Segunda, 17 de outubro de 2016
Do IHU — Instituto Humanitas Unisinos
Por: Patricia Fachin
“A primeira questão a constatar é que existe, sim, um problema fiscal
financeiro; nós não podemos iludir e omitir a existência desse
problema”, pontua o economista Guilherme Delgado à IHU On-Line,
na entrevista a seguir, concedida por telefone. Apesar disso, adverte,
“para enfrentar esse problema das chamadas contas públicas, não
deveríamos seguir o caminho adotado pelo governo, porque esse caminho,
além de não resolver o problema, o agrava”.
Crítico à Proposta de Emenda Constitucional - PEC 241,
que sugere a instituição de um novo regime fiscal para as próximas duas
décadas, Delgado explica que essa proposta é “bastante danosa, porque
não é uma política fiscal de curto prazo”, ao contrário, “é uma política estrutural
que muda a Constituição na sua substância”. Essa alteração na
Constituição, afirma, mudará “o artigo 5º, que trata dos direitos
individuais e coletivos” e alterará “o artigo 6º, que declara os
direitos sociais”.
Na avaliação do economista, existem alternativas à PEC 241. Entre elas, menciona a “limitação do gasto financeiro”, uma reforma tributária que taxe os rentistas e a taxação das commodities, como faz a Argentina. “No Brasil se criou a tese de que commodities são insuscetíveis de taxação pela invenção da Lei Kandir. Ao contrário, commodities podem e devem ser tributadas. Aliás, o Brasil cresceu, do ponto de vista industrial, pela taxação da commodity café.
A não tributação de commodities e a não tributação de dividendos
retiram do orçamento público uma fatia extremamente alta de recursos que
poderiam ser destinados a outras áreas”.
Segundo ele, dados do estudo “Austeridade e Retrocesso”
estimam que “há uma evasão fiscal na faixa de R$ 50 bilhões ao ano em
relação aos dividendos não tributados”. A partir dessa estimativa,
aconselha: “No momento em que existem necessidades crescentes e
exigências para produzir um certo ajuste fiscal, é
preciso buscar alternativas onde se tem o mínimo de capacidade
contributiva e de equidade fiscal, porque ajuste fiscal, para merecer o
título de ajuste, tem que ter uma ideia de justiça, e não se pode
inverter o princípio da justiça distributiva e produzir mais
desigualdade”.
Guilherme Delgado | Foto: Agência Senado
Guilherme Delgado
é doutor em Economia pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp.
Trabalhou durante 31 anos no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada –
Ipea.
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Como vê a proposta do governo de instituir uma meta de teto de gastos públicos para os próximos 20 anos?
Guilherme Delgado – Essa PEC,
com esse prazo de 20 anos e no mínimo 10 anos para a primeira revisão,
parece mais uma lei ou norma “para inglês ver”, no sentido de dar uma
sinalização para o mercado. Evidentemente isso tem consequências
diretas, porque já se começa a elaborar o orçamento de 2017, uma vez promulgada a PEC, considerando o ano fiscal de 2018.
Do ponto de vista imediato, a PEC não afeta, substancialmente, o baixo
aporte de recursos que estão sendo praticados nos orçamentos dos dois,
três últimos anos fiscais. Agora, para um prazo mais longo, de 20 anos,
ela seria completamente desastrosa. Por isso digo que parece mais uma
coisa “para inglês ver” porque, a menos que se mantenha o clima de
pensamento único, de certo terrorismo ideológico que vigora no presente,
ninguém poderá obrigar os futuros congressistas e os futuros
governantes a seguirem essa PEC. Eles simplesmente podem mudá-la
alegando que ela estaria engessando completamente a administração.
Se era para fazer uma política de curto prazo, como a política fiscal e a política monetária, bastava uma lei orçamentária ou uma revisão da lei de diretrizes orçamentárias
estabelecendo, por um período conjuntural, restrições. Seria muito mais
factível crer na eficácia de uma lei desse tipo, independentemente de
se estar ou não de acordo com essa doutrina subjacente. Fazer uma PEC
em 20 anos, mantendo o regime fiscal restritivo para todo o gasto
público, exceto o gasto financeiro, é uma coisa que não tem o menor
sentido e não tem condições de se manter, principalmente se a economia
se recuperar, o que, supostamente, deveria ser o objetivo da PEC.
