Terça, 29
de dezembro de 2015
“O lulismo foi um projeto de
rentabilização do grande capital e de manipulação e desorganização do movimento
social, para sua melhor e mais ampla e fácil exploração. Procedeu-se assalto ao
fundo de garantia dos trabalhadores, em prol do grande capital. Entregaram os
pensionistas ao cutelo do capital, com os créditos consignados. Permitiu-se
assalto jamais visto da população pelos bancos e financeiras. Degradou-se a
educação, a saúde, a segurança. A lista é praticamente sem fim”.
“O grande capital
pagou, e pagou bem, pelos serviços do senhor Lula da Silva.”
Do Correio da
Cidadania
Escrito
por Valéria Nader e Gabriel Brito, da Redação
2015 entrará na história como algo próximo de um ano que
não existiu, nos mais diversos âmbitos, marcado por variados e regulares
momentos de estupefação nacional. “Fim de ciclo” e “vazio político” foram
algumas das tentativas de definir todo o corolário de crises que se acumularam
e agora estouram, a ponto de tornar quase invisível qualquer horizonte próximo
de sua superação. Sobre esse complexo e desafiador momento histórico, o Correio
da Cidadania entrevistou o historiador Mario Maestri, que não poupou palavras
para descrever o momento e seus tristes protagonistas.
“A direita
tradicional entendeu que era o momento ideal de virar a página e se desfazer
dos administradores-delegados petistas, em prol de administração direta
conservadora. Não quer mais o muito que recebia - quer, agora, tudo, ainda mais
com a diminuição do bolo com a crise”, afirmou, a respeito da tensão em torno
do impeachment, que praticamente monopolizou as atenções políticas do ano.
“Rentabiliza
igualmente essa operação conservadora o fato de que o desgoverno, a corrupção,
a imoralidade pública etc., que petistas e associados praticaram, são
colocados, por grande parte da população, na conta da esquerda e de seu projeto
de reorganização do Brasil pelo mundo do trabalho. O PT prestou um imenso
serviço ao grande capital no governo, e presta um outro, também enorme, agora
que é empurrado para a sarjeta”, completou, a fim de ilustrar o tamanho da
derrota que o mundo do trabalho e das organizações populares vivenciam.
“Se o governo
estivesse sendo defenestrado pelos trabalhadores, assalariados e população de
bem, seria ato legal, a ser apoiado. Porém, a deposição é empreendida pela
direita tradicional, para radicalizar a exploração. É deposição política,
golpista, antipopular e antinacional. Ela também tem como objetivo aprofundar a
maré conservadora na América do Sul”, observou Maestri.
Além de lamentar a incapacidade organizativa e
aglutinadora que até agora paralisa qualquer resposta aos descalabros do
capitalismo, Maestri conecta a derrocada brasileira a todo o processo de
reorganização mundial a partir de 1989. Projetos e governos por todo o mundo
foram condicionados por esse processo, e agora se veem sem capacidade de
renovação, a não ser pelo lado de um rigoroso acirramento conservador.
“O lulismo foi um
projeto de rentabilização do grande capital e de manipulação e desorganização
do movimento social, para sua melhor e mais ampla e fácil exploração.
Procedeu-se assalto ao fundo de garantia dos trabalhadores, em prol do grande
capital. Entregaram os pensionistas ao cutelo do capital, com os créditos
consignados. Permitiu-se assalto jamais visto da população pelos bancos e
financeiras. Degradou-se a educação, a saúde, a segurança. A lista é
praticamente sem fim”.
Leia abaixo entrevista exclusiva.
Correio da Cidadania: Passamos o
ano debatendo e criticando governo “natimorto” nas palavras do sociólogo
Ricardo Antunes. Como você vê o primeiro ano do segundo mandato de Dilma
Rousseff, que termina sob o signo de instabilidade e chantagem que começou,
agora sob ameaça de impeachment?
Mario Maestri: Não tivemos governo “natimorto”.
Essa visão naturaliza a
deriva direitista quase incondicional da segunda administração Dilma Rousseff,
sugerindo que estava comprometida desde o início. O governo se liquidou por
decisão própria. Ele optou por abraçar o programa neoliberal e executar todas e
mais algumas maldades propostas pela direita tradicional que derrotou nas
eleições. Tudo na procura de estabilização conservadora
da nova administração, corroída pelos escândalos da Petrobrás e pelos desmandos
econômicos anteriores.
