Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 2 de outubro de 2019

Depoimentos sobre o desembargador Siro Darlan

Quarta, 2 de outubro de 2019


O Livro de Áurea Charpinel intitulado “Os sinos da Candelária” trazem consigo histórias marcadas pela crueldade que é viver nas ruas. Antes mesmo do triste episódio intitulado “Chacina da Candelária”, a autora já tinha o desejo de dar voz àqueles que não tinham sequer boca. Nem para falar, muito menos para se alimentar. Crianças e jovens sofridos, necessitando do mínimo existencial. Nem existiam. A autora conta, na apresentação de seu livro, a sua motivação de forma emotiva trazendo o olhar do leitor para a sensibilidade nas canções que compunha, e que acabaram por tratarem-se do início da obra.
Siro Darlan, o juiz que a apoiou na empreitada de pesquisar mais sobre os jovens e crianças de rua, afim de conceder-lhes evidência e clamor por dignidade, acabou por proporcionar o laboratório perfeito para que Áurea iniciasse suas buscas: o Instituto Padre Severino, em 1993. Naquele contexto, a autora pôde enxergar aqueles que faziam parte de suas músicas, os verdadeiros atores de suas canções para que pudessem tomar o seu devido lugar.
A violência era o elo entre todos eles.
A chacina, naquele mesmo ano, que matou mais de 300 jovens e crianças que estavam dormindo em frente à Igreja da Candelária foi bárbara. Um choque para Áurea, para Siro Darlan, e para muitos outros que tinham como meta de vida explorar maneiras e encontrar soluções mediatas e imediatas para que todos (se fosse possível) não tivesse como realidade diária a crueldade que é viver nas ruas.
Infelizmente o assassinato aconteceu. De inocentes. Não era período que estivesse permitida a pena de morte no Brasil. Mas foi-lhes imposta, goela abaixo.
Nessa obra, Siro Darlan teve participação atuante, tanto por detrás dos bastidores, quanto à frente. Em homenagem, ganhou um espaço podendo depor o seu olhar sobre a magnífica ideia de Áurea Charpinel e demonstrou satisfação com a possibilidade de trazer meninos e meninas para participar do Musical que propunha no livro, dando a eles, minimamente, a demonstração de respeito e dignidade, que merecem, muito.
O Musical “Os Sinos da Candelária” foi apresentado no Teatro Óperon, e contou com o emocionado depoimento do seu diretor à época, Helemar Nunes.
A peça contou a história, com cenas do cotidiano, de um grupo de meninos e meninas que viviam nas ruas nos dias que antecederam o massacre. Além de cenas pesadas, a peça foi marcada por momentos de alegria, comum das crianças e jovens, com momentos de humor, dança e da música.
A obra de arte acabou por revelar estrelas conhecidas atualmente no teatro e na televisão. Jovens e crianças que não enxergavam o futuro, tiveram suas vidas modificadas por essa oportunidade que abriu as portas de suas vidas.
Ana Almeida, Advogada (OAB/RJ 208102) e Alberto Guimarães, Gestor Nacional – Aldeias Infantis
Como esse projeto nasceu e se desenvolveu? E como está atualmente? Aldeias infantis SOS Brasil é uma organização humanitária global de promoção ao desenvolvimento social que trabalha, desde 1949, na defesa, garantia e promoção dos direitos de crianças, adolescentes e jovens. No Brasil, a SOS atua há mais de 50 anos, onde cuida de crianças, fortalece suas famílias e advoga pelo direito que possuem de viver e crescer em família e em sua comunidade. São 187 projetos em 27 localidades pelo país para que nenhuma criança tenha que crescer sozinha. São atividades diárias que geram impactos positivos para mais de 11 mil pessoas, por meio de projetos de educação, esporte, lazer, geração de renda e empregabilidade, com foco na quebra do ciclo da pobreza e violência. A organização foi fundada pelo educador Hermann Gmeiner, em Imst, na Áustria, com o objetivo inicial de acolher crianças órfãs, vítimas da II Guerra Mundial. Com o passar do tempo o campo de atuação foi ampliado, agregando centros educacionais e programas para famílias e comunidades, além de ações voltadas à saúde, nutrição, defesa de direitos, promoção de direitos das mulheres e do auxílio em situações de emergência. Atualmente, atua em 136 países e territórios, atendendo crianças em situação de vulnerabilidade social, que perderam ou estão prestes a perder os cuidados de suas famílias de origem. No Rio de Janeiro, os programas localizados em Jacarepaguá, à Estrada do Boiuna 310, e no Itanhangá, à Rua Jardim do Seridó nº 200, oferecem serviços de fortalecimento familiar e comunitário atendendo as comunidades do entorno de Jacarepaguá e Morro do Banco, bemcomo acolhimento as famílias refugiadas da Venezuela, através de parceria firmada com a ACNUR.

