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(Millôr Fernandes)

domingo, 6 de dezembro de 2015

No segundo dia do 5º Congresso Nacional do Psol, delegados aprovam resolução de conjuntura nacional

Domingo, 6 de dezembro de 2015
Do Site do Psol*
No segundo dia do 5º Congresso, delegados aprovam resolução de conjuntura nacional
Crédito da foto: Rafael Lavanere
O segundo dia do 5º Congresso Nacional, que acontece desde a sexta-feira (04/12), em Luiziânia-GO, foi marcado por intenso debate sobre as teses e propostas de resolução, apresentadas pelos diversos grupos políticos que compõem o partido. Por maioria, os delegados e as delegadas aprovaram a proposta de resolução defendida pela dirigente nacional do partido e militante do Setorial Nacional de Mulheres, Carolina Peters; e pelo secretário-geral da Intersindical, Edson Carneiro Índio.
Com o título “O Brasil e o atual período político”, a resolução faz uma avaliação sobre o último período da política brasileira, a atuação da bancada do partido na Câmara e o esgotamento da política de ajuste adotada pelo governo de Dilma Rousseff e pontua o papel que o partido deve desempenhar, ao lado de outras organizações sociais, políticas e sindicais do campo da esquerda.
“A vitória eleitoral de Dilma por pequena margem, seguida da guinada conservadora representada pela política econômica, retiraram do PT o que lhe restava de base social mobilizável em sua defesa. A ofensiva conservadora no Congresso, com Eduardo Cunha na Presidência da Câmara, recolocou em debate garantias e direitos já consagrados. A pauta conservadora se expressa também na agenda de direitos individuais, como na tentativa de aprovar o estatuto da família descaracterizando como tal as famílias homoafetivas e retroagindo em questões já garantidas pelo STF, como o casamento igualitário. A redução da maioridade penal, bem como o recrudescimento do populismo penal, deve ser respondida com uma campanha de massas. Em cada um destes temas cabe ao PSOL e à esquerda buscar as alianças para barrar o avanço conservador”, afirma trecho da resolução aprovada.
Sobre as eleições municipais de 2016, o documento de conjuntura também aponta os locais onde o partido terá mais peso eleitoral e qual deve ser a linha política das candidaturas. “A disputa eleitoral de 2016 adquire um papel importantíssimo. É inegável o crescimento do PSOL como referência política de esquerda particularmente nas capitais. Em cidades como Porto Alegre, Florianópolis, Rio de Janeiro, Recife, Fortaleza, Belém e Macapá temos a perspectiva de disputar o poder local ou pelo menos de ter peso real na disputa. A demarcação política em relação ao governo Dilma e à oposição conservadora devem nortear as campanhas e a política de alianças. Disputar o apoio de movimentos organizados da sociedade, construir processos abertos e participativos de elaboração de programas e atrair todos aqueles que possam se somar a uma concepção de esquerda é nossa tarefa”.
Confira abaixo o texto completo da resolução de conjuntura, aprovada no 5º Congresso Nacional do PSOL.
O Brasil e o atual período político

O agravamento da crise e a opção do governo Dilma para a aplicação de um ajuste fiscal conservador apontam o fim do ciclo petista.
Em 12 anos, milhões de brasileiros ascenderam entre a pobreza extrema, a pobreza e a classe média. A massificação dos programas sociais, o aumento real do salário mínimo e aposentadorias e a expansão do crédito incorporou milhões ao mercado de consumo. Essa inserção aconteceu, no entanto, pela ampliação do consumo e não pela extensão dos direitos sociais.
54 milhões de brasileiros possuem plano de saúde particular num quadro de baixo investimento na saúde pública. A expansão da frota automobilística, turbinada por incentivos fiscais, agrava o problema de mobilidade urbana sem que os governos resolvam as graves insuficiências do caro e ruim transporte público. O aumento das matrículas nas redes privadas de ensino completa o quadro de busca de soluções individuais para problemas coletivos.
O fracasso dos governos Lula e Dilma em garantir estes direitos foi a senha para o “salve-se quem puder”. A ascensão pelo consumo, e não pela ampliação de direitos, formou consumidores e não cidadãos, fazendo com que os que ascenderam reproduzissem padrões de consumo, valores, comportamento e opções eleitorais das camadas sociais imediatamente acima de si mesmas.
Esse fenômeno explica a crescente retomada da influência eleitoral da direita tradicional e o significativo aumento de sua capacidade de mobilização. Já nas jornadas de junho de 2013, em que pese o seu caráter geral progressista, a direita começava a disputar a agenda política das ruas.
A vitória eleitoral de Dilma por pequena margem, seguida da guinada conservadora representada pela política econômica, retiraram do PT o que lhe restava de base social mobilizável em sua defesa.