Correio da Cidadania: Mas qual
sentido teria essa virada?
Mario Maestri: A equipe dilmista quis propor que
seguia sendo a melhor administração para ferrar o mundo do trabalho e a
população brasileira. O que de certo modo se comprovou, ao avançar nesse último
ano importantes iniciativas antipopulares e antinacionais, sem maior
resistência. Pretendeu, também, estabelecer nova composição política, na qual a
burocracia petista perderia espaço para o conservadorismo, mantendo em parte o
anterior protagonismo. Desse projeto nasceu a lotização do primeiro ministério,
com o Levy, a Kátia Abreu et caterva.
Ao por fim às concessões pontuais e mediações petistas
tradicionais para com os segmentos populares e extremar o privilegiamento
tradicional do grande capital, a senhora Dilma Rousseff deu conscientemente as
costas aos trabalhadores, assalariados etc. que a elegeram. Sem pudor e rubor,
praticou espetáculo explícito de estelionato eleitoral jamais visto no Brasil,
rico nessas práticas. Lançou o programa e o que dissera pela janela e abraçou o
programa do candidato derrotado, em demonstração de inaudito desprezo pela
população do país. Em resposta, a população retirou o apoio ao governo.
Correio da Cidadania: E por que
não funcionou a manobra do atual governo? Por que não lhe concederam o apoio,
como antes?
Mario Maestri: A direita tradicional entendeu
que era o momento ideal de virar a página e se desfazer dos
administradores-delegados petistas, em prol de administração direta
conservadora. Não quer mais o muito que recebia - quer, agora, tudo, ainda mais
com a diminuição do bolo com a crise! Agora, Dilma Rousseff permanece sozinha,
com o núcleo duro da entourage
governista, praticamente sem apoio popular, a não ser dos aparatos
fantasmagóricos do movimento social, que sofrerão também com seu
defenestramento.
Rentabiliza igualmente essa operação conservadora o fato
de que o desgoverno, a corrupção, a imoralidade pública etc., que petistas e
associados praticaram, são colocados, por grande parte da população, na conta
da esquerda e de seu projeto de reorganização do Brasil pelo mundo do trabalho.
O PT prestou um imenso serviço ao grande capital no governo, e presta um outro,
também enorme, agora que é empurrado para a sarjeta.
Correio da Cidadania: O que pensa
das manifestações, protestos e palavras de ordem, à esquerda e à direita, que
correram país afora ao longo deste ano?
Mario Maestri: Em 2015, as únicas manifestações
políticas multitudinárias foram direitistas. Não tivemos manifestações
políticas de esquerda dignas de registro. Ouvimos uma voz de direita cada vez
mais estridente, incisiva e programática, e uma palavra da esquerda
crescentemente inaudível, desorganizada e confusa. Um fenômeno que, em geral,
não se restringiu ao Brasil. O avanço do conservadorismo é processo mundial,
com sobressaltos populares em alguns países, como na Grécia, em Portugal, nas repúblicas populares ucranianas e,
agora, talvez, na Espanha.
As terríveis sequelas ensejadas pela contrarrevolução
mundial de fins dos anos 1980 seguem e se aprofundam através do mundo. A revolução
pode também ser permanente, radicalizando-se e alcançando patamares superiores
à medida que ganha força e expande sua área de ação. É indiscutível a
barbarização do mundo, com níveis dantescos no Oriente Médio e norte da África.
Correio da Cidadania: Esse recuo
foi geral no Brasil? Ou conhecemos avanços, mesmo pontuais?
Mario Maestri: Não. No Brasil, movimentos como a
greve dos professores em São Paulo e no Paraná; dos estudantes secundários
paulistas, com a magnífica vitória que obtiveram; das mulheres contra o
programa misógino de Eduardo Cunha e do Congresso conservador-fundamentalista,
mostram que há profunda insatisfação, força e disposição de luta na população.
Porém, foram movimentos sobretudo sindicais, incapazes de se aglutinarem em
torno de um projeto político geral. Não se espraiaram para a população. Não
levantaram bandeiras gerais. Não aglutinaram forças. Segue uma imensa crise de
projeto, de programa e de direção política. A alternativa do mundo do trabalho
para a reorganização social perdeu credibilidade geral.
Correio da Cidadania: Continua o
mesmo quadro de fragmentação da esquerda interrompido por breves lampejos? O
que pensa das respostas e mobilizações que ela organizou em 2015?
