Sábado, 5 de maio de 2012
Por Ivan de Carvalho
De acordo com a Agência
Estado, líderes petistas – preocupados com o desempenho da candidatura do
ex-ministro da Educação, Fernando Haddad, a prefeito de São Paulo – disseram
ontem que a “agenda religiosa” deve ser evitada para o “bem” da democracia.
No dia 10 de fevereiro de
1980, reuniram-se no palácio onde funcionava e ainda funciona o Colégio Sion,
no bairro de Higienópolis, em São Paulo, muitas pessoas – líderes políticos e
sindicais, alguns intelectuais e outras personalidades. Esta reunião
representou a fundação formal do PT, com ata lavrada e assinada.
Colégio Sion
Ah,
sim, o mais importante. O Colégio Sion pertence à Congregação Nossa Senhora de
Sion, fundada em 1842 pelo padre Theodoro Ratisbonne, judeu que se convertera
ao cristianismo juntamente com seu irmão, o padre Afonso Ratisbonne. Não há
dúvidas sobre o que é dito neste parágrafo e no anterior, as informações podem
ser conferidas fácil e copiosamente com a ajuda do Google.
Quanto ao primeiro
parágrafo, ante os outros dois pode parecer surpreendente. Ainda mais que nos
seus primórdios e por muitos anos, quando ainda era um partido perdedor e em
construção, o PT vivia pendurado nas batinas, não só em São Paulo – onde
recebeu um apoio decisivo de parte importante do clero católico, sob as bênçãos
estimulantes do cardeal arcebispo dom Paulo Evaristo Arns – como em todo o
Brasil.
Quem, de mente sã, não se
lembra da dependência do PT – nas periferias das grandes cidades e no interior
brabo – em relação às Comunidades Eclesiais de Base e algumas das chamadas
“pastorais”? Quem, para citar um entre vários exemplos baianos, não se lembra
da força que sempre deu ao PT o bispo dom José Rodrigues, da diocese de
Juazeiro, até “emprestando” camisa a Lula? E quem ignora o apego que teve o PT
durante anos à “agenda religiosa” da Teologia da Libertação, que lhe deu doce
aconchego?
Não sei se o caso é de
ingratidão, se é de amnésia, se é de desconversão ou se é de alergia criada
pelo excesso de “agenda religiosa” no período de construção do PT. Mas o fato é
que o PT agora não quer saber de “agenda religiosa” na campanha eleitoral e
adverte que a infiltração dessa “agenda religiosa” na campanha seria nociva à
democracia.
A declaração de repulsa do
PT à “agenda religiosa” foi uma réplica à defesa que o candidato do PSDB a
prefeito de São Paulo, José Serra, fez da atuação das igrejas na campanha
eleitoral. “A religião não pode ir para o embate político, isso é muito ruim,
muito perigoso. Não devemos instigar a disputa religiosa em processo
eleitoral”, reagiu o presidente estadual do PT, deputado Edinho Silva. O
presidente nacional do PT, Rui Falcão, disse que a repetição do debate
religioso “preocupa” porque o país avança na educação e “na politização da
sociedade”.
Serra dissera, numa
entrevista a um programa de televisão, que é legítimo uma pessoa religiosa
discutir seus princípios na campanha. E, presume-se, orientar seu voto e sua
opinião por esses princípios. Edinho Silva protesta: “Religião é de foro íntimo
e pessoal. Trazer uma questão tão pessoal, tão subjetiva, eu penso que é um
retrocesso democrático”.
Querer evitar ou tentar
impedir que se discutam numa campanha eleitoral questões “tão pessoais, tão
subjetivas”, a exemplo do crudelíssimo homicídio chamado aborto, é, isto sim,
um retrocesso.
O PT agora quer escolher os
assuntos que a sociedade deve discutir nas campanhas eleitorais. Deve ser algum
novo “marco regulatório”.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia deste sábado.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.