Sexta, 23 de setembro de 2016
A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) tomará providências jurídicas para suspender os efeitos da MP 749/2016 no Supremo Tribunal Federal
============
A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) tomará providências jurídicas para suspender os efeitos da MP 749/2016 no Supremo Tribunal Federal
============
Da CNTE (Publicado em Sexta, 23 Setembro 2016)
Em 22 de setembro de 2016, em ato solene no Palácio do Planalto, o
presidente golpista Michel Temer e o ministro da Educação Mendonça Filho
apresentaram o conteúdo da Medida Provisória nº 746, de 22/09/16, que
visa reformular o formato e o conteúdo pedagógico da etapa escolar do
ensino médio.
Primeiramente, é preciso destacar o expediente antidemocrático usado
pelo governo golpista para tratar de um tema de tamanha relevância
social. A medida provisória, que tem força de lei na data de sua
publicação e prazo de até 120 dias para aprovação no Congresso, não se
encaixa nas condições legais, jurídicas ou morais para esse tema de
imensa importância para a vida de milhões de pessoas das atuais e
futuras gerações. Na verdade, ela apenas escancara o desejo do atual
governo em limitar o acesso da população e das entidades educacionais
sobre as decisões em torno da reforma do ensino médio, e a CNTE tomará
providências jurídicas para suspender seus efeitos no Supremo Tribunal
Federal, o mais brevemente possível.
Sobre o conteúdo, a reforma do MEC tem um objetivo central – reduzir a aprendizagem dos estudantes aos ditames do mercado e fomentar a privatização das escolas e a terceirização de seus profissionais.
Sobre o conteúdo, a reforma do MEC tem um objetivo central – reduzir a aprendizagem dos estudantes aos ditames do mercado e fomentar a privatização das escolas e a terceirização de seus profissionais.
Com relação ao currículo, a reforma empobrece o ensino médio
retirando (ou não) as disciplinas de artes, educação física, sociologia e
filosofia, conforme se anunciou na solenidade governamental e que
depois foi retratada não se sabe exatamente porquê. Propõe-se novamente a
dicotomia entre formação geral humanística e a profissional, mas vai
além, ao propor também a dicotomia entre a base comum nacional e as
áreas de ênfases do conhecimento: linguagem, matemática, ciências
humanas e naturais e ensino técnico profissional.
Neste sentido, a MP rompe com as diretrizes curriculares nacionais do
ensino médio e da educação técnica profissional, que defendem a
integração dos currículos escolares, sem distinção de blocos de modo a
privilegiar a “interdisciplinaridade ou outras formas de interação e
articulação entre diferentes campos de saberes específicos”. O parágrafo
2º do art. 8º da Resolução CNE/CEB 2/2012 é taxativo ao dizer que “a
organização por áreas de conhecimento não dilui nem exclui componentes
curriculares com especificidades e saberes próprios construídos e
sistematizados, mas implica no fortalecimento das relações entre eles e a
sua contextualização para apreensão e intervenção na realidade,
requerendo planejamento e execução conjugados e cooperativos dos seus
professores”.
Contudo, a petulância dos arautos do déspota golpista foi além.
Tratou de revogar tacitamente as mencionadas resoluções do Conselho
Nacional de Educação (CNE), repassando ao MEC, por meio do § 2º do art.
36 (versão da MP), o poder supremo para emanar as diretrizes que devem
pautar a construção dos “projetos de vida” dos estudantes e sua
“formação sob os aspectos cognitivo e socioemocionais” – veja a carga
individualista e limitadora que se pretende lançar sobre os currículos
do ensino médio!
Ainda sobre o currículo, e não obstante o problema da dicotomia
imposta na MP, é de se imaginar como os sistemas estaduais – que visitam
constantemente o MEC com “pires na mão” – conseguirão implementar as
áreas de conhecimento específico com a qualidade pretendida pelos
estudantes, pais, trabalhadores em educação e sociedade em geral. Talvez
por isso a MP tenha sido generosa (ou astuta!) em autorizar aos
sistemas de ensino a implementação de uma, e só se possível mais de uma
área com ênfase em conhecimentos específicos. Muitos estudantes
certamente ficarão sem cursar suas áreas de preferência na escola
pública, pois os sistemas de ensino não serão obrigados a oferecerem as
cinco áreas de aprofundamento. E como ficarão os jovens nesta situação?
