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(Millôr Fernandes)

terça-feira, 22 de outubro de 2019

O NAZIFASCISMO DOS GOVERNOS FRANQUISTA DA ESPANHA, SALAZARISTA DE PORTUGAL E O INTEGRALISMO NO BRASIL

Terça, 22 de outubro de 2019
Por


Salin Siddartha*
A vitória dos países aliados na Segunda Guerra Mundial impôs séria derrota ao nazifascismo, reduzindo-o, naquela época, aos governos franquista da Espanha e salazarista de Portugal. Em uma época como a que atravessamos, em que alguns governos tomam lugar com mandatários de caráter tipicamente neofascista em alguns países, julgamos oportuno recordar, com um pequeno resumo, o nazifascismo clássico como lição a ser evitada pela humanidade.
O Franquismo
Um regime fascista se manteve na Espanha de 1939 a 1978, com uma ditadura liderada pelo General Francisco Franco. Desde 1936, o General Franco (autodenominado de “Generalíssimo”) foi apoiado por simpatizantes do fascismo, membros do exército espanhol, pela burguesia conservadora e grande parte da classe média, além de setores da Igreja e do partido fascista (chamado Falange) que, proferindo uma tentativa de golpe contra o governo de esquerda que dirigia a Espanha, deu início à Guerra Civil Espanhola, da qual saiu vencedor o regime ditatorial franquista.
Durante a Segunda Guerra Mundial, Francisco Franco apoiou Hitler, Mussolini, e os portos da Espanha serviram ao contrabando de suprimentos da indústria bélica da Alemanha nazista. O “Generalíssimo” instituiu um regime de partido único, o qual concentrava os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Na Espanha, então, instaurou-se um regime fascista, pois fascista foi o discurso, a aparência, o estilo e até a estrutura do seu Estado. As bases do regime franquista foram marcadas pelo totalitarismo que tentava mudar toda a sociedade para criar um “novo homem” (na qual a mulher não tinha muito valor). O regime visava à unidade nacional espanhola, promoção do clero e religião católicos, nacionalismo castelhano (com a eliminação dos direitos das demais culturas, como a basca e a catalã), militarismo, corporativismo fascista, anticomunismo e antianarquismo.
O regime franquista prezava por um nacional-militarismo, demarcado por um antiliberalismo que tinha o corolário do anticomunismo acentuado pelo catolicismo, o qual Franco via como o fundamento moral e político da nação espanhola. Em verdade, o nacional-catolicismo é a marca da versão espanhola do fascismo. Economicamente, o “Generalíssimo” executou uma política autárquica que travou o desenvolvimento nacional e buscou implantar organizações sindicais vinculadas apenas ao governo. O Estado espanhol centrou-se na figura do ditador, enaltecido constantemente por meio de propaganda governamental. O ideólogo tradicionalista Víctor Pradera Larumbe, única referência intelectual de Franco, defendia um Estado inspirado na história espanhola e na tradição monárquica social favorecida pela igreja católica.
O regime franquista foi erigido repressivamente por meio da submissão da população, mediante a aliança entre as elites, forças conservadoras e forças armadas. As liberdades individuais e os direitos civis foram limitados e violados em face da repressão brutal e da eliminação física dos opositores do sistema. Durante o franquismo, 300 mil pessoas foram encarceradas em prisões de trabalhos forçados, dezenas de milhares foram enviadas ao exílio e 150 mil foram fuziladas por motivos políticos. O governo de Franco deixou mais de 100 mil desaparecidos cujo destino é, até hoje, desconhecido – mas havia impunidade absoluta para quem participava dos crimes do franquismo e enriquecia com o regime.
