Quinta, 14 de janeiro de 2016
Tribuna da Imprensa
Igor Mendes
Aguarda-se
para logo mais, com grande expectativa, o terceiro ato contra o aumento
das passagens em São Paulo. Mais do que a revogação do aumento, a
própria defesa do direito de manifestação ocupa o centro do embate entre
os movimentos populares de um lado, e os governos fascistas de Haddad e
Alckmin de outro. Sim, de nada adianta Haddad e os petistas fingirem
que nada têm a ver com a história, porque é para garantir o aumento
decretado pela Prefeitura, isto é, o lucro dos empresários de ônibus,
que agem os Robocop’s do Estado. É uma relação de causa e consequência,
inseparável.
As
declarações do Secretário de Segurança Pública de São Paulo, o
truculento e imbecil Alexandre de Moraes, parecem saídas diretamente dos
escombros do governo Médici. Quem pensa ser esta figurazinha tacanha
para pretender determinar onde os manifestantes devem ir, ao arrepio do
que fala a própria lei que vigora no País? Mais do que abuso de
autoridade, incorre esta criatura em delírio mesmo.
A
brava juventude que não se dobrou à proibição de marchar pela Paulista
em 2013; que ocupou as escolas no fim do ano passado contra as mudanças
impostas à rede de ensino; essa juventude tampouco irá ceder agora. Esse
é o lado da verdadeira força, baseada em amplo apoio popular e no vigor
dessa nova geração que desperta para a luta política –força muito mais
potente que a mera força bruta da PM paulista.
Na
verdade, a repressão turbina ainda mais a mobilização, porque não se
pode simplesmente impor o Estado de sítio na maior cidade do País sem
que isso gere resistência e indignação correspondentes. Não será através
de “mediação” institucional que a liberdade de protestar será
garantida, aliás, nem devem os ativistas sequer cogitar ceder quanto ao
trajeto da manifestação, tema a ser resolvido exclusivamente pela
soberania popular. Além disso não há “negociação” quando uma das partes
está armada até os dentes, tendo além disso carta branca para violar os
mais elementares direitos.
As ruas darão a palavra final.
Rafael Braga é todo um povo
Os
brasileiros pobres, negros, os 550.000 miseráveis que penam no interior
das masmorras do sistema penal brasileiro, os favelados, mantidos
encarcerados a céu aberto, sob a batuta do Caveirão e das UPP’s: Rafael
Braga é todos eles.
De
que adianta introduzirem a tal “audiência de custódia”, pretensa
inovação que possui objetivo declarado de reduzir os índices de
encarceramento, se os juízes não mudam, se são em sua imensa maioria
racistas, higienistas, punitivistas, alérgicos a tudo que lembre povo?
Se veem na prisão o melhor e mais rápido remédio, quando esta deveria
ser sempre o último e mais extremo recurso?
De
que adianta falar-se em “Estado democrático de direito”, quando o que
temos na prática é um regime que prende e mata seletivamente, quando, de
fato, para uma parcela específica da nossa população –a juventude sem
emprego e sem instrução,
moradora
dos bolsões de miséria dos grandes centros –os anos de chumbo
simplesmente nunca acabaram? (Saímos de uma população carcerária de 90
mil almas em 1990 para 550.000 atualmente, a quarta maior do mundo, a
despeito de ser este período comemorado como o “mais democrático” de
nossa história.
Porque
é um membro típico deste grupo social Rafael Braga Vieira foi o
primeiro brasileiro condenado no contexto das manifestações de junho de
2013. Por isso, e também porque anda carregando uma tornozeleira, que
amplia o já imenso estigma que acompanha os ex-presidiários, foi parado
por policiais da UPP, que lhe espancaram, ameaçaram, forjaram um
flagrante e lhe fizeram voltar para o regime fechado, talvez por muitos
anos (trabalhemos duro para que não!), se vingarem novamente as
acusações que lhe são feitas.
Essa
prisão de Rafael é uma afronta, não apenas contra ele mesmo e sua
família, contra a campanha por sua liberdade, contra tudo que com muito
esforço foi construído. É também uma afronta contra todos os que são
como Rafael, ou seja, pela cor da sua pele e condição sócio-econômica,
culpados até que se prove o contrário. Defender sua liberdade é,
portanto, questão de honra para os que escolheram o lado de cá nesta
luta. No dia em que cada Rafael Braga descobrir a sua força, nesse dia, a
liberdade começará a ser realmente conquistada para o nosso povo.