Sexta, 22 de novembro de 2013
Sandra Starling
Nunca cheguei a ser amiga de Zé Dirceu e José Genoino.
Apesar de marcantes divergências, sempre respeitei os dois primeiros e posso
dizer que fomos companheiros políticos. As lembranças são muitas. Guardo
algumas. Em 1979, um Genoino recém-saído da prisão, nas asas da Anistia,
valeu-se do meu velho Fiat 147 para ir a Juiz de Fora praticar o que de melhor
sabia fazer: agitação política. Foi ele, também, quem vi, em 1987, estudando
minuciosamente os anais das Constituintes de 1934 e 1946. Era, sem dúvida, o melhor
deputado constituinte que a esquerda elegera em 1986.
Com ele e o metalúrgico Djalma Bom, defendi o nome de
Fernando Gabeira para vice-presidente, na chapa de Lula, em 1989. Perdemos, mas
não fizemos feio, num auditório ainda dominado pelos que tinham todo tipo de
preconceito. Em 1991, eu, deputada federal de primeira viagem, fui por ele
alertada: “Não faça emendas ao Orçamento da União, pois servirão para alguém
‘cavalgá-las’ e delas fazer uso em tenebrosas transações”.
Com Zé Dirceu, foi diferente: no início do PT, em 1980,
cheguei a hospedá-lo em minha casa de Belo Horizonte, época em que ele não
tinha onde ficar. Certa vez, sabendo de seu aniversário, fiz questão de
arranjar-lhe uma festa com direito a bolo e velas. Minha irmã também chegou a
oferecer-lhe teto, quando ia ao Rio de Janeiro.
QUALQUER QUE SEJA A VERDADE
Não teria motivos para exaltar-lhes o passado de dignidade. Faço-o porque não
me conformo com o fato de Lula e Dilma se calarem diante de suas prisões. E por
quê? Porque, qualquer que seja a verdade, os dois, juntamente com Delúbio,
Marcos Valério e companhia, todos eles, participaram do esquema necessário a
que qualquer, repito, qualquer partido consiga ganhar e manter o mando de campo
no país.
Não concordo com o que fizeram, mas não me calo. Não me
calo porque dia virá em que ainda emergirão em toda a sua extensão (e as vozes
das ruas assim exigirão), os mensalões do PSDB, do DEM e até de outros, muitos
outros, antes que desapareça essa maneira de pagar o estratosférico preço das
campanhas políticas. E ninguém vai conseguir mudar tudo isso se não mudarem
todas as instituições brasileiras. Estou certa disso e sobre isso já cansei de
escrever.
Tive pena ao vê-los, antigos companheiros, sendo levados
como presos comuns para, como diria o atual ministro da Justiça, as masmorras
da vida prisional brasileira. Não tive alegria com isso.
Mas sou tomada pela discreta satisfação de tentar
acreditar que neste país, doravante, não serão apenas os rebotalhos de toda
espécie os que serão presos. Um dia, se Deus quiser, também os e as presidentes
da República que se elegem, como num passe de mágica, gastando mais de R$ 150
milhões terão de se explicar. Como pagar essa conta se somos todos sabedores de
que não há almoço grátis?
Por ora, o silêncio dos que contribuem e o dos que fingem
não terem se beneficiado é a obra mais acabada de exaltação da covardia.
Fonte: Tribuna da Imprensa