Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

domingo, 13 de setembro de 2015

Dos empresários à Dilma: “Ou dá ou nós descemos!”. Da ‘Folha’ à Dilma: “Arrocha a sociedade ou renuncie!”

Domingo, 13 de setembro de 2015
Do Blog Náufrago da Utopia
Por Celso Lungaretti
[clique sobre a imagem abaixo]

Quem tem acompanhado meu  trabalho não se surpreenderá com os vários indícios de que a contagem regressiva para o defenestramento da presidenta Dilma Rousseff está chegando ao fim.

Neste domingo, 13, a Folha de S. Paulo não só assume em editorial que tal desfecho já entrou na ordem do dia, como o faz num editorial excepcional, publicado na capa, com o título alarmista de Última chance :
"Às voltas com uma gravíssima crise político-econômica, que ajudou a criar e a que tem respondido de forma errática e descoordenada; vivendo a corrosão vertiginosa de seu apoio popular e parlamentar, a que se soma o desmantelamento ético do PT e dos partidos que lhe prestaram apoio, a administração Dilma Rousseff está por um fio. 

A presidente abusou do direito de errar. Em menos de dez meses de segundo mandato, perdeu a credibilidade e esgotou as reservas de paciência que a sociedade lhe tinha a conferir. Precisa, agora, demonstrar que ainda tem capacidade política de apresentar rumos para o país no tempo que lhe resta de governo".



Previsivelmente, o jornal pede que se reequilibrem as finanças públicas com medidas ainda mais draconianas do que as propostas por Joaquim Levy e propõe que exploradores e explorados dividam entre si o sacrifício. Omite que os primeiros (mesmo numa perspectiva capitalista) sempre foram beneficiados demais e os segundos, prejudicados demais. É hora, isto sim, de reequilibrarem-se os pesos da balança, entregando a conta para os que, mesmo perdendo os anéis, ainda conservarão gordos os dedos.

E se Dilma não fizer o que a Folha exige, ou seja, a radicalização do chamado austericídio? Aí o jornal comprova mais uma vez que não ter sido casual seu apoio à dita-nada-branda:

"Serão imensas, escusado dizer, as resistências da sociedade a iniciativas desse tipo. O país, contudo, não tem escolha. A presidente Dilma Rousseff tampouco: não lhe restará, caso se dobre sob o peso da crise, senão abandonar suas responsabilidades presidenciais e, eventualmente, o cargo que ocupa(o grifo é meu).

Pronto, o gênio saiu da garrafa: o jornal mais influente do País já se arroga o direito de sugerir o impeachment, ao mesmo tempo que dá um ultimato velado à presidenta!

E por que o faz neste instante? A resposta está em três notícias da mesma edição dominical da Folha:

"Empresários fizeram chegar ao governo a avaliação de que, com a perda do grau de investimento do país, a presidente Dilma Rousseff precisa agir rapidamente e mostrar resultados até outubro. Caso contrário, afirmaram, ficará difícil manter o apoio do setor empresarial, um dos últimos lastros do governo petista. 


A conjectura foi transmitida a interlocutores da presidente como um alerta para a necessidade da petista ser firme na definição de medidas para reequilibrar as contas públicas, a despeito de críticas ao ajuste de setores do PT e do ex-presidente Lula". [Ou seja, os tais empresários são o sujeito oculto do editorial da Folha. O ou dá ou nós descemos foi inspirado por eles, que exigem rendição incondicional. Eu avisei que as coisas chegariam a este ponto; Dilma teria saído bem melhor na foto caso houvesse reagido antes de lhe colocarem a corda no pescoço. Demorou demais para escolher o lado certo e, agora, só salvará seu mandato se aceitar tornar-se uma fantoche explícita do capital.]
"A Câmara deve começar a tratar formalmente do processo de impeachment de Dilma Rousseff nesta semana, quando deputados de oposição apresentarão requerimentos ao presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para que ele se posicione sobre os 13 pedidos de deposição. 

Cunha já avisou que pretende negar, se não todas, boa parte das ações exigindo o impeachment. Com os demais, ele continuaria protelando. 

Quem fez editorial similar... acabou fechando!

O roteiro dos defensores do afastamento é então apresentar recursos questionando uma das recusas de Cunha. Assim, o caso precisaria ser submetido ao plenário. Se for aprovado por maioria simples, o processo é deflagrado". [Ou seja, está prontinho o roteiro caso Dilma não se submeta à tutela proposta, vendendo a alma definitivamente ao diabo: deputados partidários do impeachment pedirão uma definição ao Cunha, este negará alguns pedidos e os ditos cujos colocarão tal recusa para discussão no plenário. Aí, com a popularidade da Dilma na casa de um dígito, não é difícil adivinhar qual será a decisão dos parlamentares, sabendo que marcharem contra a corrente poderá ser-lhes fatal nas eleições futuras]

"Diante do avanço do movimento pró-impeachment no Congresso, Dilma Rousseff montou nos últimos dias uma 'força-tarefa' integrada por ministros de sua confiança para mapear os apoios de que o governo dispõe". [Ou seja, o próprio Palácio do Planalto, por via oblíqua, confirma que a batalha derradeira se aproxima.]


De resto, não me traz satisfação nenhuma vir há bom tempo acertando todas as minhas previsões. Mas, tenho a sensação de dever cumprido. Como jornalista, informei muito bem meu público, ao contrário dos que passaram o tempo todo teclando wishful thinking.

E como revolucionário, há cerca de um ano venho apontando às forças de esquerda os erros que cometiam e sugerindo opções:
A posse do Levy: começo do fim para Dilma.

  • não desconstruir Marina Silva, deixando para ela o mico de impor o arrocho fiscal;

  • trocar a candidatura da Dilma pela do Lula, porque ela claramente não estava à altura do quadro dramático que se delineava para 2015;

  • a articulação de um governo de união nacional ou a montagem de um gabinete de crise quando a economia começou a desandar no início do ano, pois assim dividiria com a oposição a responsabilidade pela degringola econômica e pelos remédios amargos;

  • quando a derrubada de Dilma passou a despontar como inevitável, a convocação um plebiscito sobre o ajuste fiscal, prevendo a renúncia dela caso o povo dissesse não (seria uma saída mais altaneira e digna, à maneira do De Gaulle);

  • reassumir as bandeiras de esquerda, para ao menos cair pelas razões certas e não por ter pretendido governar com a direita mas não a haver conseguido satisfazer:

  • renunciar antes de ser impedida, para o triunfo da direita não se tornar mais triunfal ainda.


E, claro, passei todo o tempo pedindo a cabeça do Joaquim Levy, o cavalo de Troia que preparou o caminho para a pior derrota da esquerda brasileira desde 1964.

Moral da História: nem sempre os que ousam dizer verdades inconvenientes querem o mal de alguém; nem sempre os que só afagam lhe fazem algum bem.

"Metida tenho a mão na consciência / e só falo verdades puras / que me foram ditadas pela viva experiência" --disse Camões. E digo eu.