Segunda, 11 de novembro de 2013
Carlos Newton | Date: November 11, 2013
Carlos Newton
A informação de que o governo do Estado de São Paulo, entre 2004 e
2009 (administração Alckmin e José Serra), pagou cerca de R$ 600 milhões
a mais aos donos da área onde hoje se localiza o Parque Villa Lobos, na
Marginal Pinheiros, divulgada em 2010 pela Tribuna da Imprensa e sem
nenhum registro na chamada Grande Imprensa, acaba de ser confirmada por
decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Na ação popular proposta pelo ex-deputado Afanasio Jazadji, foi
alegado “vício no pagamento desse precatório expedido contra a Fazenda
Pública Estadual, alcançado pela moratória do artigo 78 do ADCT, na
medida em que houve a inclusão indevida de juros de mora na quarta,
quinta, sexta, sétima, oitava e nona parcelas da indenização”. Esse
precatório custou aos cofres estaduais cerca de QUATRO BILHÕES DE REAIS,
incluídos os cerca de QUATROCENTOS MILHÕES DE REAIS COMO HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS.
O desembargador-relator Osvaldo de Oliveira, da 12ª Câmara de Direito
Público, reconheceu, em parte, o acerto da iniciativa do autor popular,
mas assim mesmo negou provimento ao apelo, pois, segundo ele,
posteriormente, ao ajuizamento da ação, a Fazenda do Estado, que,
inicialmente, dizia ter agido corretamente (pagando juros moratórios
controvertidos), “passou a defender os interesses que se pretendia
tutelar nessa sede, vale dizer, travou discussão sobre o pagamento
indevido de juros durante o período de vigência da moratória
constitucional instituída pela Emenda Constitucional no. 30/2000”.
GOVERNO ADMITIU ERRO
Segundo o acórdão prolatado, a Fazenda Pública do Estado de São Paulo, em fevereiro de 2012 (um
ano depois que foi processada pelo pagamento de juros moratórios
indevidos e já estando o feito em grau de apelação – acréscimo nosso),
admitiu no juízo da execução a incorreção nos pagamentos efetuados em
favor do Município de São Paulo e da S/A Central de Imóveis e
Construções, bem como esclareceu ser credora do montante de R$
550.621.062,73 (QUINHENTOS E CINQUENTA MILHÕES, SEISCENTOS E VINTE E UM
MIL E SESSENTA E DOIS REAIS E SETENTA E TRÊS CENTAVOS), por ter pago a
mais essa vultosa quantia aos titulares do precatório conhecido como do
Parque Villa Lobos.
No julgamento, o Tribunal ressaltou que “a Fazenda Pública do Estado
de São Paulo NUNCA questionou os juros que integraram os pagamentos
efetuados aos expropriados que titularizavam a área em que hoje está
instalado o Parque Villa Lobos. Tal ensejou a atuação do autor, por
intermédio da ação popular ora em análise, com vistas a suprir a
INATIVIDADE DO PODER PÚBLICO face à lesão que acreditara ter
experimentado o patrimônio público estadual”.
A FINALIDADE
Porém, como a Fazenda Estadual, depois de processada, resolveu agir
para ressarcir-se do prejuízo de mais de MEIO BILHÃO DE REAIS CAUSADO
por ela mesma, o Tribunal julgou desnecessária a ação popular, vez que
no seu entender foi atingida a sua finalidade: “obrigar a
Administração a agir, diante da omissão supostamente lesiva, implicando
na desnecessidade desta ação popular para perseguir eventual
recomposição do patrimônio jurídico”.
Alguns juristas estranharam a conclusão do acórdão, argumentando que
“se a ação não tivesse sido protocolada, os cofres estaduais estariam
amargando um prejuízo de cerca de R$600 milhões. Como a ação proposta
provou a lesão quase bilionária por erro da própria Fazenda Estadual,
sem dúvida, ilógico o improvimento do recurso, mesmo porque o processo
não buscou suprir a omissão lesiva da Fazenda Estadual. Procurou, sim,
evitar que ela continuasse pagando juros moratórios indevidos e ilegais.
Portanto, estando presentes a ilegalidade e a lesividade na conduta da
Fazenda Estadual, pacífico o reconhecimento da procedência e não a
carência da ação”.