Se a economia se recuperar, o produto interno começará a crescer, a
arrecadação começará a crescer e, obviamente, todos os constrangimentos
criados pelos dois, três ou quatro anos de recessão
profunda terão que ser corrigidos: infraestruturas precisarão ser
recuperadas, serviços sociais precisarão ser providos, enfim, tudo o que
tem a ver com serviços estatais precisará ser provido. E não é de bom
senso — não é nem questão doutrinária — que se constranja o crescimento,
supostamente já em processo de recuperação, por uma ideia que foi
concebida no auge mais profundo da recessão para dar recado ao sistema financeiro, no sentido de dizer que estamos reservando dinheiro para pagar o serviço da dívida pública, que está sendo inflado pelas próprias condições de administração da crise, dos juros etc.
O país irá desaparecer do ponto de vista da prestação de serviços públicos
Vejo essa PEC neste sentido: é um recado de curto
prazo, dado com uma linhagem de longo prazo, porém essa linhagem não faz
o menor sentido do ponto de vista do bom senso de qualquer cidadão
minimamente esclarecido, não é nem uma questão de teoria econômica. Vai
simplesmente constranger por 20 anos serviços de educação, serviços de saúde, previdência pública, defesa,
infraestrutura de bens públicos e relações externas, ou seja, o país
irá desaparecer do ponto de vista da prestação de serviços públicos,
mesmo que a economia volte a crescer — ou a PEC está sendo concebida
para manter o país estagnado? Bom, se é para manter o país estagnado,
também não vai ter condições de solver a despesa financeira, o que, no
fundo, é o objetivo da PEC. Raciocinando de qualquer perspectiva, não
tem sentido.
IHU On-Line - Muitas das críticas feitas à PEC afirmam que ela irá desmontar o serviço social brasileiro. Fazendo um balanço da proposta, quais são os pontos negativos que o senhor evidencia acerca dos seus impactos para as questões sociais?
IHU On-Line - Muitas das críticas feitas à PEC afirmam que ela irá desmontar o serviço social brasileiro. Fazendo um balanço da proposta, quais são os pontos negativos que o senhor evidencia acerca dos seus impactos para as questões sociais?
Guilherme Delgado – O ponto mais negativo é quando se estabelece o princípio de que o gasto primário
— que é todo o gasto público que não é financeiro, portanto, todos os
serviços de segurança, defesa, educação, saúde, infraestrutura, salário e
ordenados tanto da elite do funcionalismo público quanto da base —
ficará subordinado ao princípio do teto, que é a inflação do ano
anterior. Isso significa que no agregado o gasto primário só poderá
crescer pela inflação do ano anterior, mas não significa que qualquer
componente ou qualquer setor desse gasto primário tenha que obedecer a
esse critério. No entanto, para crescer mais tem que acontecer aquela
história do “cobertor”, ou seja, para cobrir mais um lado, se puxa o
cobertor do outro lado. O que é estabelecido com esse princípio? É
estabelecido o princípio da canibalização dos setores
ou dos atores mais fracos. Então, quem não tiver poder no Congresso para
apresentar emendas no orçamento, no sentido de elevar o gasto para sua
categoria ou seu setor, ficará constrangido ao nível mais embaixo; e
quem tiver cacife apresentará emendas e pegará o recurso do mais frágil.
Com isso se introduz o princípio da canibalização: os setores mais
frágeis serão canibalizados pelos potencialmente mais fortes na
representação congressual.
É claro que o Ministério Público, o Judiciário, as elites dos funcionários públicos, setores de infraestrutura para fazer obras públicas e provavelmente algumas prioridades necessárias na área da Defesa
consumirão recursos dos setores que não tiverem capacidade de se
defender dentro do teto do gasto primário. Evidentemente, fora do teto
tem o setor financeiro, que não tem teto nenhum, este cresce ou decresce
na forma que lhe aprouver. Então, a instituição da PEC 241 inverte o princípio do artigo 3º da Constituição,
que determina que a República tem a igualdade e a justiça por
finalidade. Nesse aspecto introduz o sentido invertido da justiça
distributiva. O objetivo da justiça distributiva de Norberto Bobbio
é: a lei deve tratar desigualmente os desiguais para promover a
igualdade; a PEC tem um princípio invertido: aos setores detentores de
títulos de riqueza financeira, todas as prioridades, aos demais, ou são
caudatários do primeiro ou vão brigar entre si. Logo, se produz o
princípio da desigualdade, trata desigualmente os desiguais, mas no sentido de promover a desigualdade, não de promover a igualdade.
