Sábado, 9 de setembro de 2017
Wellton Máximo – Agência Brasil
O crescimento da renda da população mais pobre no Brasil nos
últimos 15 anos foi insuficiente para reduzir a desigualdade. Segundo
estudo divulgado nesta semana pela equipe do economista Thomas Piketty,
famoso por propor a taxação dos mais ricos para reduzir as disparidades
na distribuição de renda, a maior parte do crescimento econômico neste
século foi apropriada pelos 10% mais ricos da população.
De
acordo com o estudo, conduzido pelo World Wealth and Income Database,
instituto codirigido por Piketty, a fatia da renda nacional dessa
parcela da população passou de 54,3% para 55,3% de 2001 a 2015. No mesmo
período, a participação da renda dos 50% mais pobres também subiu 1
ponto percentual, passando de 11,3% para 12,3%. A renda nacional total
cresceu 18,3% no período analisado, mas 60,7% desses ganhos foram
apropriados pelos 10% mais ricos, contra 17,6% das camadas menos
favorecidas.
A expansão foi feita à custa da faixa intermediária
de 40% da população, cuja participação na renda nacional caiu de 34,4%
para 32,4% de 2001 a 2015. De acordo com o estudo, a queda se deve ao
fato de que essa camada da população não se beneficiou diretamente das
políticas sociais e trabalhistas dos últimos anos nem pôde tirar
proveito dos ganhos de capital (como lucros, dividendos, renda de
imóveis e aplicações financeiras), restritos aos mais ricos.
“Ao
capturar pouco ou nenhuma parte da distribuição da renda de capital e ao
não capturar muitos dos frutos da política social diretamente, a faixa
intermediária ‘espremida’ poderia ser um produto das elites que a quer
botar em competição com a faixa inferior [de renda]”, destacou o estudo,
assinado pelo economista Marc Morgan.
O estudo classificou a
manutenção da desigualdade no Brasil como “chocante”, principalmente se
comparada com outros países desenvolvidos. “É digno de nota que a renda
média dos 90% mais pobres no Brasil é comparável à dos 20% mais pobres
na França, o que apenas expressa a extensão da distorção na renda no
Brasil e a falta de uma vasta classe média”, ressalta o levantamento. Em
contrapartida, o 1% mais rico no Brasil ganha mais que o 1% mais rico
no país europeu: US$ 541 mil aqui, contra US$ 450 mil a US$ 500 mil na
França.
Metodologia
O levantamento exclui
transferências de renda. Considerando o Bolsa Família e o Benefício de
Prestação Continuada, a participação dos mais pobres teria encerrado
2015 em 14%, mas a evolução da renda dos 10% mais ricos permaneceria
inalterada. No entanto, o salário mínimo, as aposentadorias e pensões e o
seguro-desemprego estão incluídos no cálculo.
Segundo o World
Wealth and Income Database, as transferências sociais foram retiradas do
levantamento para facilitar a análise da estrutura da economia. Essa
medida, conforme a equipe responsável pelo estudo, permite estimar
quanto da renda nacional vem do capital e quanto vem do trabalho.
Para
chegar à distribuição da renda nacional, os autores usaram dados da
Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios (PNAD) do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que analisa o padrão de
vida e a renda das famílias mais pobres. Os dados sobre a parcela mais
rica da população vieram de informações sobre a Declaração do Imposto de
Renda Pessoa Física, enviados pela Receita Federal com a preservação do
sigilo fiscal dos contribuintes.
Para acrescentar a participação
do capital e as rendas não tributáveis, o estudo usou as Contas
Econômicas Integradas, de 2000 a 2014, e as Contas Nacionais Trimestrais
do IBGE de 2015. Juntando as três bases de dados, os economistas
elaboraram a série histórica dos últimos 15 anos da renda nacional com a
participação de cada faixa de renda da população.
Dividendos
A
inclusão das contas do IBGE permitiu aos pesquisadores estimar os
impactos sobre a economia da isenção de Imposto de Renda sobre lucros e
dividendos, em vigor desde 1995. De acordo com o estudo, a desigualdade
na renda do trabalho (de quem ganha salários) diminuiu de 2001 a 2015,
mas esse efeito pode ser mascarado por profissionais autônomos que
recorrem a instrumentos como participação nos lucros e distribuição de
dividendos para pagarem menos impostos.
“Num contexto em que
lucros distribuídos são isentos de Imposto de Renda, enquanto as rendas
mais altas do trabalho são taxadas com a alíquota máxima de 27,5%, esse
tipo de comportamento não pode ser descartado, especialmente como parece
ser comum entre os brasileiros envolvidos em atividades autônomas”,
destacou o estudo.
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