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(Millôr Fernandes)

domingo, 8 de novembro de 2020

As eleições dos EUA e as políticas mundiais que ainda permitem dominações coloniais de povos sobre outros. Povo Saharaui

 Domingo, 8 de novembro de 2020


Por Maninha, a Maria José. Ex-deputada distrital e federal, ex-secretária de Saúde o DF.

O mundo acompanha atentamente a eleição dos EUA. É evidente que os cenários que se visualizam tem importância para todos. Mas, não atentarmos para as políticas mundiais que ainda permitem a existência de dominações coloniais de povos sobre outros. É a situação do Saahara Ocidental, RASD, República Árabe Saharaui Democrática, última colônia africana, dominada pelo Marrocos. Esse povo resiste, cuja organização política, a Frente Polisário, organiza a resistência de homens, mulheres e crianças. Toda nossa solidariedade à sua luta. Divulguem, leiam os artigos e se solidarizem. Associação de Solidariedade à luta de autodeterminação do Povo Saharaui. Brasilia.

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POR UN SAHARA LIBRE.org – PUSL

Sahara Ocidental à beira da ruptura do cessar fogo




PUSL.— Secretariado da Frente Polisario emite Alerta Geral apelando à população que esteja mobilizada e vigilante

Ontem, 7 de novembro realizou-se uma reunião extraordinária do Secretariado Nacional da Frente Polisario que decidiu emitir uma declaração final na qual anuncia o estado de emergência e apela a todos os Saharauis para estarem no máximo grau de alerta e mobilizados para o que possa acontecer para todas as eventualidades.

Esta reunião realizou-se após mais de duas semanas de protestos e manifestações não violentas da população saharaui na brecha ilegal marroquina em El Guergarat e em vários pontos de passagem da MINURSO (Missão das Nações Unidas para o Referendo do Sahara Ocidental) ao longo do Muro militar de separação marroquino.

Os manifestantes civis, homens, mulheres e crianças exigem o fecho imediato da brecha ilegal que Marrocos abriu violando o acordo militar nº. 1 e que tem sido motivo de criticas por parte das Nações Unidas antes da tomada de posse de António Guterres como Secretário Geral.

Os saharauis desarmados têm exigido o fecho da brecha e a realização do Referendo que deveria ter sido realizado em 1991 e continuamente obstaculizado por Marrocos que apenas diz aceitar o plano de autonomia. Marrocos tem reforçado diariamente o contingente com tropas armadas presente na brecha ilegal onde também a MINURSO se encontra mas que tem estado em sintonia com o lado marroquino o que agravou ainda mais a indignação dos manifestantes. Em vários vídeos os manifestantes afirmaram que já não iriam dialogar mais com a MINURSO que se posiciona ao lado dos militares marroquinos e que tenta por persuadir os Saharauis à reabertura da brecha ilegal. Os veículos da MINURSO, que têm matrículas marroquinas apesar não se moverem em território marroquino legal, tem sido também causa de protestos constantes por parte dos Saharauis.

Enquanto que os saharauis desarmados apenas estão a gastar mantimentos e horas de utilização dos seus telefones, Marrocos está a perder milhões com o fecho da brecha e consequente bloqueio do tráfego tanto de mercadorias como de narcotráfico e Espanha, que continua a ser administrador de jure do território, tem já 8 barcos de pesca parados que actuam ilegalmente nas águas saharauis. A deslocação e reforço do contingente militar marroquino também tem aumentado os custos consideravelmente.

A declaração da Frente Polisario é clara:

“Depois de tomar conhecimento da presença de concentrações de tropas marroquinas durante os dois dias anteriores no confronto de civis saharauis indefesos que protestavam perante a brecha ilegal de Guergarat, à vista da Missão das Nações Unidas para o Referendo no Sahara Ocidental (MINURSO) , que não impediu que Marrocos continuasse com esta violação, o Secretariado Nacional da Frente Polisário, face a este perigoso desenvolvimento e com base na Lei Fundamental da Frente, em particular nos artigos 97, 98 e 99 e na Constituição da RASD , declara o estado de emergência e apela ao povo saharaui, através de todas as suas presenças, instituições do movimento e do Estado, a estar nos níveis mais elevados de vigilância e mobilização para fazer face a todas as eventualidades, liderada pela sua vanguarda, a Polisário Frente e seu exército heroico “,

“O lado saharaui, embora condene a continuação da ocupação por Marrocos de partes do território da República Saharaui, membro da União Africana, por um lado, e a sua persistência na tentativa de contornar o que assinou com a parte saharaui sob os auspícios das Nações Unidas e da Organização da Unidade Africana / União Africana, por outro lado, responsabiliza o Reino de Marrocos pelo que possa resultar desta situação perigosa e agravante ”, acrescentou o comunicado.

