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(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

A vontade Social

Quinta, 23 de janeiro de 2020
Por
Salin Siddartha

A VONTADE SOCIAL
As relações sociais criam interesses e opiniões determinantes para a formação histórica da cultura de um povo. É a vontade social que condiciona as opções políticas das classes sociais e das elites de poder (atente-se, aqui, para o fato de que opções políticas da sociedade são opções históricas), mediante as quais se desenham a identidade da nação e as escolhas que marcarão o destino dela, em face dos dados que afloram ante os questionamentos decorrentes do processo coletivo de sua existência. As conduções para o respectivo porvir se formulam e reformulam com base nos embates que emergem das relações opositivas demarcadas no seio da vida social.
É latente a existência de um “acordo” tácito que registra a realidade resultante da vontade social. Esse registro funciona como formador dos interesses de caráter geral que organiza a ética articuladora das reflexões do imaginário coletivo, portanto da ideologia que subjaz à sociedade. A vontade social é retroalimentada pelo imaginário coletivo; é uma categoria socialmente organizadora, estruturadora do processo de decisões que acontece no seio da sociedade.
A intersubjetividade é o ducto que conduz as determinantes da vontade social. É uma superfície fenomênica que se pontua de maneira volitiva na configuração do real para a sociedade. Nesse sentido, há uma dinâmica produtora da vontade geral constituída pelo acúmulo das vontades individuais e corporativas, levando-se em conta que cada interesse particular traz em si uma função teleológica capaz de ajudar a plasmar o que o imaginário coletivo poderá estabelecer como o “bem geral”. A vontade social assume o caráter de um convênio da personalidade pública estabelecida em um corpo moral coletivo conformado ao Estado que dela irradia. Existe na sociedade um sistema de base plural mobilizador de vontades individuais e coletivas que determina e define o futuro. Isso não significa que exista unanimidade no interior da vida social, razão por que a vontade social pode ser contrariada, reformada e até transformada, no decorrer da
história, pela capacidade desempenhada pelos sujeitos sociais com competência suficiente para arrebatar vontades vitoriosas no contexto da vida social.
Os diversos arranjos engendrados pela complexidade sistêmica do processo de identidade da sociedade com seu imaginário e, ao mesmo tempo, de diferença entre as vertentes de opções políticas que se lhe oferecem deflagram uma hierarquia espelhada pela influência das elites mediante as escolhas que elas fazem. Há lugares e épocas em que as elites esclarecidas se sobressaem, às vezes, às intuições do povo, e conseguem levá-lo a novas etapas de desenvolvimento, que ele só mais tarde materializa; e há lugares e épocas em que a população impulsiona a sociedade, sem direção definida, mas buscando a renovação (nesse aspecto, tornaram-se exemplares as manifestações que ocorreram no Brasil, nos meses de junho e julho de 2013).
Assumir o devir é, assim, influenciar no desenvolvimento da sociedade para que ela venha a ser o que já estabeleceu para si ou venha a ser as mudanças optadas pela modificação da vontade social. Daí a necessidade de sensatez da política dos dirigentes conscientes de que suas escolhas serão exemplos determinantes para a formação da vontade de poder da sociedade. Deduz-se, então, achar lugar nessa realidade um concerto de posições capaz de modificar a vontade social e salvar o destino de uma população, já que, exatamente por uma questão de vontade social, houve nações e civilizações que até mesmo desapareceram em decorrência de suas opções históricas, e outras que conseguiram evitar tal destino.
Cruzeiro-DF, 22 de janeiro de 2020
SALIN SIDDARTHA