Já foram apresentados recurso especial e recurso extraordinário
contra esse acórdão e, paralelamente, cópias de parte dos autos serão
levadas ao conhecimento do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e do CNMP
(Conselho Nacional do Ministério Público), por se tratar de matéria
relevante e com repercussão nacional.
De qualquer forma, indiscutível que o autor popular, ex-deputado
Afanasio Jazadji, e seu advogado Luiz Nogueira, com sua corajosa
iniciativa, sem esquecer a colaboração do deputado petista Antonio
Mentor, já asseguraram a devolução aos cofres públicos do Estado de São
Paulo de mais de quinhentos milhões de reais, equivocadamente pagos aos
antigos donos da área do Parque Villa Lobos, fortuna essa que agora
poderá ser usada na construção de muitos hospitais, milhares de casas
populares e outros importantes melhoramentos.
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OBS - No Ministério Público Estadual, em meados de 2011, foi
instaurado procedimento civil para apurar possível crime de improbidade
administrativa por parte dos agentes políticos e públicos causadores do
quase bilionário desembolso. O inquérito, ainda em andamento, é
presidido pelo promotor Marcelo Duarte Daneluzzi. Segundo ele, o
prejuízo do Estado foi “estratosférico”.
OBS 2 – A ação popular ajuizada no início de 2011 tramitou mais
rapidamente do que o inquérito e foi julgada improcedente em primeira
instância, já no final de 2011, por alegada inexistência de interesse
de agir do autor, pois não se viu naquela fase ilegalidade e lesividade
no desembolso indevido de mais de R$550 milhões e o que foi reconhecido
na segunda instância, com a decisão da Fazenda de buscar o
ressarcimento, depois que foi chamada a se explicar na Justiça na
condição de ré;
OBS 3 - Com a manutenção de improcedência da ação pelo Tribunal
de Justiça, a Fazenda Pública e os responsáveis pelo suposto prejuízo
deixaram de ser responsabilizados pessoalmente e foram isentados de
pagar sucumbência e de ressarcir supostos outros prejuízos que poderiam
ser apurados em regular liquidação de sentença, por meio da ação
popular, o que pode ser ainda reivindicado, dependendo da conclusão do
inquérito em andamento;
OBS 4 – Esclarecimento indispensável: a solução de improvimento
do apelo, adotada pela 12ª. Câmara de Direito Público do Tribunal de
Justiça, foi sugerida pelo próprio promotor Marcelo Duarte Daneluzzi,
que preside o inquérito civil que investiga possível crime de
improbidade administrativa nesse desembolso quase bilionário. No parecer
juntado aos autos da ação popular e acatado pelo Tribunal, o promotor
Marcelo Daneluzzi opinou pela “manutenção da sentença que decretou a
extinção do processo sem julgamento do mérito, por ausência de interesse
de agir, porém calcado na superveniente desnecessidade da presente ação
popular, visto que a pretensão de recomposição dos danos experimentados
com os pagamentos imprecados já é objeto de pleito no juízo próprio da
execução dos precatórios, deduzido pela legitimada ordinária”. (De não
se esquecer, todavia, que, como reconhecido pela Justiça, eles só foram
buscar a recomposição dos danos causados, no juízo da execução, depois
que denunciados e processados em ação popular que assim mesmo foi
julgada improcedente, apesar de ter atingido sua finalidade).
OBS 5 – Pergunta obrigatória: se a Ação Popular não tivesse sido
ajuizada por que iria a Fazenda Estadual, espontaneamente, buscar esse
quase bilionário ressarcimento no juízo da execução? Nessa linha, chama a
atenção manifestação do mesmo promotor nos autos desse mesmo processo,
quando, corajosamente, destacou também que “causa certo desconforto o
posicionamento da Fazenda do Estado de São Paulo pugnando PELA
IMPROCEDÊNCIA DA DEMANDA MESMO ANTE A PERSPECTIVA DE QUE OS PAGAMENTOS
NÃO SE COMPATIBILIZAM COM A NORMA CONSTITUCIONAL REGEDORA, deixando-se
de resguardar o erário e o postulado constitucional da justa
indenização, ao menos na presente via processual”.