Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sábado, 8 de abril de 2017

Quando capitão, Bolsonaro tramou atentado terrorista, falou demais e a "Veja" publicou, frustrando o plano

Sábado, 8 de abril de 2017
Do Blog Náufrago da Utopia



"No segundo semestre de 1987, finda a ditadura e já sob o governo civil de José Sarney, a economia estava combalida em razão do fracasso do Plano Cruzado. A inflação era alta, tendendo a índices estratosféricos, e grassava forte insatisfação nos quartéis devido à política de reajustes dos soldos dos militares – além, é claro, do incômodo, sobretudo entre a oficialidade média, pela perda do poder político de que gozaram por 21 anos seguidos.

Jair Bolsonaro era então capitão do Exército, da ativa, cursava a Escola Superior de Aperfeiçoamento de Oficiais (Esao) e morava na Vila Militar, na Zona Norte do Rio. Em setembro de 1986, ele assinara um artigo na revista Veja no qual protestava contra os baixos vencimentos dos militares. Por isso ele foi preso e, na época, sua punição provocou protestos de mulheres de oficiais da ativa – que, ao contrário dos maridos, podiam sair em passeata sem correr o risco de serem presas..

‘SÓ PARA ASSUSTAR'

Bolsonaro tornou-se fonte da revista. Em meados de outubro 1987, a prisão de outro militar, capitão Saldon Pereira Filho, pelo mesmo motivo, levou à Vila Militar a repórter Cassia Maria, de Veja, destacada para repercutir o ocorrido. Ali ela conversou com Jair Bolsonaro, que estava acompanhado de outro capitão e da mulher deste.

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Sob condição de sigilo, a mulher do militar contou à repórter – e depois Bolsonaro e seu colega confirmaram – que estava sendo preparado um plano batizado de Beco sem saída. O objetivo era explodir bombas de baixa potência em banheiros da Vila Militar, da Academia Militar de Agulhas Negras, em Resende (RJ), e em alguns quartéis. 

A intenção era não machucar ninguém, mas deixar clara a insatisfação da oficialidade com o índice de reajuste salarial que seria anunciado dali a poucos dias. E com a política para a tropa do então ministro do Exército Leônidas Pires Gonçalves – que teria sua autoridade seriamente arranhada com os atentados.

‘Serão apenas explosões pequenas, para assustar o ministro. Só o suficiente para o presidente José Sarney entender que o Leônidas não exerce nenhum controle sobre a tropa’, ouviu a repórter de Ligia, mulher do colega de Bolsonaro, identificado com o codinome de Xerife.

FRASE ISOLADA

Bem que se dizia antigamente: macaco, olha o teu rabo!
A repórter havia apurado uma bomba, no sentido literal e no figurado. Veja não respeitou o off – no que fez muito bem neste caso, pois do contrário estaria acobertando atos terroristas – e quebrou o pacto de sigilo com a fonte. 

A história toda foi contada nas páginas 40 e 41 da edição 999 (de 27/10/1987) da revista. A repórter Cassia Maria anotou em seu relato:
'Temos um ministro incompetente e até racista’, disse Bolsonaro a certa altura. ‘Ele disse em Manaus que os militares são a classe de vagabundos mais bem remunerada que existe no país. Só concordamos em que ele está realmente criando vagabundos, pois hoje em dia o soldado fica o ano inteiro pintando de branco o meio-fio dos quartéis, esperando a visita dos generais, fazendo faxina ou dando plantão
Perguntei, então, se eles pretendiam realizar alguma operação maior nos quartéis. Só a explosão de algumas espoletas, brincou Bolsonaro. Depois, sérios, confirmaram a operação que Lígia chamara de Beco sem Saída
Falamos, falamos, e eles não resolvem nada, disseram. Agora o pessoal está pensando em explorar alguns pontos sensíveis'.

E também: quem não te conhece, que
te compre!
Sem o menor constrangimento, o capitão Bolsonaro deu uma detalhada explicação sobre como construir uma bomba-relógio. 

O explosivo seria o trinitrotolueno, o TNT, a popular dinamite. O plano dos oficiais foi feito para que não houvesse vítimas. A intenção era demonstrar a insatisfação com os salários e criar problemas para o ministro Leônidas."

(trechos selecionados da matéria Capitão Bolsonaro, a história esquecida, cuja íntegra pode ser acessada aqui. É de autoria de Luiz Egypto e foi publicada pelo Observatório da Imprensa em sua edição 636, de 06/04/2011)