Mario Maestri: Inicialmente, temos que
circunscrever o que hoje compõe a esquerda organizada, no relativo às direções
e militância ativa. Partidos como o PT e o PC do B já liquidaram há muito a
luta pela superação tática e estratégica da exploração capitalista. Hoje,
sequer são organizações socialdemocratas, no sentido tradicional europeu. A
definição social-liberal parece pertinente para descrevê-los sumariamente.
Correio da Cidadania: E
organizações de esquerda como o PSOL, o PSTU, o PCB e o movimento social? Qual
sua avaliação?
Mario Maestri: O PSOL, o maior grupo que se
reivindica da esquerda, com representação parlamentar, mantém-se encantado pela participação direta e
indireta no Estado. Perdeu qualquer sentido antissistema. PSTU merece análise
mais acurada. Nos anos 1960-80, tivemos organizações ultrarradicais maoístas, que atacavam
sem mediações os partidos comunistas, os Estados socialistas etc. A seguir,
literalmente desapareceram e, comumente, seus dirigentes abraçaram o
conservadorismo. O PSTU-LIT saudou como processos revolucionários o desastre
epocal que foi a destruição da URSS e dos Estados de economia nacionalizada.
Seguiu fazendo o mesmo na Líbia, Síria, Venezuela, Cuba etc. Agora, apoia o impeachment, sob a proposta fantasiosa
de que defende a derrubada do governo, nesse momento, junto com a direita
tradicional, e desta última, não se sabe por quem, não se sabe quando! É uma
esfera de colaboração da direção do PSTU-LIT muito ampla e de longa duração com
a contrarrevolução para se tratar de mero erro de análise política.
Correio da Cidadania: E quanto ao PCB, em seu projeto de reconstrução? E as organizações do movimento
social, não podem ser núcleo de direção?
Mario Maestri: O PCB é organização interessante
que, na minha opinião, fica neutralizado pela incapacidade de coadunar a herança
do passado com as necessidades do presente. Temos uma enorme quantidade de
organizações políticas minúsculas incapazes - e algumas delas sem vontade - de
superar o caráter grupuscular. Os movimentos sociais, que, no passado,
ensaiaram levantar-se como alternativa, como a CUT, MST etc., foram engolidos
pelo voltex da
colaboração-participação-administração do Estado de classe.
No Brasil, não possuímos núcleo de esquerda minimamente
audível, com projeto de reorganização e reagrupação programática do movimento
social. Realidade que nasce, sobretudo, da debilidade política histórica do
mundo do trabalho no nosso país, exacerbado nas últimas décadas. Creio que
apenas uma grande vitória do mundo do trabalho no Brasil ou no mundo ensejaria
as melhores condições para superar essa difícil realidade. A derrota na Grécia
pesou terrivelmente.
Correio da Cidadania: Podemos
esperar algo das novas propostas de organização política, geralmente chamadas
apartidárias e horizontais?
Mario Maestri: No Brasil e no mundo, as formas
de organização política tradicional dos trabalhadores fracassam, entravaram ou mostram-se improcedentes.
As novas propostas, no estilo Podemos, que propõem a superação da centralidade
política e organizacional do mundo do trabalho, já foram engolidas pelo ralo da
história, com a traição histórica da direção do Syriza. Essa novidade chega entre nós com traços senis,
através da Rede, de Marina
Silva, desde o berço sustentada em
forma despudorada pelo grande capital. O que não impede que, eventualmente,
avance eleitoralmente, devido ao enorme vazio político deixado pela débâcle petista.
Correio da Cidadania: Como deveria
se manifestar o campo de esquerda e progressista, diante do processo de
impeachment?
Mario Maestri: O fundamental é quem está
derrubando o governo. Do ponto de vista das instituições burguesas, não há
razão para a deposição de Dilma Rousseff. Do ponto de vista da moralidade
social, o governo perdeu qualquer legalidade, devido ao citado estelionato
eleitoral. Se o governo estivesse sendo defenestrado pelos trabalhadores,
assalariados e população de bem, seria ato legal, a ser apoiado. Porém, a
deposição é empreendida pela direita tradicional, para radicalizar a
exploração. É deposição política, golpista, antipopular e antinacional.
