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(Millôr Fernandes)

terça-feira, 30 de junho de 2020

Ministério Público do RJ requer ao STF que casse decisão do Tribunal de Justiça que estendeu foro por prerrogativa de função a Flávio Bolsonaro em âmbito estadual

Terça, 30 de junho de 2020

O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por meio da Subprocuradoria-Geral de Justiça de Assuntos Criminais e de Direitos Humanos e da Assessoria de Recursos Constitucionais Criminais (ARC Criminal/MPRJ), requereu nesta segunda-feira (29/06) junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de Reclamação, o deferimento de medida liminar para cassar a decisão da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) que estendeu foro por prerrogativa de função ao senador Flávio Bolsonaro em âmbito estadual. O MPRJ requer a autorização para a continuidade das investigações contra Flávio Bolsonaro pelos fatos ocorridos enquanto deputado estadual, em primeiro grau, com a atribuição do Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (GAECC/MPRJ) e sob a supervisão das medidas do Juízo da 27ª Vara Criminal da Capital (TJRJ).

De acordo com o documento encaminhado ao presidente do STF, ministro Dias Toffoli, o julgado da 3ª Câmara Criminal do TJRJ, proferido na última quinta-feira (25/06), nos autos do HC nº 0011759-58.2020.8.19.0000, descumpriu as decisões proferidas pelo STF na RCL nº 32.989/RJ, no julgamento do mérito da ADIN n. 2.797/DF, e na decisão pertinente ao julgamento da questão de ordem da Ação Penal (AP) 937, usurpando, assim, a competência da Suprema Corte para definir os limites do foro por prerrogativa de função de senadores da república e estendeu foro por prerrogativa de função a ex-ocupante do cargo de deputado estadual. A Reclamação proposta é cabível porque a decisão em questão desrespeitou decisões monocráticas e colegiadas da Corte Suprema. Além da medida liminar, o MPRJ também requer a declaração de nulidade do acórdão da 3ª Câmara Criminal.

No caso específico, o MPRJ busca garantir a autoridade e a eficácia da decisão proferida pelo ministro Marco Aurélio Mello nos autos da Reclamação nº 32.989 que estipulou que o senador Flávio Bolsonaro não possui foro por prerrogativa de função concernente a fatos investigados pelo MPRJ. O julgamento do HC também se mostrou atentatório à autoridade de coisa julgada constitucional decorrente do julgamento da ADIN 2.797/DF que reconheceu como inconstitucional a Lei 10.628/2002 que criou foro por prerrogativa de função para ex-ocupantes de cargos públicos, ressuscitando a anteriormente cancelada Súmula n. 394 da jurisprudência dominante do STF. O julgamento da Corte Estadual, ainda segundo o documento, também limitou o alcance de outra decisão do STF, proferida em Questão de Ordem na Ação Penal nº 937, tendo criado, indevidamente, uma nova exceção à mitigação do alcance do foro privilegiado estabelecido pela Suprema Corte que só teria aplicação para senadores oriundos do Rio de Janeiro, contrariando diversos precedentes jurisprudenciais dos Tribunais Superiores, que, apreciando situações análogas, sempre se pautaram pelo entendimento do Egrégio Supremo Tribunal Federal, além de ferir o basilar princípio da isonomia. Ou seja, senadores da República oriundos do Rio de Janeiro que já tivessem ocupado outros cargos públicos com foro por prerrogativa no TJRJ e que fossem investigados ou acusados por condutas típicas cometidas no exercício dos cargos anteriores manteriam foro por prerrogativa de função junto ao Tribunal de Justiça e decorrente do cargo não mais ocupado. Portanto, a decisão da 3ª Colenda Câmara Criminal promoveu uma 'inovação' indevida em nosso ordenamento, pelo que não merece prosperar”, descreve trecho do documento que acrescenta ter a decisão acabado por conferir uma vantagem de cunho pessoal, privilégio esse incompatível com o estado republicano.

Histórico

A primeira medida tomada pelos advogados do senador Flávio Bolsonaro, após ser notificado para prestar depoimento perante o MPRJ sobre os fatos investigados no PIC/MPRJ nº 2018.00452470 foi alegar que possuiria foro por prerrogativa de função perante o STF e, em 16 janeiro de 2019, o senador ajuizou a Reclamação nº 32.989 perante o Supremo. Inicialmente o ministro Luiz Fux, em regime de plantão, suspendeu o curso da investigação até que o ministro relator se pronunciasse “quanto ao pedido de avocação do procedimento e de declaração de ilegalidade das provas que o instruíram”. Ao receber os autos o ministro Marco Aurélio, em 1º de fevereiro de 2019, negou seguimento à Reclamação. A investigação formalizada no PIC/MPRJ nº 2018.00452470 prosseguiu regularmente sob a supervisão do Juízo da 27ª Vara Criminal da Comarca da Capital quanto às diligências submetidas à reserva de jurisdição.

Em 28 de agosto de 2019, os advogados do senador, apesar de cientes da decisão do STF sobre a inaplicabilidade da prerrogativa de foro, impetraram o HC nº 0054306-50.2019.8.19.0000 perante o TJRJ alegando que caberia ao Órgão Especial do TJRJ julgar o atual senador da República, pois os fatos investigados foram praticados durante o exercício do mandato de deputado estadual, apesar do mandado já findado. A desembargadora Mônica Tolledo de Oliveira indeferiu a medida liminar em 02 de setembro de 2019, fundamentando sua decisão em precedentes do STF e, em especial, na decisão da Questão de Ordem da Ação Penal nº 874/DF, quando o Superior Tribunal de Justiça remeteu para a primeira instância a ação que tramitava naquela Corte em face do governador Wellington Dias. Após a desistência por parte dos impetrantes, o habeas corpus foi extinto em 1º de outubro de 2019. Em 02 de março de 2020 os advogados do senador insistiram e renovaram a alegação de foro privilegiado para o senador ao impetrar o habeas corpus nº 0011759-58.2020.8.19.0000, que culminou com o julgamento pelo Colegiado da 3ª Câmara Criminal do TJRJ cuja validade ora se contesta.


Fonte: MPRJ