Por Celso Lungaretti
Cálculos mesquinhos e falta de grandeza de parte a parte deverão
causar sofrimentos terríveis ao povo brasileiro em 2016 e sabe-se lá até mais
quando.
De um lado temos um governo totalmente sem propostas, semeando
ilusões como a de que ainda se possa fazer ajuste fiscal sem grandes
sacrifícios, quando até as pedras da rua sabem que eles serão imensos e resta
decidirmos quem pagará a parte maior da conta, se os explorados e excluídos ou
os exploradores e parasitas. Joaquim Levy ia na primeira direção e nada do que
foi dito nos últimos dias indica intenção de confrontar os ricaços.
A presidente está exaurida e desmoralizada, praticamente já não
governa e só obstina-se em não ser derrubada, mesmo que para tanto recorra às
práticas mais constrangedoras da politicalha fisiológica e arraste para a
avacalhação total os outros poderes da República.
Do outro lado encontramos uma oposição que, discurseira à parte,
está mais para outra face da mesma moeda, os antigos opostos convergiram para a
mesmíssima geleia geral ou para o mesmo saco de farinha, descaracterizados e
cínicos. E só não dá o xeque-mate no governo agonizante porque está preocupada
demais com os ganhos que obterá no day after.
Se esquecesse o impeachment e centrasse fogo na cassação da
chapa presidencial pela Justiça Eleitoral, uniria o Brasil e criaria uma onda
irresistível em favor da mudança.
O eleitorado está ciente de que foi feito de otário no pior
estelionato eleitoral da democracia brasileira em todos os tempos. Detesta
Dilma, adoraria vê-la pelas costas, mas desconfia muito de Temer. Com inteira
razão, nos dois casos.
Então, a melhor solução para virarmos está página deplorável da
nossa História e termos uma chance de começar sair da recessão em 2017 (o ano
que vem está além de qualquer possibilidade plausível de salvação, lamento!) é
uma nova eleição.
Na qual o PT, tendo Lula como provável candidato, ficaria
sabendo se o povo ainda o quer ou se está se mantendo no poder não mais como
representante do Brasil pujante, mas parasitando os grotões do atraso, como
fazia a ditadura militar em seus estertores.
Na qual o PSDB teria a sonhada chance de voltar ao poder e
herdar... a inglória tarefa de ajustar as contas públicas, conforme exige o
poder econômico. Tudo leva a crer que, assim procedendo, chegaria tão
desgastado a 2018 como Dilma está agora. Com tendência a não voltar a ganhar
eleições presidenciais por um bom tempo, como deverá acontecer doravante com o
PT.
Na qual a Marina poderia fazer campanha sem ser falsamente
acusada de cumplicidade com banqueiros, pois a promiscuidade de Dilma com Luís
Carlos Trabuco, o presidente do Bradesco, foi simplesmente pornográfica para
qualquer esquerdista. Se tiverem o mínimo de simancol, os
propagandistas do PT doravante não voltarão a bater nessa tecla, nem com
Marina, nem com ninguém...
Na qual, e isto é o mais importante, as políticas de direita
tenderiam a ser defendidas pela direita, enquanto a esquerda teria de
reassumir-se como esquerda, até por uma questão de sobrevivência.
Nós, os revolucionários, temos de reaprender a dar o justo peso
à política oficial:deter a Presidência da República na democracia burguesa para
nós tem, eventualmente, utilidade tática, mas não é, nem de longe, nosso
objetivo estratégico.
Se serve para alavancar a revolução, vale, sim, a pena obtê-la e
tentar conservá-la. Mas, só enquanto nos estiver sendo útil.
Se, pelo contrário, nos atrapalha em nossos objetivos maiores e
coloca o povo contra nós, como está acontecendo neste instante, devemos abrir
mão dela sem nenhum remorso, recuando para nos reagrupar. O velho um
passo atrás para poder dar dois adiante do Lênin.
Precisamos, isto sim, do povo, cuja emancipação é nossa razão de
ser. Podemos tranquilamente sobreviver fora dos palácios do governo (e
respiraremos muito melhor longe deles!).
Isto, claro, no caso dos que ainda colocamos a revolução acima
de tudo. Os que continuam usando nossa retórica mas estão aburguesados
--aqueles que se agarram com furor desmedido aos privilégios e boquinhas--
já passaram para o outro lado, tenham ou não autocrítica suficiente para
admitirem isto.