Nesse sentido, a PEC 241 é bastante danosa, porque não é uma política fiscal de curto prazo, é uma política estrutural que muda a Constituição na sua substância. Se pensarmos bem, está se mudando o artigo 3º; está se mudando o artigo 5º, que trata dos direitos individuais e coletivos; está se alterando o artigo 6º,
que declara os direitos sociais; está se mudando a construção da
instrumentalidade para se produzir isso, que é o artigo que trata do orçamento da seguridade social;
e está se mudando praticamente todos os quarenta artigos da ordem
social, que são jogados no lixo. A ordem social se torna totalmente uma
tábula rasa, porque está prevalecendo o princípio de justiça econômica
ou de injustiça econômica, que consiste em promover a desigualdade.
IHU On-Line - Economistas do governo têm dito que, apesar da
PEC estipular um limite para os gastos públicos, as áreas de educação e
saúde estão protegidas, e que existe um valor mínimo a ser aplicado
nessas áreas, mas que os parlamentares podem aprovar orçamentos maiores
que esse mínimo para essas duas áreas. Nesses casos, a ampliação do
orçamento estará subordinada a essa disputa de poder, como está
mencionando?
Guilherme Delgado – Exatamente. Teoricamente se pode aprovar um orçamento maior para a saúde e para a educação
do que o teto do gasto primário, mas para isso será preciso tirar
recursos da Defesa, dos salários e ordenados do serviço público, da
Previdência e das demais áreas componentes do gasto primário. Na
Previdência tem uma pequena diferença, porque a PEC não é capaz de monitorar ou limitar os gastos previdenciários, por isso que o governo defende uma imediata reforma da Previdência,
porque o gasto previdenciário, diferentemente dos demais setores da
administração, é preponderantemente gasto com direitos antigos. Mas
voltando a sua pergunta, teoricamente se pode aumentar o gasto em saúde e educação em termos reais, mas esse gasto deve estar sempre limitado por esse “cobertor” pequeno do teto do gasto primário.
IHU On-Line – Vê possibilidade de aumentar os investimentos
em saúde e educação a partir de uma pressão da sociedade para que os
parlamentares aprovem orçamentos maiores ao longo dos anos?
Quando se retiram essas salvaguardas a priori, o jogo orçamentário é de quem tem mais poder de barganha no orçamento
Guilherme Delgado – Sim, mas por outro lado, o jogo orçamentário é um jogo de lobbies
e, portanto, as necessidades básicas dos setores mais carentes só são
atendidas quando há salvaguardas a priori, que são aquelas vinculações
orçamentárias determinadas. Quando se retiram essas salvaguardas, o jogo
orçamentário é de quem tem mais poder de barganha no orçamento. Ou
seja, aqueles que financiaram os deputados em suas campanhas vão tentar
ter alguma vantagem no jogo orçamentário. Não estou nem falando de
corrupção, mas isso é da mecânica do sistema. Isto é, os deputados
financiados pelo lobby das empreiteiras, do setor elétrico, do setor de
barragens etc. responderão, nesse momento, com emendas orçamentárias que
correspondam a obras para esses setores.
Evidentemente que os órfãos, as viúvas e os educandos que têm necessidades, sem a salvaguarda constitucional,
ficarão reféns. O jogo orçamentário é um pouco parecido com o jogo do
mercado: ganha mais quem tem mais poder econômico, ou seja, quem tem
mais poder político, cacifado pelo poder econômico. A PEC corta todas as salvaguardas de política social
do orçamento e deixa o jogo distributivo correr no limite — dentro do
limite do gasto primário — para aqueles que têm mais capacidade vocativa
e eletiva dentro do orçamento feito pelo Congresso.
