Por Alberto Dines
Entre o jocoso e o sério, entre o cômico e o dramático, o
clima estava insuportável: tenso, retesado. Em suspenso, incapaz de prever o
desfecho, a plateia mal respirava. Nos bastidores, a paralisia ganhava
dimensões de anarquia — sem script nem diretor, o espetáculo era empurrado
pelos pressentimentos e a dinâmica do desespero. De repente, com a brusca
irrupção em cena de apenas um ator cônscio do seu papel e impregnado pela
compulsão de buscar a verdade e resgatar o que sobrou da honra do pai,
apertaram-se os laços. Corda esticada, a tragédia consumou-se.
Sabia-se que o senador Delcídio Amaral, boa pinta e boa
praça, também estaria na lista dos atingidos pelo jorro dos dutos da Petrobrás
– quem não estava ? – sabia-se que Nestor Cerveró, diretor da área internacional,
estava seriamente implicado na teia de escândalos da petroleira – não era o
único, outros colegas estavam em idênticas condições redigindo as respectivas
confissões. Ele talvez pior do que os demais.
Menos conhecidas eram a habilidade, generosidade e
fidelidade do Midas progressista, o banqueiro André Esteves. Absolutamente
desconhecido era o advogado Edson Ribeiro contratado para defender Nestor
Cerveró e o funcionário Diogo Ferreira, chefe-de-gabinete do senador Delcídio
Uma única vez, na véspera do Carnaval, apareceu no
noticiário o nome de Bernardo Cerveró ao persuadir os fabricantes de máscaras a
não reproduzir o rosto do pai e evitar a galhofa em torno do defeito no rosto.
Em espetacular exibição dos seus talentos para surpreender e
produzir reviravoltas, juntos ou associados, o destino, os fados, a fortuna, os
idos romanos e o imortal engenho de William Shakespeare, providenciaram uma
reunião do grupo no dia 4 de novembro em confortável hotel em Brasília e
premiaram o único que ali estava para cumprir um papel decente, piedoso.
Equipado com dois celulares (um para ser ostensivamente desligado como acontece
em reuniões deste tipo), com total domínio de gestos, atitude e voz, Bernardo
Cerveró prontificou-se a ouvir a proposta de recompensa que lhe faria Delcídio
Amaral pela retirada do seu nome (e de outros) no texto da delação.
O teor da proposta tornou-se mais conhecido do que a
escalação da seleção que joga uma final da Copa do Mundo. Envergonhada com o
que ouviu nas rádios e telejornais da manhã da última quarta-feira, a Senhora
Dona República, permitiu-se gestos extremos – prender um senador com mandato em
flagrante delito (obstrução de investigações) e calar o corporativismo dos
senadores que em votação aberta concordaram com a ordem de prisão emitida pelo
STF.
O mundo veio abaixo, literalmente. E o que ainda ficou de
pé, ruirá com grande velocidade. O aedes brasiliensis (para os menos versados
no idioma do Lácio, o “coisa ruim brasileiro”, Eduardo Cunha), está com os dias
contados. E não só ele. A pasmaceira que tanto serve aos delinquentes será
naturalmente superada pela simbiose das forças postas em movimento.
Algo se move. O fim deste 2015 tem condições de ser menos
tóxico e trágico se as bruxas com suas maquinações conseguirem encerrar o miserável
ciclo sem vencidos nem vencedores. Equalizados e fatigados, só assim será
possível programar a nova temporada com repertório mais edificante e o dramatis
personae menos canastrão.
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A edição do “Jornal das 10” da GloboNews, na última
quinta-feira, exibiu em alta definição as contradições & incompreensões
entre os profissionais que buscam qualificar o conteúdo e os executivos que
apostam todas as fichas em picos de audiência.
Enquanto a editora Renata Loprete e o seu time de
comentaristas políticos tentava antecipar-se aos jornais do dia seguinte,
alguma chefia – talvez a financeira – insistia em interromper seu trabalho para
exibir as sensacionais e palpitantes tomadas do helicóptero mostrando… o
tranquilíssimo comboio de viaturas da PF conduzindo o banqueiro André Esteves
para o rotineiro exame no IML antes de hospedar-se no presídio Ary Franco.
Para que tanta pirotecnia? Naquele momento o
cidadão-assinante só queria digerir as informações que recebera durante o dia.
Aquele faz de conta de filme americano de ação foi rigorosamente provinciano e
subdesenvolvido