Ela também tem como objetivo de aprofundar a maré
conservadora na América do Sul, que avança forte na Argentina, Venezuela etc. A
esquerda deve se pronunciar, claramente, contra o impeachment e, se necessário,
tapar o nariz e sair às ruas, opondo-se a ele, junto com o bloco petista. Mas deve levantar suas
próprias bandeiras, deixando claro o combate sem contemplação ao governo e ao
PT, como um todo. Em verdade, essa luta pode, se bem encaminhada, apoiar a
reconstituição política do movimento social. Por isso a importância, para o
grande capital, das organizações de esquerda que apoiam ou se mantêm neutras
diante do impeachment. Portanto,
não ao impeachment e nenhum
apoio ao governo Dilma!
Correio da Cidadania: Outro ponto
discutido neste 2015 foi o grau de esgotamento do lulismo, para alguns
irrecuperável, para outros capaz de renascer. Como situa este fenômeno político
que marca o início do século brasileiro à luz do ano que finda?
Mario Maestri: Algo que se esgota, é porque teve
vigor, algum dia. O lulismo foi um projeto de rentabilização do grande capital
e de manipulação e desorganização do movimento social, para sua melhor e mais
ampla e fácil exploração. Em um sentido geral, o lulismo foi sempre um projeto
contrarrevolucionário para os anticapitalistas. Ele concedeu pouco ao mundo
social e tudo que foi possível e um pouco mais ao grande capital, quando a
economia expandia com a valorização das matérias primas. O salário mínimo foi
mantido radicalmente abaixo de seu valor, prosseguindo a hiperexploração da
população. Procedeu-se assalto ao fundo de garantia dos trabalhadores, em prol
do grande capital. Entregaram os pensionistas ao cutelo do capital, com os
créditos consignados. Permitiu-se assalto jamais visto da população pelos
bancos e financeiras. Degradou-se a educação, a saúde, a segurança. A lista é
praticamente sem fim.
Correio da Cidadania: Muitos falam
de um avanço do Brasil cidadão, nesses anos. Como vê essa realidade?
Mario Maestri: Foi igualmente imensa a prostituição
política, civil, cultural e ideológica do Brasil sob o petismo. Durante os
treze últimos anos, os últimos generais-ditadores, torturadores etc. morreram
em suas camas intocados. O Brasil dirigiu e participou da ocupação militar do
Haiti, por pedido dos Estados Unidos. Sobretudo o fundamentalismo evangélico
foi prestigiado e agraciado pelo petismo com favores de todo tipo. Não houve
qualquer iniciativa em prol do direito de interrupção da gravidez para a mulher
e no combate da homofobia, com centenas de milhares de vítimas. Vivemos sob o
mais desbragado contubérnio dos grandes dirigentes petistas, comandados por
Lula da Silva e Dilma Rousseff, com os políticos mais conservadores e corruptos
e os grandes empresários, com o resultado que hoje presenciamos.
Correio da Cidadania: Mas não
houve modificação estrutural de destaque no Brasil desses anos?
Mario Maestri: Jamais empreendeu-se modificação
da estrutura da propriedade, a não ser em favor dos proprietários. Durante todo
o ciclo petista, aprofundaram-se as privatizações e restringiu-se o espaço
público produtivo. O pouco que os trabalhadores conquistaram nesses anos está
agora perdendo em forma galopante, com juros, na guilhotina da inflação, do
aumento do preço da luz, do desemprego, do confisco de direito. O grande
capital pagou, e pagou bem, pelos serviços do senhor Lula da Silva.
É interessante que nesse momento a Justiça investigue se
as empreiteiras remuneraram o senhor Lula da Silva, através de sua ONG e das
ditas conferências milionárias, em forma benévola, agradecidas pelos serviços
gerais prestados, ou como remuneração de serviços singulares. Do ponto de vista
do mundo do trabalho, a indecência é a mesma.
Não temos, porém, que diabolizar o senhor Lula da Silva.
Ele é apenas a expressão maior de toda uma geração política que se serviu do
nome dos trabalhadores, para objetivos próprios e privados, em forma mais ou
menos aberta, mais ou menos desqualificada. Lula da Silva era no passado um
cadáver vivo, saltitante, agora, é um morto que anda, ao estilo dos walking deads dos programas
estadunidenses.
Correio da Cidadania: O que o
atual quadro ilustra da democracia brasileira e seus 30 anos de construção?
Seria Eduardo Cunha, que sozinho praticamente interditou a política e, de
resto, todo o país, um subproduto de um fracasso bem maior do Brasil?
