Sai polícia, entra exército. Sai exército, vem polícia. Onde está a paz na Maré?

Quinta, 9 de julho de 2015

Do Jornal do Brasil

Walmyr Junior * 

Após viver em um verdadeiro estado de guerra civil, com mais de um ano de ocupação militar no complexo de favelas da Maré, os números infelizmente não são divulgados pela grande mídia. Foram 674 prisões, 1.356 apreensões de drogas, armas e munições, 21 militares feridos e 22 mortes durante os confrontos, incluindo um cabo do Exército, tudo isso durante 83 mil operações.

 

Desde abril de 2014 até 30 de junho de 2015, a União gastou R$ 41,9 milhões por mês para manter um efetivo de cerca de três mil homens em patrulha diária no Complexo da Maré. Cerca de 23.500 militares passaram pela Maré. 

Qual foi o saldo positivo desse investimento?

 

Se algum leitor desta coluna souber, pode me informar por gentileza. Como morador da Maré, só vi correr rios de dinheiro para a implementação de uma política de segurança falida que só sustentou o caos e a barbárie dentro da favela. A população da Maré, que continua refém da violência, não teve um minuto de paz. O mito da pacificação passou por aqui e deixou rastros de insegurança, medo e sofrimento. 

Um circo armado! A PM já realizou três grandes operações e diversas incursões com seus homens de preto e seu carro ‘imbatível’ denominado ‘Caveirão’. Com uma frota de PMs espalhados da praia de Ramos até a Salsa e Merengue, todo o complexo de favelas da Maré está sitiado. As crianças sem aulas na escola, os moradores amedrontados, a juventude reprimida e criminalizada, e o Governo do Estado insiste em continuar com a pacificação que só traz medo. 

A primeira incursão da PM apreendeu 9,5 kg de maconha e 1313 trouxinhas da mesma droga, dois kg de cocaína e 1293 papelotes da mesma droga, 46 pedras de crack, 20 balas de ecstasy, 19 frascos de lança perfume, 15 frascos de loló, um binóculos, uma balança de precisão, quatro carregadores de pistola, dois rádio-transmissores, sete carregadores de rádio e cinco baterias, além de 28 motos.

Pergunto-me novamente qual foi o saldo positivo dos R$ 41,9 milhões gastos pela manutenção das forças militares na Maré? Se a PM orquestrou tal apreensão no seu primeiro dia de ocupação, o que o exército fez em tanto tempo aqui na Maré e não reprimiu tal violência? 

Lamento em dizer que os inúmeros casos de violação dos nossos direitos vão continuar acontecendo. Daqui a alguns dias a poeira abaixa e a tão sonhada paz não chegará nas favelas da Maré. A corrupção da polícia militar vai voltar a dar as cartas no jogo sujo do suborno, nossas escolas continuarão precarizadas, os espaços de cultura e lazer continuarão sendo negados e o acesso ao saneamento básico... Enfim, continuaremos com nossos mais de 130 mil moradores jogando nosso esgoto na Baía de Guanabara. 

*Walmyr Júnior é morador de Marcílio Dias, no conjunto de favelas da Maré, é professor e representante do Coletivo Enegrecer como Conselheiro Nacional de Juventude (Conjuve). Integra a Pastoral Universitária da PUC-Rio. Representou a sociedade civil no encontro com o Papa Francisco no Theatro Municipal, durante a JMJ.