  • Na sua perspectiva, qual foi a importância da atuação de Siro Darlan como juiz da infância e juventude? E na criação desse projeto?Dr. Siro apoiou às Aldeias Infantis SOS Brasil na implantação do Estatuto da Criança e do Adolescente, adequando o trabalho desenvolvido à nova legislação. Deu visibilidade ao trabalho realizado pelas Aldeias Infantis junto aos meios de comunicação, levando os artistas defensores da causa da infância, para visitar os projetos; Reconheceu como legítimos os laços de afeto entre mãe social e a criança por ela cuidada, originados na convivência da Casa Lar, deferindo os pedidos de adoção que tramitaram em Juizo; Atuou na garantia do direito à convivência familiar e comunitária tornando célere o curso dos processos de reintegração familiar, possibilitando que um número expressivo de crianças retornasse aos seus lares. Enfim, crianças e adolescentes tiveram, na jurisdição de Siro Darlan, seus direitos humanos fundamentais garantidos e respeitados, gozando de prioridade absoluta sendo verdadeiramente considerados sujeito de direitos conforme preconiza o ECA. 3) O que diria para o jovem público leitor que não acompanhou pessoalmente a trajetória de Siro Darlan, mas que tem a oportunidade de ler esse livro? Segundo ele “criança cresce, tem pressa e por isto não pode esperar”. Conhecer sua história e a forma como este juiz ousou descomplicar o exercício da magistratura voltada para as causas da infância, tornando-a acessível e eficaz para seus jurisdicionados, é o que nos instiga a conhecê-lo de perto e absorver seus ensinamentos revolucionários e que a muitos certamente incomodou, mas que visam, a bem da verdade, à construção de um mundo melhor para as meninas e meninos do nosso Brasil.
  1. Que não percam esta oportunidade, pois Siro Darlan é, e sempre será um ícone do direito da Infância e Juventude Brasileira. Um Juiz que nunca mediu esforços para fazer valer direitos humanos fundamentais, tendo sua trajetória estribada no respeito, cuidado e no imenso amor que sempre nutriu por todas as crianças e adolescentes, e, em especial por aquelas que necessitavam da tutela estatal como a única forma de fazer jus à proteção integral da qual são credoras.
  2. Dr. Siro sempre acreditou no trabalho desenvolvido pelas Aldeias Infantis, levando em consideração os pareceres técnicos para a tomada de decisão, empoderando desta forma as equipes; Criou a Escola de Pais para que, ao invés de serem punidos, pudessem ter um espaço de aperfeiçoamento e capacitação no exercício da paternidade e maternidade responsável. Imprimiu maior rapidez nas análises dos processos de destituição do poder familiar e dos processos de adoção, levando alegria para crianças e adolescentes que aguardavam ansiosamente por uma família.
