Terça, 19 de junho de 2012
Por Ivan de Carvalho

Imediatamente surgiu a
notícia de que a coisa seria complicadíssima, porque as pessoas na linha de
sucessão não poderiam assumir o cargo, o que as tornaria inelegíveis.
O cargo de prefeito iria
cair – como a maçã na cabeça de Isaac Newton – nas mãos de uma vereadora do PV,
que é candidata a nada. E ela estaria disposta a proceder como dizem que Eva
fez com a outra maçã, que, por sinal, não está na Bíblia – tascar os dentes com
vontade. Em outras palavras, assinar atos desfazendo muita coisa feita e
fazendo muitas outras não feitas. Terrorismo puro. “Fica revogado o aumento das
tarifas de ônibus”.
Mas os que pensavam equivocavam-se.
Porque, na linha de sucessão – impropriamente chamada assim aqui – havia a
procuradora geral do município. O prefeito avisa a Câmara, no caso de viagem
superior a 15 dias, mas é a chefe da procuradoria do município que passa a
responder pela prefeitura, mantendo-se no próprio cargo, sem a necessidade de
assumir o de prefeito. Esta parte está, pois, resolvida.
Viagens de governantes são
normais. Especialmente as aéreas. FHC usava um tal de “sucatão”, uma aeronave
contemporânea daqueles tapetes voadores das lendas árabes – que eu acho que
voavam mesmo, com motores, janelinhas, bancos, essas coisas que aviões e discos
voadores têm –, mas o companheiro Lula, como autêntico sindicalista, exigiu
melhorias e comprou o Aerolula. E antes mesmo de deixar o cargo começou a
preparar os planos para a compra do Aerodilma, este sim, cinco vezes mais caro
que o Aerolula e que será capaz de fazer todo brasileiro inflar o peito de
orgulho ao vê-lo pela TV pousar nos mais badalados aeroportos do mundo.
Mas outros políticos no
Brasil são menos exigentes, viajam até de jatinho ou de helicóptero (existem
alguns tão incrivelmente modestos que até pedem emprestados jatinhos ou
helicópteros alheios, com notória economia para os cofres públicos). Se tais
empréstimos auronáuticos implicam em despesas públicas por fora, elas não são
notórias, até são invisíveis e o que não é visível é irreal. Ou não?
Detestável é a atitude do prefeito de nossa
Salvador de viajar para o exterior, para espanhol ver (se fosse para inglês
ver, talvez não se humilhasse tanto) em um inaceitável avião de carreira,
embora eu não saiba se optou por aquelas cadeiras que permitem estirar as
pernas ou por aquelas que obrigam seus ocupantes a serem contorcionistas sujeitos
a trombose. Também resta esclarecer se a viagem é particular ou oficial, pois
um funcionário da prefeitura comentou que “é oficial”, mas não soube dizer qual
é a agenda de compromissos.
Se for particular, isso é o de menos. O direito
de ir e vir é assegurado pela Constituição. Obama frequenta Camp David. Putin,
não mais exercendo soberania sobre a Criméia, talvez passe as férias
inspecionando a KGB, só por nostalgia. Mas governante brasileiro que se preza
passar férias no Brasil é exigir demais. Um feriadão, vá lá, na praia de Inema,
mas férias não: tem que ficar bem longe do ato de apoio do PP ao candidato do PT
e da convenção que oficializará a candidatura petista a prefeito de Salvador.
Estas são missões ou diversões prioritárias.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.