Mario Maestri: Não temos que supervalorizar o
papel do Eduardo Cunha. Ainda mais que, de um momento para o outro, ele pode
terminar no ralo da Justiça. Ele é apenas expressão da decomposição do mundo
político brasileiro, ao igual que uma presidenta que, no dia seguinte da
eleição, anuncia que tudo que dissera era mentirinha. Ou de um sindicalista que
fala do seu tempo de trabalhador e vive em contubérnio com os empreiteiros,
industrialistas e fazendeiros! De deputado de que se diz comunista e se
transforma no parlamento em principal defensor do agronegócio. De centenas de
milhares de homens e mulheres que ingressam no mundo político e público com o
objetivo único de progressão pessoal e financeira.
Correio da Cidadania: Há,
portanto, um fracasso geral do país?
Mario Maestri: Nossa percepção da sociedade
brasileira é limitada. Somos aglomerado continental de colônias luso-americanas
nascido em 1822 para a defesa da escravidão. Ou seja, em defesa do direito de
propriedade do empresário sobre o trabalhador! De 1889 a 1930, esteve vigente
no Brasil ordem republicana federalista, elitista, latifundiária e antipopular,
que seguiu mantendo a exploração dos trabalhadores então livres. O getulismo expressou a
proposta tímida de Estado burguês nacional, com inclusão controlada de parte da
população. O golpe de 1964 registrou a abdicação-incapacidade da burguesia
brasileira de acaudilhar a construção nacional.
Ela preferiu ser súcuba do capital mundial do que arriscar
seus privilégios na construção de país que fosse minimamente de todos. De lá
para cá, a decomposição da burguesia
brasileira alcançou nível abismal. Não há democracia sem um bloco
social que a sustente. Nos anos 1970, os trabalhadores ensaiaram proposta de
acaudilhar a construção de nação apoiada na reorganização social da
propriedade, da produção e do consumo. Foram os anos que produziram o PT
pró-socialista, a CUT anticapitalista e o MST que namorou o socialismo.
Porém, no geral, a montanha pariu uma geração de
ratazanas, que ocuparam e ocupam ainda gostosamente postos administrativos,
legislativos, sindicais. Um processo de regressão que, como proposto, se
radicalizou, no Brasil e no mundo, após a vitória da contrarrevolução mundial,
em 1989-90, com a dissolução da URSS e dos países de economia nacionalizada.
Não podemos fugir da necessária discussão sobre a capacidade dos trabalhadores
de emanciparem humanidade que mergulha, mais e mais, em barbárie palpável, em
todos os seus níveis.
Correio da Cidadania: O que
esperar para 2016 após um ano praticamente perdido e ainda com maus augúrios
econômicos? Tendemos a continuar vendo, a perder de vista, a aplicação deste
mesmo modelo de “desenvolvimento”?
Mario Maestri: Não se trata de um “ano perdido”,
mas de 25 anos em que o mundo social retrocedeu, no mundo e no Brasil, em seus
direitos, programas, organizações, esperanças. Vinte e cinco anos em que o
mundo do trabalho sofre regressão radical, em uma espécie de espiral negativa
que parece se projetar ao infinito.
No Brasil, antes ou quando do petismo, jamais houve
projeto de desenvolvimento, que não fosse em proveito dos diversos segmentos
dominantes do capital. Com ou sem crescimento, os trabalhadores assalariados e
população pagam a conta, sempre salgada. O que nos espera em 2016? Inflação e
desemprego, para achatar os salários. Privatizações, para engordar o capital.
Confiscos de direitos da população e dos trabalhadores. Muita violência, na
cidade e no campo. Novas e velhas doenças endêmicas, algumas delas de perfil
terrível. O domínio da privatização sobre a saúde, sobre a educação, sobre o
que resta dos bens públicos.
Nessa sociedade em literal putrefação, 2016 nos promete
muitos, mas muitos evangélicos, de todos os sabores, comandados por seus bispos
milionários e espertalhões, emergindo e infectando os mais diversos poros de
nossa sociedade. Mas, para os eternamente crédulos, o Natal trouxe a queda do
Levy e o advento do Nélson Barbosa, que já prometeu seguir em frente o “ajuste fiscal”
do anterior, com destaque para uma profunda reforma da previdência privada!
Valéria Nader é economista e
editora do Correio da Cidadania; Gabriel Brito é jornalista.
A publicação deste texto é livre, desde que citada a fonte e
o endereço eletrônico da página do Correio da Cidadania