  3. Siro Darlan, juiz visionário, sempre esteve à frente do seu tempo. A luta diária para garantir direitos humanos fundamentais previstos na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente tornou-se a sua marca registrada, e para tal, nunca mediu esforços. Muitos foram os embates, principalmente com aqueles que tinham o dever constitucional de implementá-lo e quedando-se inertes, violaram o direito à proteção integral fato este que, infelizmente, perdura até os dias atuais. Basta olharmos os noticiários e vermos como crianças e adolescentes são tratadas neste país. Ele não esperou o parlamento, foi o próprio parlamento quando instituiu, nos idos de 1996, nas Aldeias Infantis, o instituto das audiências concentradas, que somente décadas depois, através da lei 12.010/09, foram introduzidas como prática obrigatória aos magistrados. Seu gabinete sempre esteve aberto para nossa Organização de modo que pudéssemos dialogar sobre os casos emblemáticos buscando o melhor interesse para aquelas crianças. Definitivamente, Siro Darlan gostava de estar perto de seus jurisdicionados. Era um Juiz incansável. Perdemos muito quando deixou a infância partindo para novos desafios. Podemos afirmar, sem medo de errar, que este Juiz fez toda diferença enquanto a ele foi dada a possibilidade de agir. Desburocratizou os processos, informatizando a Vara da Infância da qual era titular, criando uma base de dados de crianças e adolescentes atendidas, quando este tema, sequer, era ventilado pelo tribunal de Justiça do Rio de Janeiro; implantou um projeto denominado Núcleo da Criança e do Adolescente Vitima, um apêndice da DPCA, que originou a criação da especializada DECAV – Delegacia da Criança e do Adolescente Vitima, cuja atribuição é apurar crimes perpetrados por adultos contra crianças e adolescentes. Cuidou também dos jovens usuários de drogas, criando um Núcleo de atendimento para usuários de álcool e drogas – Núcleo de estudos e Pesquisa em Atenção ao Uso de Drogas em parceria com o hospital São Francisco de Assis/UFRJ.

Cristina Senna, Comissária de Justiça da Infância e Juventude e Idoso Aposentada e Especialista em Dependência Química.


Em outubro de 2004 fui “eleita” por meus colegas (sim, os chefes dos setores eram eleitos por seus pares) para chefiar o SAUD – Serviço de Atendimento aos Usuários de Drogas, o qual Dr. Siro havia criado para ajudar crianças e adolescentes dependentes químicos, que, por qualquer motivo, chegassem ao juizado. Os menores eram encaminhados para tratamento no HESFA – Hospital São Francisco de Assis, com o qual Dr. Siro havia celebrado convênio, enquanto pais e responsáveis, dependentes de álcool ou outras drogas, eram encaminhados ao grupo do AA – Alcoólicos Anônimos, que se reunia semanalmente no próprio auditório da 1ª VIJI. Para incentivar o comparecimento ao tratamento, cada pessoa recebia vale transporte para ir e voltar e, se não faltasse às reuniões semanais, recebia também uma cesta básica. Na época, aplicávamos a chamada Justiça Terapêutica, instrumento judicial que, em lugar de punir, ajudava o menor, ou maior, dependente, com processo na justiça, a tornar-se sadio através do cuidado necessário. A família era atendida por uma equipe multidisciplinar formada por Psicólogos, Assistentes Sociais e Comissários de Justiça e os pais participavam de outro excelente projeto, também criado por Dr Siro, chamado “Escola de Pais” onde, através de palestras com profissionais de diferentes áreas, aprendiam a exercer melhor a maternidade e a paternidade. Todos os projetos contribuíam para a recuperação biopsicosocial dos envolvidos e, ainda que os resultados não se mostrassem 100% satisfatórios para a solução do problema, o índice de recuperação era bem mais elevado do que o comumente alcançado, o qual não chega a dez por cento, e indicavam uma diretriz alternativa para romper com os modelos institucionais atuais inoperantes.
Três coisas importantíssimas que Dr Siro fez, que eu me lembro:
1) Quando chegaram os primeiros computadores à 1a VIJI, Dr Siro mandou retirar as máquinas de escrever para nos obrigar a usar o computador , pois quase todos os funcionários queriam continuar usando as máquinas com que estavam acostumados.
2) Ele implantou, ainda no século passado, o processo sem papel, o qual chamou de “virtual” e que hoje é conhecido como processo eletrônico.
3) Como alguns pais e responsáveis não tinham dinheiro para comparecer ao juízo a fim de regularizar guardas de fato e Registros de Nascimento, ele decidiu levar a Justiça aos jurisdicionados. Assim, foi criado o projeto “Justiça na comunidade”, que, posteriormente, o Tribunal de Justiça adotou com o nome de “Justiça Itinerante.” Hoje, há um ônibus com toda a estrutura, mas, no início, íamos em kombis e tudo era improvisado. Lembro-me que, em 2000, ele transformou em ‘juizado’ a quadra a Escola de Samba Unidos de Padre Miguel, onde cada “camarote” transformou-se em um setor: Plantão, Defensoria Pública, e sala de audiências.
