataque cardíaco no exato instante em que se dispunha a finalmente
revelar, num programa de TV, por que se considerava traído pelo
governador Abreu Sodré (este lhe dera carta branca para, inclusive
recorrendo a práticas autoritárias, botar ordem no trânsito caótico de
São Paulo, mas depois entregou sua cabeça ao grupo empresarial
proprietário da Folha de S. Paulo, de outros jornais e da antiga estação rodoviária --saiba mais sobre isto aqui).
Os que realmente se interessam por meu trabalho, terão neste post a explicação sincera. Não tomarei a iniciativa de o divulgar amplamente por se tratar de assuntos um tanto melindrosos, que serão melhor entendidos por quem conhece a esquerda por dentro.
Posso dizer que, entre mim e Dilma, houve desamor à primeira vista.
Conhecemo-nos em outubro de 1969, no Congresso de Teresópolis da
VAR-Palmares, como quadros em ascensão das duas facções antagônicas, os militaristas e os massistas.
O Moisés (José Raimundo da Costa) e eu, ambos comandantes estaduais da Organização em SP, fomos os iniciadores do racha
que acabaria acontecendo no final daquele tenso congresso, mas um
contra-ataque do lado oposto resultara na cassação de nossa condição de
delegados. Por conhecermos o local onde se realizava, tivemos de nele
permanecer até o final, incorporados à equipe de segurança.
Quando não estávamos vigiando os acessos para darmos o alarme se a
repressão chegasse (e, provavelmente, sermos os primeiros a tombar sob o
fogo inimigo), tínhamos o direito de assistir às discussões, desde que
entrássemos mudos e saíssemos calados.
Então, percebi claramente que os massistas experientes
e influentes (o Antonio Roberto Espinosa, o Carlos Franklin Paixão de
Araújo e a Maria do Carmo Brito) haviam delegado à jovem e ambiciosa
pupila a missão de atacar com muita contundência os militaristas de pavio curto como o Carlos Lamarca e o Cláudio de Souza Ribeiro.
Por coincidência, eu estava lendo O Profeta Armado, de
Isaac Deutscher, então me pareceu um caso semelhante ao do também jovem
Trotsky que, ao ser acolhido no círculo de revolucionários mais antigos
na redação do Iskra, atacava com tamanha fúria retórica
posições contrárias que ganhou o apelido de "o porrete do Lênin", pois
parecia a todos que o líder deixava a cargo do discípulo a tarefa
antipática de desancar exacerbadamente algumas lendas vivas do passado
que teriam amolecido com a idade (depois eles romperiam e Trotsky se tornaria menchevique, só se reconciliando com Lênin em julho de 1917).
Como não passo a vida remoendo mágoas e antipatias de outrora, minhas restrições ao porrete do Paixão de Araújo
haviam ficado para trás em novembro de 2008, quando fui o primeiro a
denunciar as falsidades que a direita virtual espalhava sobre a ministra
Dilma (vide aqui). Em seguida, a Folha de S. Paulo
fez o maior alarde a respeito de um plano de sequestro do Delfim Netto
que a VAR esboçou mas nunca colocou em prática, tendo sido graças a uma
mensagem minha que o ombudsman ficou sabendo e reconheceu publicamente
que seu jornal estampara em plena capa uma ficha policial fajuta de
Dilma, proveniente... da internet! Aquela reportagem como um todo ficou
desmoralizada.
Veio a campanha presidencial de 2010 e o segundo turno me colocou num dilema. De um lado, a candidatura de José Serra se deslocara em demasia para a direita, recebendo o apoio até das viúvas da ditadura. Precisava ser barrado.
...em 1970. Eu era réu do mesmo processo. |
Do outro, um posicionamento que perpassa toda a minha militância é a opção inflexível pela revolução, jamais me dando por satisfeito com a mera distribuição entre os trabalhadores das migalhas do banquete capitalista.
Ou seja, via o PT de 2010 como um partido reformista, empenhado apenas em atenuar os malefícios do capitalismo ao invés de acabar com ele; então, eu me sentiria muito mal apoiando a chapa petista.
Optei por pegar no pé do Serra o tempo todo, batendo pesado em todas as suas definições e posturas de campanha contrárias aos ideais da esquerda nos quais um dia ele acreditou. Ou seja, fiz o de sempre, combater a direita, sem apontar méritos na adversária nem apresentar motivos para se votar nela. Senti-me um tanto desconfortável, pois nunca fui adepto da comunicação negativa, que só aponta defeitos e não oferece esperanças; mas, foi a solução menos ruim que encontrei naquele instante. (continua)