Terça, 1º de abril de 2014
O deputado André Vargas
atuava como espécie de lobista do doleiro Alberto Youssef, “exercendo
influência” no governo, de acordo com relatório da PF
Robson Bonin, de Brasília
Da Revista Veja
LAÇOS – O deputado André Vargas (PT-PR), vice-presidente da Câmara, repetindo gesto dos mensaleiros presos
(Sergio Lima/Folhapress)
Nas conversas interceptadas pela Polícia Federal no âmbito da
Operação Lava Jato, o doleiro Alberto Youssef e o vice-presidente da
Câmara, André Vargas, demonstram ter muito mais do que uma relação de
amizade. Em quase cinquenta mensagens registradas pela PF, Vargas recebe
orientações do doleiro, combina reuniões com Youssef e chega a passar
informações das conversas que ele, como parlamentar do PT, mantinha com
integrantes do governo. Como é natural nesses diálogos nem sempre
edificantes flagrados pela polícia, Vargas e Youssef adotam a precaução
de conversar em códigos. Para Polícia Federal, no entanto, os registros
colhidos na operação mostram que Vargas faz parte de projetos de Youssef
e usa sua influência no governo em benefício do parceiro.
Nas mensagens obtidas pela polícia, Vargas e Youssef tratam de
interesses do laboratório Labogen Química Fina e Biotecnologia no
Ministério da Saúde. Como VEJA revelou há duas semanas, a Labogen é uma
das empresas do esquema do doleiro. A Polícia Federal já descobriu que a
empresa – que está no nome de um laranja de Youssef e é tudo menos um
laboratório farmacêutico – já havia conseguido fechar uma parceria com o
Ministério da Saúde pela qual receberia 150 milhões de reais em vendas
de remédios para o governo. No dia 26 de fevereiro deste ano, Vargas
escreve para Yousseff: “Reunião com Gadelha foi boa demais... Ele
garantiu que vai nos ajudar, que sabe da importância, e encaminhou
reunião decisiva dia 18, mas pediu que entregássemos os medicamentos da
primeira PDP (Parceria para o Desenvolvimento Produtivo) e concluíssemos
Anvisa, boas práticas aqui em BSB”. O doleiro elogia o empenho de
Vargas: “Que bom. Parabéns.” E diz que já estão prontos para a Anvisa.
“Muito bom”, finaliza Vargas.
Para a Polícia Federal os termos da conversa não deixam dúvidas: “Os
indícios presentes nesta conversa apontam que o interlocutor não
identificado (André Vargas) faz parte do projeto da Labogen junto ao
Ministério da Saúde, e possivelmente atua exercendo influência junto aos
responsáveis pela contratação do governo.” Falando sempre em códigos,
André Vargas e o doleiro falam da necessidade de marcar uma reunião com
um interlocutor identificado por Vargas pelas iniciais “PP”. Aparece na
conversa também o nome de um certo “Marcos”.
No dia 7 de março, outra conversa chama atenção dos investigadores. Até
então, os agentes da Polícia Federal consideravam a possibilidade de
André Vargas ser apenas um homônimo do vice-presidente da Câmara. As
evidências de que se trata mesmo do deputado federal petista aparecem
quando o próprio Vargas combina um encontro com Youssef: “Quer fazer eu,
você e Marcos segunda de noite em Brasília (sic)?”, pergunta o doleiro.
“Tenho reunião com deputados. PP falou de fazermos na quinta”, responde
André Vargas. “A partir dessa afirmação, ficam contundentes os indícios
de que o interlocutor possui contatos no Congresso, pois tem marcada
uma reunião com deputados, provavelmente em Brasília”, registra a PF no
relatório.
Ainda segundo a PF, as negociações entre André Vargas e o doleiro no
Ministério da Saúde eram realizadas a partir do secretário de Ciência,
Tecnologia e Insumos Estratégicos do ministério, Carlos Augusto Grabois
Gadelha, e de Eduardo Jorge Valadares, diretor do Departamento do
Complexo Industrial e Inovação em Saúde da Secretaria de Ciência,
Tecnologia e Insumos Estratégicos, órgão do Ministério da Saúde. Além
dos servidores, o próprio ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha,
atualmente pré-candidato petista ao governo de São Paulo, é citado
nominalmente no inquérito da Polícia Federal justamente por ter assinado
o contrato com o laboratório do doleiro.
Ao jornal Folha de S.Paulo, que revelou parte das conversas
hoje, Vargas negou qualquer contato com os servidores citados pela
Polícia Federal. Na semana passada, porém, o vice-presidente da Câmara
também negava ter participado de qualquer reunião com o doleiro em
Brasília ou intermediado qualquer interesse de Youssef. “Eu só
conversava com o Youssef em Londrina, no aeroporto ou num posto de
gasolina. Como eu sou um cara que tenho muita influência no partido do
governo, ele queria saber o que estava acontecendo na política, na
economia. Ele queria saber dos cenários econômicos, políticos e eu só
dava os meus pitacos”, disse Vargas. Com o lobby e as reuniões de Vargas
em favor do doleiro escancaradas, tem-se agora a demonstração do que
pode estar por trás de um simples “pitaco”.