Domingo, 3 de novembro de 2013
Daniel Mello, repórter da Agência Brasil
São
Paulo – “Por que atirou em mim?” era a pergunta que os moradores da
região do Jardim Ângela, zona sul paulistana, levavam escrita em
camisetas brancas e repetiram em refrão ao saírem em passeata na manhã
de hoje (2). O ato, que ocorre todos os anos no Dia de Finados, começou
como uma reação à violência que afligia o bairro na década de 1990.
Neste ano, as centenas de manifestantes que saíram da Paróquia Santos
Mártires e foram até o Cemitério Jardim São Luís prestaram solidariedade
à comunidade da Vila Medeiros, zona norte, onde o estudante Douglas
Rodrigues foi morto por um policial no último dia 27.
Segundo a Polícia Militar, Douglas foi baleado acidentalmente
durante uma abordagem. A mãe do jovem diz que, antes de morrer, o
estudante questionou o motivo do disparo. Desde então, a frase tem sido
difundida nas redes sociais como um bordão contra a violência policial.
“Eles [moradores da Vila Medeiros] nos pediram em comunhão, em
solidariedade, para assumir a campanha em que eles estão usando as
últimas palavras do menino antes de morrer”, explicou o padre
responsável pela Paróquia Santos Mártires, Jaime Crowe. “A nossa
caminhada é buscar forças e juntar ânimo, porque a paz é um caminho que
temos que construir”.
Nos
18 anos em que a caminhada é feita, Crowe diz que viu aos poucos a
realidade do bairro melhorar, apesar da região ainda ser uma das mais
violentas da cidade. O padre atribui a evolução às ações da comunidade
ao crescimento dos investimentos do Poder Público. “A soma das pequenas
ações na região e algumas grandes, como a presença do Hospital M'Boi
Mirim, que cria perspectivas para as pessoas da região”, cita ao
relacionar os fatores, que na sua opinião, ajudaram a reduzir o número
de homicídios de 130 para cada 100 mil habitantes, em 1996, para 25 nos
últimos indicadores.
Para continuar reduzindo a violência, o padre defende um
policiamento que esteja mais próximo à comunidade. “A gente luta por uma
nova polícia. Não uma Polícia Militar. Uma polícia que seja integrada
na comunidade. Um policial que é conhecido pelo nome, não só pela
farda”, ressalta.
O
professor de psicologia da Universidade de São Paulo Luis Galeão veio
da zona oeste para participar do ato. “Só a comunidade organizada que
vai conseguir diminuir esses índices de violência. Já diminuiu muito,
mas ainda tem muito a diminuir”, disse, ao responder porque participava
da passeata.
Para Galeão, o caso de Douglas é um exemplo do que acontece
cotidianamente também no Jardim Ângela. “Muitos jovens morrem aqui sem
qualquer notícia sair nos jornais ou sem qualquer comoção. Então, acho
importante, quando se tem uma situação como essa, que houve comoção, que
todo mundo relembre isso. Ninguém deve morrer por um tiro, acidental ou
não, da polícia”.
Robson Batista, educador em um serviço que atende crianças vítimas
de violência no bairro, acredita que para enfrentar a violência é
preciso trabalhar com os núcleos familiares. “Trazendo a paz para o lar,
a gente vai conseguir ter pessoas mais pacíficas, independente de ser
um policial ou um menino que não teve oportunidades e resolveu ir para o
crime”, disse.