Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sábado, 20 de julho de 2013

Os vândalos

Sábado, 20 de julho de 2013
Por Ivan de Carvalho
Coisas estranhas estão acontecendo no Brasil. Uma delas são os vândalos. Eles saltaram da história, onde estiveram fazendo consideráveis estragos nos domínios de Roma, na Gália e na península ibérica – de modo que isto nos põe, até certo ponto, como descendentes deles – diretamente para infernizar as manifestações de rua pacíficas realizadas no Brasil em junho e permitir que a mídia dividisse os manifestantes em duas categorias, os bons, pacíficos, e os maus, vândalos. É verdade que poderiam chamar a estes também de bárbaros, mongóis, capadócios, cretinos, hunos, filisteus, ou de qualquer outro grupo histórico de humanos, em alguma ocasião, predadores. Mas a mídia fixou-se nos vândalos e daí não arredou pé.

E quando parecia que estavam entrando em férias, retornam os vândalos tentando resgatar, do lixo político em que mergulhara o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, do PMDB petista. Aproveitaram-se de uma grande “manifestação pacífica” em frente ao prédio em que reside o governador, no sofisticado bairro carioca do Leblon, e no final entraram em ação para – graças à inacreditável falha do grande aparato policial montado para proteger o prédio, realizar um quebra-quebra cujo único sentido imaginável seria transformar o governador de réu em vítima e ajudá-lo no esforço de recuperar-se política e popularmente, ele que vinha tendo sua saída do Leblon exigida pelos vizinhos, que não gostavam da movimentação bélica atraída pelos protestos quase permanentes ante à residência dele.

Imagem da internet
Mas vão-se os vândalos cabralinos e os de tantas outras “manifestações pacíficas” para que possa ocupar o palco um outro vândalo, o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, do PMDB, partido que está, no momento, muito mal relacionado com o governo do qual é o principal aliado no Congresso. Alves está propondo uma ação do mais severo vandalismo no ministério da presidente Dilma Rousseff. Pede que sejam reduzidos de 39 para 25 os cargos de ministro, com o que 14 seriam alijados. Um horror, que atingiria fortemente, e em um momento de extrema aflição, a política de quinhões adotada ante a queda do Mensalão e incrementada a partir de 2011 por Dilma Rousseff. Estratégia para acomodar os partidos aliados e, em alguns casos, suas correntes internas – a começar pelas correntes internas do PT, o partido governante.

O governador Jaques Wagner, em entrevista ao jornal A Tarde, qualificou de “discurso da direita” a proposta do presidente da Câmara federal, explicando que o discurso do que ele, governador, chama de “direita” é de “menos Estado”, enquanto o que a rua está pedindo é “mais presença do Estado e não menos”. Bem, evidentemente a rua está pedindo mais eficiência do Estado nos setores de saúde, segurança pública, educação, na ação para melhorar o transporte coletivo, principalmente urbano e em outros serviços públicos, mas tudo isto pode ser feito sem o exagero de 39 ministérios. Ou mesmo de 25.

O governador não sabe e também eu não sei como o deputado Henrique Eduardo Alves fez essa conta sobre o número de ministérios que julga adequado, mas tenho a impressão (não é uma conta, é uma intuição, indiscutível por sua própria natureza) de que aquele número de ministérios que o presidente da Câmara sugere extinguir – os 14 – pode ser um bom número para os ministérios que permaneceriam. O governo Collor tinha apenas 12.

Claro que as funções de muitos dos ministérios (considerando apenas os que verdadeiramente têm funções) que fossem extintos seriam absorvidas pelos que não fossem. Também poderia haver fusões. Mas...

Mas, nada. A presidente pode mudar um ministro aqui, outro ali, trocar seis por meia dúzia, quem sabe até mexer na equipe econômica, que chega a dar pena de tão fraquinha, mas redução expressiva do número de ministérios, nem pensar. E o presidente da Câmara sabe disso. Ele pede a redução para passar a impressão de que a presidente não tem coragem de fazer, da mesma forma que Dilma e o PT insistem no plebiscito inviável para o que chamam de reforma política. Querem passar a ideia de que o Congresso recusa-se a dar “voz ao povo”, perguntando-lhe formalmente o que quer.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia deste sábado.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.