Quinta, 1 de dezembro de 2011
Da Rede Brasil Atual
Procuradora lamenta argumento de desembargador de que
violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura tenham
prescrito
Publicado em 30/11/2011, 20:55
São Paulo – O Ministério Público Federal em São Paulo apresentou
recurso à decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região de extinguir
ação contra quatro militares acusados de torturar vítimas da ditadura
(1964-85). Entre eles está um capitão reformado da Polícia Militar
apontado em 15 episódios de abusos de direitos humanos, incluindo os
promovidos contra a atual presidenta Dilma Rousseff no período em que
ela permaneceu detida em São Paulo, no início dos anos 1970.
O agravo de instrumento visa a que o desembargador Santoro Facchini
reveja a linha de argumentação que utilizou na última semana para dar
fim ao processo, a de que os crimes cometidos durante o regime
autoritário já prescreveram. A procuradora Sandra Akemi Shimada Kishi
entende que “como o dano persiste ainda nas vítimas diretas e na
sociedade por conta das condutas dos réus”, não se pode falar que os
crimes tenham, em português coloquial, caducado.
“Sempre é tempo de se pedir desculpas. Há feridas morais individuais e
transindividuais abertas e que ainda esperam por desculpas”, defende. A
ação pede a responsabilização civil dos militares reformados das Forças
Armadas Homero Cesar Machado, Innocencio Fabricio de Mattos Beltrão e
Maurício Lopes Lima e do capitão reformado da Polícia Militar de São
Paulo, João Thomaz, pelo envolvimento em 15 casos, entre os quais o da
presidenta Dilma Rousseff, que ficou detida no Presídio Tiradentes, em
São Paulo.
A documentação reunida pela Procuradoria Regional da República mostra
que eles participaram ativamente das violações ocorridas na Operação
Bandeirante (Oban), instrumento da repressão. Além disso, o grupo atuou
no rapto de Virgílio Gomes da Silva, o comandante Jonas, que liderou em
1968 o sequestro do embaixador dos Estados Unidos, Charles Elbrick. A
ideia é que os possíveis réus sejam condenados a pagar indenização à
sociedade, percam as aposentadorias e ajudem a União a cobrir os gastos
de indenizações a vítimas, sem responsabilização penal.
desembargador Facchini aceitou, ao extinguir a ação, a versão de
que o Brasil não é signatário de convenções internacionais de direitos
humanos que prevejam a imprescritibilidade das violações de direitos
humanos. A procuradora contra-argumentou com uma série de exemplos,
entre os quais a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e a
Declaração universal dos Direitos Humanos, ambas firmadas em 1948 de
maneira voluntária pelo Brasil, que desta maneira se obriga a cumprir os
dispositivos ali previstos.
Como não bastasse, o Estado brasileiro ratificou em 2002 a Convenção
Americana de Direitos Humanos, pela qual aceita as decisões da Corte
Interamericana de Direitos Humanos, que no ano passado condenou o país
a, entre outras coisas, dar punição judicial aos envolvidos nos
episódios da ditadura.
Para a procuradora, a não condenação dos repressores é uma violação
constante e repetida dos direitos constitucionais e da jurisprudência
internacional dos direitos humanos. “O Brasil encontra-se, pois,
vinculado internacionalmente ao conceito de crime contra a humanidade e
tem o dever inderrogável de promover a responsabilização dos autores
destes delitos, a qualquer tempo.”