Outra intenção da reforma é reduzir o conhecimento obrigatório dos
estudantes do ensino médio público à língua portuguesa e à matemática –
únicas disciplinas a serem ministradas obrigatoriamente nos três anos do
ensino médio –, a fim de melhorar as notas nos testes estandardizados
(nacionais e internacionais) e de quebra fomentar a formação de mão de
obra barata e despolitização dos sujeitos (mesmo objetivo da reforma
educacional de 1990, porém à época o foco era o ensino fundamental).
Não por acaso, a pretensa reforma do ensino médio se mostra
estreitamente alinhada com outras iniciativas retrógradas do governo
golpista, a exemplo da Lei da Mordaça, da PEC 241, que limitará as
despesas da União em áreas sociais – inclusive na educação –, da
privatização das escolas e da terceirização dos profissionais da
educação por meio de OSs (e a MP prevê contratar professores por notório
saber, sem concurso público), da reforma da previdência e da
flexibilização e redução de direitos trabalhistas, comprometendo,
portanto, não só os estudantes, mas também os trabalhadores em educação.
Ela se insere num projeto político pensado pelas elites para consolidar
o poder que perderam por mais de uma década e que não podem correr o
risco de perdê-lo novamente.
Com relação a expansão da carga horária, a reforma prevê instituir política (mas na verdade é programa) de repasse de recursos da União diretamente às escolas que implementarem o currículo mínimo e o ensino de tempo integral. Mas nesse ponto há um blefe, pois não existe garantias de que os recursos seguirão de fato para as escolas, tampouco em que quantidade. O § 2º do art. 6º da MP é claro: “A transferência de recursos será realizada anualmente, a partir de valor único por aluno, respeitada a disponibilidade orçamentária para atendimento, a ser definida por ato do Ministro de Estado da Educação.” (grifo nosso)
Extraoficialmente, foi divulgado que até 2018 serão repassados R$ 1,5
bilhão na forma de estímulo aos estados, o que representa menos de 10%
da complementação da União ao Fundeb neste ano de 20126 – ou seja, muito
pouco dinheiro! Com essa quantia pretende-se atender até 500 mil
estudantes em tempo integral, sendo que o investimento per capita por
aluno será de R$ 3.000,00, abaixo do praticado em 2016 no Fundeb (R$
3.561,74).
A privatização e a terceirização das escolas se mostram claras na MP.
Primeiro, cria-se mais um segmento profissional (sem necessidade de
habilitação) dentro da categoria dos trabalhadores em educação (art. 61
da LDB). Para a contratação desses profissionais bastaria a comprovação
de “notório saber”. Depois admite-se o repasse de parte da ajuda federal
aos estados para pagamento de bolsas de estudo na rede privada. E por
último, ao limitar a “ajuda” da União aos estados em no máximo 4 anos –
depois disso os entes estaduais terão que arcar com as despesas
integrais das “novas escolas” –, abre-se caminho para as parcerias
público-privadas sobretudo pela via já pavimentada das Organizações
Sociais.
A MP não se refere ao ensino noturno ou a regulamentação do CAQi e
CAQ, como forma de equalizar as condições de acesso, permanência e
aprendizagem dos estudantes do ensino médio. Também não aborda outras
questões indispensáveis à qualidade, a exemplo da limitação do número de
estudantes por sala de aula, do acesso prioritário dos jovens de baixa
renda no ensino de tempo integral, da formação e valorização dos
profissionais da educação, dentre outras.
A CNTE espera suspender nos próximos dias a eficácia da Medida
Provisória, possibilitando a abertura de um debate amplo e democrático
com a sociedade a respeito do tema.
Confira a MP na íntegra aqui.