Domingo, 27 de maio de 2012
O
governo Dilma está se especializando em vender gato por lebre, como se
diz. O grau de hipocrisia e de enganação chega a níveis assustadores.
Porém, uma contradição em especial salta aos olhos: o país sede da
Rio+20 faz um pacote para incentivar a compra e a produção frenéticas de
automóveis!
O
Brasil sediará a Rio+20, que supostamente está preocupada em criar
mecanismos de proteção ao meio ambiente e isto traz à tona o
questionamento de, afinal, que tipo de crescimento estamos interessados?
Evidentemente, sabemos que a chamada “economia verde”, mencionada no Draft Zero está
muito mais interessada em transformar o verde em negócio, como sugere
Hans Jöhr, e a ONU pode ser um bom canal para ganhar tal invólucro. Este
certamente não é o caminho. O essencial não é substituir cosmeticamente
as matrizes energéticas, produtivas e de consumo, mas fundamentalmente
uma ruptura substantiva com a lógica de reprodução do sistema que, por
priorizar o lucro, é potencialmente destrutivo.
Por
outro lado, não se trata de um retorno ao passado. Não se trata de
negar, nem mesmo frear o desenvolvimento das forças produtivas. Não há
muitos lugares no mundo que podemos chamar de “natureza”, no sentido
frequentemente imputado ao termo, como uma espécie de antagonismo à
“humanidade”. Acreditamos ser mais correto falar de uma “natureza
produzida”, como sustenta David Harvey, na qual a opção política e
econômica da classe dominante produz a destruição e não a diminuição das
barreiras naturais. Da mesma forma, poderíamos desenvolver forças
produtivas para produzir uma natureza harmônica com a humanidade.
No entanto, no país sede
da Rio+20, o governo federal tem apostado na destruição ambiental como
carro-chefe do crescimento econômico e, por consequência, dos mecanismos
de acumulação capitalistas. Apesar do discurso demagógico do governo
federal, o Brasil sustenta seu crescimento em setores que passam
anos-luz à distância inclusive de qualquer “economia verde”. O
agronegócio brasileiro, movimentando US$ 330 bilhões por ano, responde a
25% do PIB. O intenso debate em torno da reforma do Código Florestal e
sua anistia aos desmatadores, a construção controversa de Belo Monte,
entre outras obras do PAC respondem a este setor latifundiário que, para
além de sua pujança econômica, tem um peso político determinante no
atual bloco de poder que governa o Brasil. Este setor econômico, no
entanto, concentra sua atividade em exportação de commoditties.
Em
uma situação de crise e, logo, de retração da demanda global, em
especial na Europa que compra em torno de 35% da produção do “nosso” agrobusiness,
o governo concentra seus esforços na produção de demanda interna, assim
como no incremento do que Marx chamou de Departamento I (produtor de
meios de produção), em outras palavras, demanda por bens de capital.
Para tanto, encontrou na indústria automobilística, que representa 10%
do PIB brasileiro, uma saída para alavancar o consumo (dos trabalhadores
e dos capitalistas). O pacote anunciado por Dilma R$ 2,7 bilhões para
estimular o consumo, principalmente de automóveis e bens de capital,
derrama incentivos fiscais e créditos para diminuir os estoques do setor
automobilístico. A presidente garante: “estamos 100% preparados, 200% preparados, 300% preparados. Nós vamos resistir à crise“.
Os
componentes da crise atual, porém, também envolvem uma dimensão
ecológica, de esgotamento dos recursos naturais e da necessidade
crescente de seu controle público, na qual o Brasil tem dado péssimas
demonstrações. Quer dizer, o país que sediou a Eco-92 e sediará a Rio+20,
que faz um discurso de que está construindo um caminho sustentável de
crescimento, em defesa dos interesses do empresariado nos condena a
cidades cada vez mais abarrotadas de automóveis, inviáveis do ponto de
vista da mobilidade urbana e profundamente poluentes. Será que é este
crescimento que necessitamos para deixarmos de ser campeões de
desigualdade e destruição ambiental?
Os
governos da iniciativa privada, como o do PT, utilizam a crise
econômica como pretexto para deixar para depois qualquer medida que
combata a destruição do meio ambiente, a urgência é salvar os lucros dos
bancos, dos latifundiários e dos burgueses. Eles sabem que os primeiros
a serem atingidos pela destruição ambiental, pelos transgênicos ou
pelas enchentes são os pobres do campo, da cidade ou das florestas. E
quanto aos carros? Bem, eles cada vez mais andam de helicóptero.
* Sociólogo e da Direção do PSOL Porto Alegre.