Uma pessoa à frente do seu tempo, Dr Siro Darlan é, e sempre será, uma referência quando se fala em Juiz De Menores. Porque ele não se limitava a aplicar a letra da lei, mas, buscava atingir o seu espírito, que é a proteção integral do menor, fazendo com que as medidas protetivas alcançassem toda a situação familiar. O maior exemplo que posso citar aconteceu quando eu chefiava o Serviço de Plantão. Uma senhora nos procurou dizendo que ela e seus filhos precisavam de uma casa para morar, e ela tinha ido ao “Juizado” porque ouviu falar que o Dr Siro protegia as crianças, e as crianças dela estavam precisando de proteção, que era uma casa. Eu fui ao Gabinete e transmiti o recado: Dr Siro, ela quer que o senhor arrume uma casa para ela. Na mesma hora, ele mandou-me fazer um ofício para a então Governadora Rosinha Garotinho pedindo uma casa para a tal senhora, que saiu toda feliz com o ofício nas mãos. Dois meses depois, a senhora voltou ao Plantão, e contou que ela havia conseguido a casa, mas agora ela precisava fazer a mudança, porque o prazo para mudar e tomar posse da casa era até o dia seguinte, e ela não tinha dinheiro para pagar o frete. Claro que Dr. Siro conseguiu um carro para fazer a mudança.
Outra situação inesquecível foi quando três meninos de rua chegaram ao Plantão procurando o Juiz: Cadê o Sidarlan? Queremos falar com Sidarlan, gritavam. As crianças sempre chegavam assim, cheios de “intimidade.” Ele está no segundo andar, falei, mas eu vou contar para ele que vocês estão gritando. Eles saíram correndo. Alguns minutos depois, eu entro no Gabinete para relatar o acontecido, e vejo os três meninos sentados em volta da mesa do juiz, felizes, bebendo suco de frutas e comendo biscoitinhos, na maior alegria.
Este é o Dr. Siro Darlan de Oliveira que eu conheci.
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Silvana do Monte, advogada e adotante.
No meu caso especifico, na adoção da minha filha, foi maravilhosa. Foram 4 meses de processo tendo o então Juiz Siro Darlan como magistrado. Dr. Siro, além de acolhedor, de me atender como pessoa, mãe e também como advogada, cumpriu o ECA em sua plenitude. Sempre digo que Dr. Siro Darlan é o segundo pai de minha filha, pois assinou sua sentença e sempre fará parte de nossas vidas.
2)      Na sua perspectiva, qual foi a importância da atuação de Siro Darlan como juiz da infância e juventude? E, em especial, no tocante às adoções de crianças e adolescentes?
Siro Darlan foi um marco na celeridade, no olhar diferenciado à criança e ao adolescente, tratando-os com prioridade absoluta, tendo uma visão para além do jurídico, percebendo que o tempo da criança é diferente do tempo do adulto, que a infância e a adolescência são tênues, rápidas, fugazes.
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Mercedes H A de Almeida – Comissária de Justiça e Coordenadora da Escola de Pais (1998/2004)
É importante conhecer a trajetória de um juiz de infância pela dedicação, por ser um magistrado vocacionado, por amar à causa da infância e da adolescência. Não há na área protetiva qualquer intenção ou subterfúgios no sentido de desprestigiar familiar pobres, retirando-lhes os filhos, entregando-os a famílias ricas. Essa é uma lenda urbana muito bem atacada pelo então juiz da Infância Siro Darlan. A adoção visa, apenas e tão somente, atender ao superior interesse da criança e ao direito à convivência familiar e comunitária, além dos demais insertos no artigo 227 da CRFB, no ECA e nos normativos internacionais ratificados pelo Brasil. Assim, aquele que não exerce a parentalidade responsável, que fere os deveres inerentes ao exercício do poder familiar, são destituídos do poder familiar e as crianças então são colocadas em adoção por famílias de todas as classe, enganam-se os que pensam que os ricos recorrem à adoção. Siro Darlan foi e ainda é um exemplo nessa área, dedicado, cuidadoso com esse público tão vulnerável, sem descuidar das duas outras pontas, sem deixar de trabalhar a reinserção familiar através da escola de pais, e a própria preparação dos adotantes. 