Afora isso, existe um orçamento que não é feito pelo Congresso, que é o orçamento financeiro. Por exemplo, quando o Congresso recebe o orçamento da União, uma parte desse orçamento corresponde à despesa financeira, que é elaborada pelo Banco Central em colaboração com a Secretaria do Tesouro, e esse orçamento é insuscetível de emenda. A PEC 241,
nesse sentido, também exclui o gasto financeiro de qualquer limite,
mas, teoricamente, mesmo não podendo emendar o gasto financeiro que vem
do Banco Central, o Congresso poderia aprovar uma lei nova estabelecendo
limites para a dívida pública — isso é da natureza de qualquer Congresso do mundo. Mas com essa PEC, essa proposta não é permitida e o gasto financeiro
é insuscetível de ser regulado no período dessa lei, porque o gasto
financeiro não está submetido a qualquer limite. Quem está submetido a
limite é o gasto primário, que passa a ser caudatário do gasto
financeiro com todas as letras, sem nenhum constrangimento; esse é o
espírito da PEC.
Somente nos dois últimos exercícios fiscais o gasto primário produziu déficit
primário, porque até 2013 houve superávit primário em todos os anos. A
partir de 2014, há um pequeno déficit primário, e em 2015 e 2016 houve
um déficit primário em torno de 10% do total do déficit nominal. Nesses
dois últimos anos, 90% do déficit é financeiro; dos dez pontos
percentuais do déficit total, praticamente nove pontos percentuais são
déficit financeiro. Então, como é que fica se o grande vilão do déficit
público é a despesa financeira e não há nenhum limite estabelecido em
lei para essa performance?
IHU On-Line – Na sua avaliação, apesar das críticas feitas à PEC, neste momento está posta uma discussão sobre qual deve ser a dinâmica do gasto público? O gasto tem que ser nos limites da arrecadação, maior que a arrecadação, menor que a arrecadação? Déficit nas contas públicas é ou não um problema, ou a partir de que momento passa a se tornar um problema? O que seria um arranjo adequado para resolver questões desse tipo?
IHU On-Line – Na sua avaliação, apesar das críticas feitas à PEC, neste momento está posta uma discussão sobre qual deve ser a dinâmica do gasto público? O gasto tem que ser nos limites da arrecadação, maior que a arrecadação, menor que a arrecadação? Déficit nas contas públicas é ou não um problema, ou a partir de que momento passa a se tornar um problema? O que seria um arranjo adequado para resolver questões desse tipo?
Guilherme Delgado – A primeira questão a constatar é
que existe, sim, um problema fiscal financeiro; nós não podemos iludir e
omitir a existência desse problema. Ele já vinha em potencial e
explodiu em 2015, quando a política fiscal foi ultraortodoxa
— como continua sendo — e isso passou a tornar o sistema muito mais
crítico. Apesar disso, o que estou dizendo é que para enfrentar esse
problema das chamadas contas públicas, não deveríamos seguir o caminho
adotado pelo governo, porque esse caminho, além de não resolver o
problema, o agrava.
Alternativa à PEC 241
Um caminho alternativo passa por algumas questões que estão
completamente interditadas na “engenharia oficial”. A primeira delas
passa pela limitação do gasto financeiro, ou seja, não se pode ter um Banco Central independente,
que esteja completamente fora de qualquer controle da sociedade e da
regulação pública. Portanto, é preciso acabar com a independência do
Banco Central no sentido de retirar da Constituição
aquele artigo que permite que o Banco Central elabore seu orçamento
financeiro, o qual é insuscetível de emenda pelo Congresso. Há carradas
de suspeitas de que esse artigo foi introduzido na Constituição sem
votação, “meio à galega”. Portanto, seria fundamental limitar essa
capacidade extrema do setor financeiro de estar acima do bem e do mal para produzir aquilo que lhe aprouver.
