Sexta, 20 de junho de 2014
Edwirges Nogueira
Repórter do
Radiojornalismo da EBC
O Brasil inteiro está no clima da Copa do Mundo, mas, como também acontece em outras cidades-sede, pessoas em situação de rua
que vivem no Distrito Federal não se sentem contempladas com a festa do futebol
mundial.
Para Francisco* e Paulo*, que vivem nas ruas de Brasília, a repressão
demonstra que eles não foram convidados para a festa. “Nós que somos da rua,
estamos sendo escorraçados, na verdade eles querem a gente longe dessa Copa,
querem tirar nosso direito de ir e vir”, desabafou Francisco. Paulo também
lamenta a perda da liberdade. “Essa liberdade a gente perdeu com a Copa. Eu já
tô na rua, e eu não posso ficar aqui, eu vou pra onde?”, questionou.
No começo de junho, o Ministério Público do Distrito Federal (MP-DF)
enviou uma recomendação ao governo do Distrito Federal para que os órgãos que
fazem abordagem e acolhimento de pessoas em situação de rua tenham respeito com
essa população durante o período do Mundial.
Segundo o promotor Thiago Pierobom, o MP está acompanhando as ações do
governo local. “A grande preocupação do Ministério Público é que, no momento em
que essas pessoas forem abordadas na rua, especialmente nesse momento de Copa
do Mundo, elas não sejam simplesmente obrigadas a sair da rua e a entrar nos
abrigos.”
Apesar da recomendação, profissionais e voluntários que atuam com esse
público já perceberam a ausência de grupos que antes eram encontrados em alguns
locais da capital. “A gente notou essa diferença, notou que os moradores de rua
estão sumindo e os que estão permanecendo no lugar estão sendo alvo de
violência. Tanto se fala em legado da Copa, mas o único legado que a gente tem
visto é a higienização da população de rua”, avaliou o orientador social de uma
das equipes do projeto Cidade Acolhedora, Rafael de Souza, que já viveu
na rua.
Saiba Mais
“A gente nota que há uma ameaça. Eles ficam com medo e vão procurando
locais mais distantes até passar o evento. Depois que passar, eles voltam”,
contou Maria do Socorro Nery, voluntária em um grupo de abordagem a pessoas em
situação de rua.
O Centro Nacional de Direitos Humanos da População de Rua encaminhou
denúncia ao MP-DF sobre o desaparecimento de algumas pessoas que vivem nas ruas,
especialmente na área central de Brasília. Os casos já estão sendo investigados
pelo órgão.
A Copa do Mundo motivou a A Secretaria de Estado de Desenvolvimento
Social e Transferência de Renda do Distrito Federal (Sedest) a antecipar
a criação de vagas para abrigar pessoas em situação de rua. Cem novas vagas
destinadas a adultos e famílias e 20 para crianças e adolescentes foram
criadas.
A coordenadora de Proteção Social Especial, Meire Lia Lima, no
entanto, negou que a ação do órgão tenha a intenção de esconder a realidade e
garantiu que as pessoas não estão sendo abrigadas à força. “De maneira alguma é
feita ação de retirada de população em situação de rua ou de qualquer outro
público do espaço da rua. Essa é uma oferta dentro da perspectiva da garantia
do direito da proteção social especial, que é garantir um espaço onde a pessoa
possa ter uma proteção integral”, argumentou.
Sobre os casos de violência praticada contra a população em situação
de rua, a Sedest e a Polícia Militar orientam que as denúncias sejam
encaminhadas para a Corregedoria da Polícia e para órgãos de defesa de
direitos, como Defensoria Pública e Ministério Público.
* Paulo e Francisco são nomes fictícios e foram usados
para preservar a identidade dos entrevistados