Este Projeto nasceu de um sonho do Desembargador Siro Darlan; quando juiz titular da Primeira Vara da Infância e Juventude da Capital do RJ.
Cansado de só punir famílias que eram encaminhadas ao juizado por deixarem seus filhos em situação de risco e/ou abandono e entendendo que esses pais também eram vítimas do sistema, idealizou a Escola de Pais.
Para isso, foi buscar apoio em sua equipe técnica; convencendo, a todos, de que, apesar de parecer romântica e utópica essa idéia, era possível realizar um trabalho de reinserção social e reflexão sobre o que se espera deles, ou seja, a tarefa de protegerem seus filhos, apesar de toda dificuldade encontrada para atingirem tal objetivo.
Assim, o Projeto foi colocado em prática em 1998, sendo criada a primeira Escola de Pais, que contava com uma equipe técnica do juizado, dentre psicólogos, assistentes sociais e comissários de justiça, do qual eu fazia parte e, também, uma equipe de apoio.
Inicialmente, foi elaborado com dez encontros, a cada quinze dias, realizados no próprio juizado.
Eram convidados profissionais de diferentes áreas para ministrarem palestras, e outras atividades, como cantoterapia.
Cada encontro abordava diferentes tópicos, cuja finalidade era trabalhar com os pais seus potenciais e inclusão social, ou seja, era um espaço onde eles poderiam colocar suas angústias e necessidades e, principalmente, fazer aflorar o verdadeiro sentido da maternidade/paternidade.
Sendo ele um magistrado preocupado com o futuro daquelas crianças, sonhou um pouco mais… dando início a segunda fase do Projeto. Assim, o passo seguinte foi direcionado a dar ferramentas de inclusão no mercado de trabalho, mediante cursos profissionalizantes, mas, para isso, essas famílias necessitariam estar recebendo apoio financeiro por um determinado período e acompanhamento da equipe técnica do juizado, pois precisavam manter seus filhos protegidos de toda forma de abandono.
Por isso, foi buscar apoio na sociedade civil e pleitear o apadrinhamento das famílias que passavam pela primeira etapa da Escola de Pais. O que foi feito com sucesso e muito trabalho. Assim, todas as famílias eram apadrinhadas por uma pessoa (física ou jurídica), com um salário mínimo, pelo período de doze meses.
Mas, mesmo assim, ele queria mais, pois se perguntava “o que aconteceria com aquelas famílias após esse longo período de acompanhamento na Vara da Infância e Juventude?”.
Preocupado, foi buscar apoio do Tribunal de Justiça e de empresários dispostos a dar uma chance de emprego aqueles pais, agora já capacitados em alguma profissão, como jardinagem, reciclagem, vendedores de cachorro quente e coco em carrocinhas, lavagem de carros e outros.
Importante ressaltar que ele trabalhou ativamente para o sucesso dessas famílias. Muitas aproveitaram a oportunidade. Outras, infelizmente, não. Mas ele PROVOU que é possível mudar a realidade de nosso País, por meio de famílias estruturadas, mediante muita dedicação, honestidade, trabalho e, principalmente, amor ao próximo.

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Regina Andreiuolo, Comissária de Justiça aposentada. Recebendo o carinho da amiga!