Em segundo lugar, alguns setores da ordem fiscal são verdadeiras
jabuticabas, e criou-se a tese de que esses setores não têm que ser
tributados. Por exemplo, eu e você pagamos Imposto de Renda de Pessoa Física de
até 27,5%, mas aqueles que recebem dividendos do capital, como os
acionistas, não pagam imposto. Isso gera uma soma apreciável de recursos
que poderiam ingressar no orçamento simplesmente por uma regra
tributária absolutamente legítima, que é adotada em toda parte do mundo,
com exceção do Brasil e da Estônia, que são as duas únicas jabuticabas do mundo que praticam esse tipo de isenção integral.
Em terceiro lugar, tem outro tributo, a taxação de commodities, que, na nossa vizinha Argentina, é a base da sua tributação. Mas no Brasil se criou a tese de que commodities são insuscetíveis de taxação pela invenção da Lei Kandir.
Ao contrário, commodities podem e devem ser tributadas. Aliás, o Brasil
cresceu, do ponto de vista industrial, pela taxação da commodity café. A
não tributação de commodities e a não tributação de dividendos retiram
do orçamento público uma fatia extremamente alta de recursos que
poderiam ser destinados a outras áreas.
O trabalho recente realizado pelo grupo chamado “Austeridade e Retrocesso” fez uma estimativa de que há uma evasão fiscal na faixa de R$ 50 bilhões ao ano em relação aos dividendos não tributados.
No momento em que existem necessidades crescentes e exigências para
produzir um certo ajuste fiscal, é preciso buscar alternativas onde se
tem o mínimo de capacidade contributiva e de equidade fiscal, porque
ajuste fiscal, para merecer o título de ajuste, tem que ter uma ideia de
justiça, e não se pode inverter o princípio da justiça distributiva e
produzir mais desigualdade.
A tributação no Brasil
é alta para a média e para os setores mais pobres, os assalariados, os
consumidores, mas não para os titulares de riqueza financeira e nem para
os recebedores diretos ou indiretos de renda fundiária; esses vão muito
bem, obrigado, e ainda exibem um pato no meio da rua para ironizar os
tolos. Nós somos muito tributados, mas eles não. Os empresários da Fiesp,
os empresários do setor financeiro e os titulares de renda e lucro não
são muito tributados, pelo contrário, são muito mal tributados.
IHU On-Line – Então, assim como outros economistas, o senhor
também aposta na reforma tributária como uma alternativa ao novo regime
fiscal?
E essa própria PEC, para ser minimamente coerente, teria que estabelecer critérios para limitar a expansão do gasto financeiro
Guilherme Delgado – Sim, uma reforma tributária, mas também uma reforma financeira, ou seja, se for feita uma reforma tributária, se limitaria a capacidade do sistema financeiro de criar dívida
e ônus financeiro novos. Isto é, com a recuperação fiscal, por via
tributária, acaba-se com o déficit primário. Agora, mesmo acabando com o
déficit primário, tem o processo de alimentação do déficit financeiro
produzido pelo próprio setor financeiro. Ou seja, na medida em que o
setor financeiro consegue nos impor uma taxa de juros entre
14% e 25%, quando o resto do mundo inteiro trabalha com taxas de juros
de 1% e 2%, nós estamos dando um “Bolsa Família” para os ricos do
sistema financeiro, como se fosse natural, normal. Portanto, nós temos
que limitar o gasto financeiro. E essa própria PEC,
para ser minimamente coerente, teria que estabelecer critérios para
limitar a expansão do gasto financeiro, mas ela não faz isso, ela deixa
isso a critério exclusivo do setor financeiro, que é quem controla o Banco Central.
Nós temos uma Lei de Responsabilidade Fiscal de mais de 20 anos, mas nunca tivemos uma lei de responsabilidade financeira:
o setor financeiro é irresponsável do ponto de vista fiscal e
monetário. Tudo o que ele faz é uma espécie de receituário de uma
liturgia insuscetível de questionamento, é como se fosse um setor
protegido por um dogma, o dogma da infalibilidade do setor financeiro.
Em uma sociedade democrática e republicana, isso não existe. Não existe
isso nos Estados Unidos, que é a pátria do capital e do dinheiro, não existe isso na Inglaterra, na Alemanha.
Será que não estamos sendo “muito lenientes”? Falamos tanto em
globalização e continuamos cultivando aqui jabuticabas perfeitas a
serviço de meia dúzia de potentados da riqueza financeira.
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