Segunda, 11 de abril de 2016
Da Auditoria Cidadã da Dívida
Maria Lucia Fattorelli*
Importantes setores da sociedade civil e entidades representantes de
trabalhadores têm levantado a voz contra o PLP 257/2016, por seu intenso
ataque à estrutura de Estado: referido projeto impõe rigoroso ajuste
fiscal que inclui exigência de privatizações, reforma da previdência nos
estados, congelamento de salários e corte de dezenas de direitos
sociais.
Visando contar com o apoio de entes federados para a rápida aprovação
desse indesejável ato, o governo federal incluiu no projeto um alívio
para os atuais governadores, por meio se alongamento para o pagamento
das questionáveis dívidas públicas dos respectivos estados que, se
fossem submetidas a uma auditoria, estariam fadadas a anulação[2].
O que ainda não está sendo devidamente denunciado é mais um par de aberrações incluídas no referido PLP 257/2016:
1) Transformação da União em uma seguradora internacional para investimentos de empresas nacionais ou multinacionais no exterior:
Segundo consta do referido projeto 257, a União poderá dar garantias
financeiras, sem a necessidade de detalhar “a relação custo benefício e o
interesse econômico-social da operação”, a “entidades privadas
nacionais e estrangeiras, Estados estrangeiros, agências oficiais de
crédito à exportação e organismos financeiros multilaterais quanto às
operações de garantia de crédito à exportação, de seguro de crédito à
exportação, e de seguro de investimento, hipóteses nas quais a União
está autorizada a efetuar o pagamento de indenizações de acordo com o
cronograma de pagamento da operação coberta.”
Essa injustificada benesse está incluída no art. 14 do PLP 257, na
parte em que altera o art. 40 da Lei de Responsabilidade Fiscal.
2) Garantia de remuneração da sobra de caixa de bancos:
Tal benesse está colocada de forma muito sutil no art. 16 do PLP 257.
Mediante simples alteração da Lei 4.595/64, o Banco Central (BC)
poderá efetuar “o recebimento de depósitos remunerados”, que, na
prática, significa a garantia de remuneração de toda a sobra de caixa
que os bancos poderão simplesmente depositar no BC e, sem risco algum,
receber a remuneração desejada.
Essa medida vem justamente no momento em que aumentam as denúncias
sobre as chamadas “operações compromissadas” realizadas pelo BC sob a
justificativa de controlar a inflação. O BC retira do sistema financeiro
o que considera excesso de moeda[3], trocando referido excesso por
títulos da dívida pública que pagam os juros mais elevados do planeta!
Tal operação não tem sido suficiente para controlar a inflação e, na
prática, garante a remuneração de toda a sobra de caixa dos bancos,
provocando graves danos à economia nacional, na medida em que:
– gera dívida pública sem contrapartida alguma;
– gera obrigação de pagamento de juros aos bancos;
– acirra a elevação das taxas de juros de mercado, pois enxuga cerca de um trilhão de reais dos bancos, instituindo cenário de profunda escassez de recursos, afetando fortemente a indústria, o comércio e todas as pessoas que recorrem a crédito bancário;
– empurra o País para uma profunda crise socioeconômica, devido à exigência de pagamento de elevados juros sobre cerca de R$ 1 trilhão.
A alteração trazida pelo PLP 257 dispensa a emissão de títulos da
dívida pública para que o Banco Central continue remunerando a sobra de
caixa dos bancos. Dessa forma, mantém todos os mesmos graves danos à
economia nacional que as tais “operações compromissadas”.
Essas duas aberrações que beneficiam bancos e grandes empresas
nacionais e estrangeiras que investem no exterior, representam um
verdadeiro assalto aos cofres públicos, e constituem uma verdadeira
infâmia, pois estão colocadas no mesmo projeto que subtrai dezenas de
direitos de trabalhadores e leva ao sucateamento diversos serviços
públicos essenciais à sociedade.
Diante disso, além do repúdio ao ataque aos servidores e à sociedade
perpetrado pelo PLP 257/2016, devem ser também repudiados os
dispositivos do referido projeto que alteram o art. 40 da LRF e o art.
10, inciso XII, da Lei 4.595/64, pois tais dispositivos transformam a
União em seguradora internacional para investidores e garante
remuneração da sobra de caixa de bancos.
[1] Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida.
[2] FATTORELLI, Maria Lucia. Auditoria Cidadã da Dívida dos Estados (2013). Inove Editora, Brasília
[3] O BC estabelece para o Brasil uma base monetária muito reduzida,
de apenas 5% do PIB, e considera que todo volume de moeda que supera
esse reduzido patamar deve ser “enxugada” e esterilizada no BC, a fim de
evitar inflação. Cabe ressaltar que em países onde bancos centrais
agiram em favor das finanças nacionais, irrigaram as economias com moeda
e estabilizaram as taxas de juros, emprestando a seus respectivos
governos a taxas baixas (2% ao ano ou até menos), a crise tem sido
controlada. É o caso dos Estados Unidos, do Reino Unido e do Japão, onde
a base monetária ‒ que corresponde ao volume de moeda em circulação no
país ‒ alcança 40%! Mais informações em