  1. Praça Onze, Juizado da Infância e da Juventude, 2002. A agenda do Juiz Siro Darlan inclui uma “socialite”, o Secretário de Justiça do Estado, um mendigo, um menino de rua sem um braço, um famoso jurista, um grupo de jovens percussionistas de uma favela do Rio, um pastor evangélico, um ator e vários anônimos. Ninguém deixa de ser ouvido e todos recebem o mesmo respeito e atenção. No final do dia, a mesa está cheia de propostas, pedidos, convites. Tomando nos ombros a defesa das crianças e dos adolescentes, ele se tornou uma espécie de “Senhor. Estatuto”, identificado e confundido com a lei que tinha por missão aplicar. Daí a afluência de gente de todas as origens e de todas as camadas sociais, como se não houvesse iniciativa, projeto, ideia relacionada à infância e juventude que não devesse passar antes por seu gabinete. Ninguém sabe como ele conseguia dar conta de tantas solicitações, comparecer a tantos eventos, iniciar tantos projetos e ao mesmo tempo ser um dos campeões de produtividade entre os juízes. Parte da resposta pode estar em sua incansável energia, sua informalidade (tem horror à burocracia e aos salamaleques), sua disciplina, que o fazia chegar ao gabinete antes das sete da manhã e não sair antes de cumprir o último item de sua apertadíssima agenda, mas talvez esteja mesmo na sua paixão pela causa que abraçou. Impaciente diante das minguadas iniciativas na área, partiu para a ação e criou inúmeros projetos, como a Escola de Pais, que reinseriu inúmeras famílias na sociabilidade e na empregabilidade, o Banco de Empregos, que abriu oportunidades de estágio e de trabalho para adolescentes de baixa renda, o Justiça nas Comunidades, reconhecido pela ONU como projeto de excelência para levar justiça a comunidades pobres. Ao lado dessas ações pragmáticas, ele empreendeu uma missão impalpável, mas de visíveis resultados: com sua pregação pró-Estatuto, plantou definitivamente em nosso imaginário a noção da injustiça de que são vítimas tantas crianças e adolescentes brasileiros, colocando na pauta pública a urgência de reparar esta vergonha. Já desembargador, ele foi agraciado com o prêmio “Dom Quixote” e, quase simultaneamente, recebeu a Menção Honrosa de Direitos Humanos de 2005 da USP, alusões à sua capacidade de sonhar o impossível e de realizar o possível.
  2. “É preciso ajudar mais esses pais”. A frase do Dr. Siro Darlan, então Juiz-Titular da 2ª da Vara da Infância e Juventude traduzia o sentimento de toda a equipe que lidava com os adolescentes infratores. O contato com os adolescentes infratores despertou em sua aguda sensibilidade a necessidade de um programa de apoio às suas famílias, uma vez que eram gritantes as conexões ente as carências materiais e sociais e o ingresso em condutas infracionais. O Serviço Social da 2ª Vara e o Núcleo de Psicologia puseram mãos à obra e, desde 1993, aconteceram os “Encontros de Pais”, obedecendo ao espírito do ECA, que prevê, em seu artigo 129, encaminhamento dos pais a cursos ou programas de orientação. Inicialmente teve o formato de palestras com especialistas sobre educação, saúde, direitos e deveres de pais e filhos e outros temas relevantes. Os pais recebiam vale transporte e bolsas de alimentos, inicialmente doadas por instituições e mais tarde advindas de uma engenhosa parceria entre a 1a. Vara da Infância e Juventude e os JECRIMs. Atendendo à clientela em situação de risco, o projeto ampliou-se até tornar-se um amplo programa educativo, formador e de transferência de renda, compreendendo três módulos: Escola de Pais, -palestras educativas – Família Solidária – apadrinhamento das famílias por outras famílias com um salário mínimo por seis meses enquanto adquiriam alguma formação profissional – e Pais Trabalhando – inserção no mercado de trabalho por meio de convênios com o Tribunal de Justiça e outra empresas para atividades na garagem do TJRJ, na reciclagem de materiais e jardinagem também do TJRJ, comercialização de água de coco, etc., perfazendo um ciclo completo com porta de entrada e de saída, englobando aquisição de conhecimentos, preparação para o trabalho e ocupação laboral, com contrapartidas tais como a saída das ruas, ingresso e manutenção os filhos na escola, atualização das carteiras de vacinação, atendimento a demandas específicas de saúde da família, etc. Tudo isso foi obtido graças ao prestígio do Dr. Siro e aos ecos de sua cruzada permanente em favor dos pequeninos. A avaliação do por uma instituição independente _ a UIPES – revelou os enormes benefícios do Projeto, expressos na não recorrência dos responsáveis nos problemas que os trouxeram ao Judiciário – negligência e maus tratos para com a prole, abandono escolar, vida nas ruas, uso de álcool e drogas e outros –e na experimentação de uma vida mais plena sob o ponto de vista material, social e psicológico
Desconheço como está o projeto atualmente.
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