Depois da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos apoiaram o regime franquista em troca de concessões militares e econômicas que vulneraram a soberania nacional da Espanha. A partir da década de 50, houve um desenvolvimento econômico que, todavia, não acarretou reformas sociais ou supressão da desigualdade social, nem conquistas em prol da classe trabalhadora. Após 40 anos de ditadura, em 1978, o regime teve fim com a morte do ditador, que foi substituído pelo Rei Juan Carlos I. Com a adoção de uma nova constituição, a Espanha tornou-se uma democracia.
O Salazarismo
No caso de Portugal, o nazifascismo surgiu no início da década de 1920, contagiando cadetes, aspirantes ao oficialato e alguns republicanos de destaque. Terminou estabelecendo-se na ditadura de Oliveira Salazar. O salazarismo assemelhou-se mais com o regime italiano de Mussolini que qualquer outro Estado totalitário ou autoritário do período entre as duas guerras mundiais. A organização político-econômica da sociedade portuguesa salazarista era corporativista, mantinha a censura como prática política e o Secretariado de Propaganda Nacional como instituição, coisas que consubstanciavam a espinha dorsal do sistema liderado por Salazar. Após falecer, em 1970, Salazar foi substituído no poder pelo advogado Marcello Caetano, mas que governou por mais pouco tempo.
Como sói ocorrer com toda ditadura, após 41 anos de vida, ela foi derrubada, com apoio popular, pelos próprios militares portugueses, organizados no Movimento das Forças Armadas-MFA no dia 25 de Abril de 1974. Cansada da repressão, da censura, da guerra colonial e da crise econômica que se abateu sobre o país, o povo português saiu às ruas e apoiou o MFA e, em conjunto com as unidades militares, marcharam sobre Lisboa, ocupando uma série de pontos estratégicos. As guarnições militares que supostamente eram apoiantes do regime renderam-se e juntaram-se aos militares do MFA. O regime caiu sem ter quase quem o defendesse. Os acontecimentos deste dia culminaram com a rendição de Marcello Caetano, sitiado pelo capitão Salgueiro Maia, no Quartel do Carmo.
Foi uma revolução considerada “não-sangrenta” e “pacífica”, chamada poeticamente de “Revolução dos Cravos” porque, naquele 25 de abril, o povo português cercava os militares democratas e lhes ofertava cravos vermelhos. Há uma música de Chico Buarque (“Tanto Mar”) que homenageia aquele dia glorioso dia de libertação de Portugal do Fascismo.
O Integralismo
Em nosso país, também o nazifascismo teceu sua influência. Na década de 1930, surgiu, no Brasil, um movimento com posicionamento político de extrema direita, denominado Ação Integralista Brasileira-AIB. Era influenciado pelas doutrinas nazifascistas de Hitler e Mussolini. Seu principal líder era o escritor Plínio Salgado. O integralismo negava a democracia, defendia um Estado com poder centralizado, opunha-se ao pluripartidarismo e propunha o combate a qualquer tipo de oposição política – aproximava-se do que, mais tarde, viria a ser implantado em nosso país pelo Golpe Militar de 1964.
Possuía como lema “Deus, Pátria e Família”, mesmo mote utilizado pela ditadura salazarista em Portugal. Usava o anticomunismo como principal motivação para conquistar adeptos, era marcado por uma estrutura extremamente hierarquizada, de conotação militar, burocrática e totalitária. Inicialmente, o integralismo recusou-se a ser qualificado de partido político, mas, posteriormente, em 1934, passou a disputar o poder pelos canais eleitorais. Ocorreram vários conflitos entre antifascistas e integralistas. Era comum os integralistas provocarem os defensores da democracia, imiscuindo-se em suas reuniões para tumultuá-las.
Os integralistas desempenharam um triste papel no âmbito do conservadorismo burguês do Brasil. O movimento deles foi posto na ilegalidade em 1937, logo após o fracasso da tentativa de tomar, pela força das armas, o Palácio do Catete, sede do Governo Brasileiro e residência oficial do Presidente da República, Getúlio Vargas.
Cruzeiro-DF, 21 de outubro de 2019
SALIN SIDDARTHA
*Fonte: JornalInfoCruzeiro