Quarta, 14 de setembro de 2016
Do MPF
Não cabe retrocesso, o licenciamento é consequência
dos princípios constitucionais do país, afirmou procuradora da
República Fabiana Schneider em seminário no Congresso Nacional
Para MPF e representantes da sociedade civil, insegurança
jurídica vai aumentar caso licenciamento for enfraquecido (créditos da
foto: Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados)
Vários projetos de lei e até de emenda à Constituição
estão em debate em Brasília com uma única temática: o licenciamento
ambiental. Atacado por empresários como obstáculo ao desenvolvimento do
país, o licenciamento é o principal instrumento de controle de
atividades econômicas potencialmente poluidoras que existe no
ordenamento jurídico brasileiro. Diante das várias propostas que
surgiram no Congresso Nacional – algumas inclusive prevendo a extinção
do licenciamento – o poder Executivo, por meio do Ministério do Meio
Ambiente e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), prepara um
texto que sirva de substitutivo para ser votado no parlamento. O assunto
foi tema de um longo seminário nessa terça, 13 de setembro, na Câmara
dos Deputados.
Presentes ao seminário, representantes da sociedade civil,
de organizações não governamentais e o Ministério Público Federal (MPF)
foram unânimes em expressar preocupação com as propostas existentes.
“Estamos vinculados aos princípios da precaução, da participação, da
vedação ao retrocesso e do poluidor-pagador. Não há como fazer mudanças
legislativas tentando se afastar desses princípios, porque estaremos nos
afastando do estado constitucional”, disse a procuradora da República
Fabiana Schneider, que representou o MPF.
“Qualquer proposta de dispensa de licenciamento em
atividade potencialmente poluidora é inconstitucional”, disse Maurício
Guetta, advogado do Instituto Socioambiental (ISA). "Não queremos novas
Marianas, não queremos novas Belo Monte. Não temos o direito de errar de
novo. Faço um apelo a essa casa: não votem legislação em atropelo”,
disse Malu Ribeiro, da organização SOS Mata Atlântica.
Entre as propostas em tramitação, a proposta de Emenda
Constitucional (PEC) 65/2012 e o Projeto de Lei do Senado (PLS) 654/2015
na prática extinguem o licenciamento ambiental. A primeira institui que
a apresentação de Estudos de Impacto implica automaticamente concessão
de licença, excluindo qualquer controle social do procedimento. A
segunda estabelece o chamado fast track, um rito sumário que também significaria o fim do controle social.
A terceira proposta em trâmite é de uma lei geral do
licenciamento, que está com relatoria do deputado Ricardo Trípoli, da
Comissão de Meio Ambiente da Câmara. A esse anteprojeto – PL 3729/2004 –
o governo federal prepara um texto substitutivo, que tem sido debatido
há alguns meses, inclusive com organizações da sociedade civil. A
presidente do Ibama, Suely Vaz, presente ao seminário, detalhou as
premissas do projeto do Executivo.
“A lei geral do licenciamento pretende criar uma norma que
contemple da usina nuclear ao posto de gasolina”, disse. O projeto prevê
ritos simplificados para o licenciamento de autoridades com menor
potencial poluidor, racionalizar os termos de referência (questionários
que dão origem aos estudos de impacto ambiental), fixa prazos máximos
para as análises e até uma metodologia para dispensa de licenciamento.
Um dos pontos polêmicos é a limitação da participação das autoridades
intervenientes – órgãos que se pronunciam em áreas em relação às quais o
Ibama não tem competência, como em caso de impactos sobre povos
indígenas, quilombolas ou à saúde da população.
A pressão das entidades representativas de agentes
econômicos é para acelerar os trâmites ambientais e reduzir etapas. A
chamada segurança jurídica foi mencionada por todos os representantes do
empresariado presentes ao seminário. “A PEC 65 é inviável
constitucionalmente, mas é um grito de desespero de quem quer empreender
e investir diante da situação atual”, disse Rodrigo Justus, da
Confederação Nacional da Agricultura (CNA). O representante da
Confederação Nacional da Indústria (CNI), Marcos Guerra, também se disse
contrário à PEC 65, mas elogiou o projeto que prevê a fixação de prazos
para aumentar a celeridade do licenciamento e cobrou a manutenção da
proposta de desvincular o licenciamento das manifestações de órgãos
intervenientes. A CNA também cobrou que existam ritos diferentes para
atividade agropecuária: “Nenhum país do mundo tem licenciamento para a
produção de alimentos”, disse Justus.
Intervenientes - Ao discurso da celeridade proferido pelas entidades empresariais, os representantes da sociedade civil contrapuseram o discurso da precaução ambiental e criticaram os projetos apresentados pelas empresas brasileiras. “O que dificulta aprovação de projetos no Brasil não é o licenciamento, é a baixa qualidade de projetos que atendem interesses pouco republicanos”, disse Malu Ribeiro, da SOS Mata Atlântica.
Intervenientes - Ao discurso da celeridade proferido pelas entidades empresariais, os representantes da sociedade civil contrapuseram o discurso da precaução ambiental e criticaram os projetos apresentados pelas empresas brasileiras. “O que dificulta aprovação de projetos no Brasil não é o licenciamento, é a baixa qualidade de projetos que atendem interesses pouco republicanos”, disse Malu Ribeiro, da SOS Mata Atlântica.
“Ibama e órgãos estaduais não têm competência jurídica para
se manifestar sobre impactos em terras indígenas. Se a manifestação da
Funai for excluída, vai haver uma corrida ao Judiciário, gerando mais
insegurança jurídica. Não se trata de estabelecer prazos, se trata de
dar condições para que esses órgãos cumpram suas missões
institucionais”, disse Maurício Guetta, do ISA.
“Não existe metro quadrado na Amazônia que não esteja
ocupado por pessoas. Então não se pode afastar a posição dos órgãos
intervenientes no processo. É preciso respeitar os direitos dos povos
tradicionais”, disse Fabiana Schneider.