“O status quo só pode ser superado com a submissão do Reino de Marrocos à legitimidade internacional e com a capacitação do povo saharaui de exercer o seu direito inalienável à autodeterminação, independência e soberania sobre todo o seu território nacional”, concluiu o comunicado.

António Guterres decidiu mudar a terminologia dos seus antecessores e passou a aceitar a brecha ilegal como um facto adquirido, chamando-lhe rota de tráfico de mercadorias e pessoas no seu ultimo relatório ao Conselho de Segurança das Nações Unidas.

O relatório do Secretário Geral que foi do agrado dos Marroquinos não reflectiu no mínimo a situação vivida pela população saharaui nos territórios ocupados mostrando um desconhecimento absoluto tanto das graves violações de direitos humanos, como do saque ilegal dos recursos naturais e ignora a abertura de consulados ilegais perante a lei internacional e que constituem também eles uma violação ao acordo militar nº1 e do acordo de cessar fogo assim como do acto constitutivo da União Africana.

A resolução 2548/2020 posteriormente aprovada pelo Conselho de Segurança a 30 de Outubro, repetiu quase palavra por palavra o relatório do Secretário General da ONU repetindo inclusive a caracterização da situação no terreno como “situação calma”.

Tanto o relatório do Secretário Geral como a resolução do Conselho do Segurança foram a gota de água que fez transbordar a paciência dos Saharauis.

O relatório e o silenciamento das graves violações e dos protestos na Brecha ilegal apenas evidenciam a necessidade urgente da inclusão de um mandato de direitos humanos na MINURSO e confirma a avaliação da população saharaui que caracteriza a MINURSO como amigos de Marrocos, turista e inúteis.

Ao longo dos anos a MINURSO em várias ocasiões chamou as forças de ocupação para lhes entregar manifestantes pacíficos saharauis que tentavam ou entregar-lhes uma carta ou protestavam exigindo a realização do referendo junto de instalações da missão de “paz”. Esta “entrega” de saharauis às forças de ocupação é feita com o pleno conhecimento de que serão torturados e encarcerados. (ver artigo https://porunsaharalibre.org/2020/10/25/ali-saadoni-a-vida-de-um-ativista-saharaui-no-sahara-ocidental-ocupado/?lang=pt-pt)

Hoje que se perfaz 10 anos desde o desmantelamento de Gdeim Izik, temos que referir que os membros do Conselho parecem carecer de informações sobre a situação dos presos políticos e especialmente do grupo Gdeim Izik que têm recebido medidas provisórias, decisões e opiniões dos mecanismos de direitos humanos emitidos e não respeitados até o momento pelo Reino de Marrocos que continua a torturar os presos políticos,

Tanto a Federação Russa, membro permanente do Conselho de Segurança como a África do Sul denunciaram a forma pouco democrática como se realizaram as “discussões” sobre o Sahara Ocidental e a elaboração do relatório final que não teve em conta as alterações propostas pelos membros do CS. O chamado “grupo de amigos” que foi instaurado junto do CS e que é composto por EUA que o redactor, França, Espanha e Reino Unido é quem de facto elabora as resoluções.

Na sua declaração de voto, a África do Sul criticou os métodos de trabalho lembrando que “tem levantado consistentemente a sua preocupação de que o “ processo de negociação ”do projecto de resolução, através do Grupo de Amigos, continue a ser um obstáculo para fazer progressos no dossier do Sahara Ocidental e mina os métodos de trabalho do Conselho. ”

A África do Sul revelou que geralmente “um texto preliminar é apresentado aos membros do Conselho, que têm de aceitá-lo como facto consumado, apesar do facto de a maioria de nós ter sido eleita para servir no Conselho de Segurança e ter a responsabilidade de se envolver em todos os assuntos sobre a agenda do Conselho. ”

A Federação Russa enfatizou na sua declaração de voto que “nos últimos anos, as resoluções sobre a renovação do mandato da MINURSO receberam emendas que, na nossa opinião, afetam a abordagem imparcial e sem preconceitos do Conselho de Segurança para a questão do Sahara Ocidental.”

Explicou ainda que o projeto de resolução teve um “processo de elaboração não foi transparente nem consultivo” argumentando que “nenhuma das nossas considerações de princípio e bem fundamentadas, incluindo aquelas de natureza de compromisso, para as quais chamamos repetidamente a atenção do lado americano, foi levada em consideração. Toda uma gama de propostas práticas articuladas por outros membros do Conselho também ficou sem resposta.”