A ofensiva conservadora no Congresso, com Eduardo Cunha na Presidência da Câmara, recolocou em debate garantias e direitos já consagrados. A pauta conservadora se expressa também na agenda de direitos individuais, como na tentativa de aprovar o estatuto da família descaracterizando como tal as famílias homoafetivas e retroagindo em questões já garantidas pelo STF, como o casamento igualitário. A redução da maioridade penal, bem como o recrudescimento do populismo penal, deve ser respondida com uma campanha de massas.
Em cada um destes temas cabe ao PSOL e à esquerda buscar as alianças para barrar o avanço conservador. Certamente não serão as mesmas em cada questão. Setores da direita liberal podem se somar na resistência contra o conservadorismo nas pautas de costumes. Setores religiosos não devem ser tratados como bloco homogêneo, mas como um setor que pode ser disputado.
Devemos ter especial atenção com partes da base do governo que vêm se movimentando em oposição ao ajuste fiscal de Dilma e Levy. Alguns poderão evoluir até o rompimento com o governo e com os partidos da base, em particular o PT. Outros farão apenas demarcações pontuais visando se posicionarem melhor na disputa do PT após 2018.
Mesa teses Entendendo as diferenças e limitações de cada caso, fortalecer este diálogo é fundamental, porque nos move para a defesa das classes trabalhadoras. Por isso, o PSOL deve fomentar a unidade de todos os que queiram lutar. O centro da tática no próximo período é fomentar uma frente social e política em favor de um programa à esquerda para a crise, onde o PSOL e as frentes de massas em que atuamos cumpram um papel central.
As classes trabalhadoras, o povo pobre e a juventude, têm reagido à crise. Em 2014 mais de 1.800 greves ocorreram no país. A luta contra o aprofundamento da terceirização unificou quase todo o movimento sindical e outros setores populares. Movimentos de luta urbana por moradia, como o MTST, e por transporte, como o MPL, ampliam suas mobilizações e ganham um novo protagonismo. A luta dos povos indígenas contra a aprovação da PEC 215 e pelo fim do massacre dos Guarani-Kaiowás, conquista aliados na sociedade. A Primavera das Mulheres desencadeou em nível nacional intensas mobilizações pelo Fora Cunha e pela derrota da agenda regressiva contra direitos conquistados pelas mulheres e a sociedade civil. E bem recentemente, a mobilização com ocupação de escolas por parte dos estudantes secundaristas de São Paulo logrou uma vitória extraordinária com a queda do secretário estadual da educação e a revogação do plano privatista da educação, urdido pelo governo Alckmim.
A construção da Frente Povo Sem Medo abre a possibilidade de unir o PSOL com diversas entidades e movimentos populares numa linha de mobilização de massas centrada no rechaço do ajuste do governo federal e na rejeição da pauta política da direita reacionária. Cria, portanto, melhores condições para a visibilização de uma saída à esquerda da crise, melhorando as condições de luta para os trabalhadores e o povo.
O ajuste promovido pelo governo Dilma tem como objetivo acalmar os mercados com relação à solvência da dívida. Estimada em R$ 2,5 trilhões, a dívida pública bruta correspondia em dezembro de 2014 a 59% do PIB, enquanto a líquida, descontadas as reservas, chegava a 35%.
Se considerarmos que a dívida pública do Japão corresponde a 230% do PIB, a da Itália a 132% e a dos EUA a 101%, concluímos que o problema da dívida brasileira é menos o seu tamanho, relativamente baixo, e mais o seu custo, o maior do mundo.
Ao contrário do que dizem a mídia e o discurso conservadores, esta dívida não resulta de gastos excessivos do Estado em atividades fins ou em custeio, mas nas taxas de juros absurdas que a remuneram, criando o maior mecanismo de transferência regressiva de renda do planeta.
Enquanto as dívidas dos EUA e do Japão são remuneradas com taxas negativas, inferiores à inflação, desvalorizando-as de um ano para o outro, a dívida brasileira é hoje remunerada a 14,15% ao ano, pela taxa Selic, para uma estimativa de inflação de cerca de 10%.
Estes valores representam mais de seis vezes o custo anual do programa Bolsa Família. Desde a implantação do Plano Real, a dívida pública brasileira cresceu de pouco mais de R$ 30 bilhões para 2,5 trilhões, sem que isso fosse, salvo exceção de alguns anos da década de 90 e de 2014, resultado de gastos públicos superiores à arrecadação tributária.
Esta é uma política deliberada dos setores rentistas da sociedade brasileira, que buscam compensar a perda dos seus ganhos, fruto do controle do processo inflacionário, com este mecanismo de obtenção de renda via dívida publica. Bancos, grandes empresas, pessoas físicas de alta renda e investidores estrangeiros se alimentam deste esquema perverso.
Em 12 anos de governos do PT, foi gerado mais de R$1 trilhão em superávits primários para alimentar esse modelo. E mesmo assim, a dívida bruta aumentou significativamente. A urgência de uma auditoria que desnude este processo é condição para se formar uma base política capaz de derrotar os rentistas, checar a legalidade do mecanismo e possibilitar que o Brasil retome o controle público total sobre os recursos arrecadados.