Como resultado, sublinhou a Rússia, “o texto permanece desequilibrado. Tudo isto vem somar-se às dúvidas sobre os acordos relativos à redacção informal dos ficheiros dos países no Conselho de Segurança” e lembrou que “nos últimos anos, as resoluções sobre a renovação do mandato da MINURSO receberam emendas que, na nossa opinião, afectam a abordagem imparcial e sem preconceitos do Conselho de Segurança na questão do Sahara Ocidental.”

E terminam a declaração alertando para que, “a substituição dos princípios fundamentais da solução do Sahara Ocidental por observações gerais sobre a necessidade de se “colar” a abordagens realistas e buscar compromissos produz ambiguidade, mina a confiança no nosso trabalho e obscurece as perspectivas de retomada do processo político.– a tentativa de impulsionar o processo de paz usando uma linguagem que confunde os parâmetros previamente acordados do plano de paz do Sahara Ocidental traz o resultado oposto. Não tínhamos concordado com essa alteração antes e não fomos capazes de apoiá-la hoje.”

O posicionamento de Guterres e do CS devido aos EUA e à França tem levado a um contínuo apoio à ocupação através da inacção desde 1991 das Nações Unidas o que tem permitido a Marrocos alterar a demografia do território ocupado com a introdução de centenas de milhares de colonos, o empobrecimento forçado dos saharauis, o roubo diário dos recursos naturais saharauis e violação atrás violação dos direitos humanos com sequestros, violações, invasões de casas e destruição de propriedade, erradicação cultural saharaui, detenções arbitrárias, torturas. Todas estas violações estão bem documentadas e condenadas tendo sido alvo de decisões jurídicas a nível internacional (TJUE, Tribunal Supremo da África do Sul e outros) no caso dos recursos naturais e de medidas de provisórias, opiniões e decisões dos mecanismos dos direitos humanos das próprias Nações Unidas.

A Frente Polisário tem advertido vezes sem conta que se não houvesse acções concretas e práticas no terreno estaria obrigada a reavaliar o processo político em curso. Na verdade o processo político em curso, leia-se negociações entre as partes com enviados pessoais, e o que se chama de medidas de confiança que não passa de um programa de reencontro de meia dúzia de famílias que estão separadas pelo muro, está longe de ser um processo que tenha como objectivo fazer cumprir o acordo de cessar-fogo acordado entre as partes e que Marrocos se recusa a honrar.

Na imprensa internacional muitas vezes, e de forma equívoca, é afirmado que o referendo não é posto em prática devido a diferendos sobre quem pode votar e a realização do censo da população saharaui. Na verdade, a Frente Polisário chegou a propor inclusivamente a participação na votação dos colonos marroquinos nos territórios ocupados, proposta essa que foi recusada por Marrocos. Marrocos apenas aceita um suposto plano de autonomia, mas não quer que o povo saharaui se pronuncie. A proposta de autonomia seria uma das preguntas no referendo, mas Marrocos sabe que a população saharaui quer a saída imediata de Marrocos do seu território que ocupa de forma ilegal e violenta desde 1975.

A Frente Polisário não é separatista porque não se poder separar algo que nunca esteve junto, é um Movimento de Libertação Nacional de um país que tem grande parte do seu território sob ocupação militar marroquina após a invasão de 1975.

Marrocos não tem quaisquer laços de soberania como foi mencionado na decisão do Tribunal Internacional em outubro de 1975, dias após esta decisão ser pública Marrocos invade o território.

Estes factos não podem ser alterados, estes factos e as mais de 60 resoluções dão toda a legitimidade à Frente Polisário a defender a sua pátria e a sua população.

Desde 1991 que a Frente Polisario e a população saharauis respeita o acordo de cessar fogo e aguarda a realização do Referendo, quanto tempo mais deveria esperar enquanto vê o seu país a ser explorado, os saharauis a serem dizimados e torturados?

A paciência dos Saharauis chegou ao fim, a comunidade Internacional e as Nações Unidas em particular tiveram a oportunidade de solucionar este conflicto de forma não violenta mas parece que não estão interessados nela.

Os saharauis têm o apoio de países como a Argélia, a África do Sul, a Namíbia, Zimbabwe, Nigéria, Tanzânia, Angola, Moçambique, Timor-Leste, Cuba, Bolívia,  e muitos outros que vezes sem conta alertam para o impasse nas Nações Unidas.

A Argélia aprovou emendas constitucionais no passado 1 de Novembro quando os artigos 28 e 29 da constituição foram alterados para permitir operações transfronteiriças com a aprovação de dois terços de seu parlamento e sob a supervisão da Liga Árabe, da União Africana e das Nações Unidas .

Perante este cenário aguarda-se a reacção das Nações Unidas e da União Africana que podem evitar mais um conflicto sangrento que irá afectar toda a zona do Sahel.

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