Outra questão central é a reforma tributária. Concentrada em impostos indiretos que oneram proporcionalmente mais a população pobre, com pouca progressividade no Imposto de Renda e baixíssimas alíquotas sobre o patrimônio, o sistema tributário brasileiro é profundamente injusto.
Enquanto nos EUA o imposto sobre a renda chega a 46,1% e no Chile a 45%, no Brasil a alíquota máxima é de 27,5%. Enquanto nos EUA o imposto sobre heranças chega a 55%, no Brasil o limite é 4%. Esta estrutura fiscal consolida patrimônios familiares por gerações, agravando a concentração de riqueza.
Avançar na regulamentação do imposto sobre grandes fortunas e heranças, bem como promover uma revisão na tabela do Imposto de Renda e reajustar a Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) dos bancos, abriria espaço para a redução dos impostos que oneram a produção e o consumo.
A crise ambiental
A enorme desigualdade de consumo de recursos naturais e energéticos entre as sociedades ricas, ou entre as camadas ricas das sociedades mais pobres e bilhões de trabalhadores, é um dos mais graves problemas com que a humanidade se defronta. Por um lado, a aspiração legitima de trabalhadores em atingir os padrões de consumo da parcela mais rica; e de outro, a impossibilidade de que isso ocorra pela simples ampliação dos fatores de produção. Compatibilizar um programa que dialogue com as expectativas dos trabalhadores, mas opere pela mudança dos paradigmas de consumo é um enorme desafio.
Qualquer política ambiental em nível global deve levar claramente em conta as desigualdades entre classes e países, responsabilizando mais os países centrais, penalizando mais o consumo das classes de mais alta renda e garantindo investimentos em novas tecnologias sustentáveis.
O atual ciclo de desenvolvimento capitalista tem se caracterizado pela transferência para os países da periferia das indústrias intensivas em consumo de energia e materiais, fazendo uma espécie de exportação da poluição. Esse movimento torna a luta ambiental no Brasil eminentemente anticapitalista e anti-imperialista.
Cabe à esquerda socialista associar a luta pelo planeta à luta pela igualdade, não aceitando a perpetuação da desigualdade já estabelecida. Da mesma forma, associar a preservação de formas de viver tradicionais – como de indígenas e quilombolas – com condições dignas de vida é dever de todos os socialistas.
Priorizar investimentos públicos em soluções de transporte coletivo, desestimular o transporte individual, ampliar a geração de energias com menor impacto ambiental e ampliar a reciclagem de materiais são medidas que devemos defender.
A crise politica e as eleições de 2016 e 2018
A guinada à direita na política econômica e os desdobramentos das denuncias de corrupção na Petrobras fragilizaram o governo Dilma desde o seu inicio. O aumento das bancadas conservadoras no Congresso e a total dependência do governo em relação ao PMDB para garantir a “governabilidade” consolidam o quadro.
Nosso problema é que ainda não temos no PSOL uma alternativa política com suficiente enraizamento de massas para que possamos nos colocar de forma realista como alternativa de poder em 2018. 61. Nosso acúmulo, embora crescente, foi inferior ao que precisávamos para que tivéssemos possibilidades concretas de fazer do PSOL uma alternativa de poder. Mas devemos apontar desde já a necessidade de apresentar uma candidatura da oposição de esquerda em 2018, mesmo sabendo de suas limitações.
A disputa eleitoral de 2016 adquire um papel importantíssimo. É inegável o crescimento do PSOL como referência política de esquerda particularmente nas capitais. Em cidades como Porto Alegre, Florianópolis, Rio de Janeiro, Recife, Fortaleza, Belém e Macapá temos a perspectiva de disputar o poder local ou pelo menos de ter peso real na disputa.
A demarcação política em relação ao governo Dilma e à oposição conservadora devem nortear as campanhas e a política de alianças. Disputar o apoio de movimentos organizados da sociedade, construir processos abertos e participativos de elaboração de programas e atrair todos aqueles que possam se somar a uma concepção de esquerda é nossa tarefa.
Afirmamos a necessidade de construir alianças com os partidos que nacionalmente se colocam como oposição de esquerda, como o PSTU e PCB. Devemos também dialogar com os setores mais à esquerda dos partidos da base do governo que estejam em contradição. Movimentos como o “petistas com Freixo” devem ser estimulados onde possível.
Alianças para além destes marcos deverão ser tratadas como exceção e analisadas criteriosamente pelas direções estaduais e nacional. Vencer a disputa eleitoral em cidades de porte médio e grande e assumir as responsabilidades e riscos de sua gestão é fundamental para o PSOL passar a ser visto como alternativa concreta para o Brasil.
Da redação do PSOL Nacional em Luziânia