Sexta, 18 de dezembro de 2015
Da Tribuna da Internet

Charge de Aroeira (reprodução de O Dia)
Por Jorge Béja
Uma questão fundamental passou despercebida ontem no STF, quando o
plenário terminou de colher o voto de seus 11 integrantes e proclamou o
resultado do julgamento da ação de Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental (ADPF) proposta pelo PCdoB contra a Lei do
Impeachment. É até compreensível que não tenha sido notada. Afinal de
contas, na história do STF e de todo o Judiciário nacional, nenhuma
outra ação foi tão rapidamente julgada. Começou e terminou em sete dias.
Nem nos Juizados Cíveis Especiais (pequenas causas) os processos
tramitam tão rápido. E foi processo mais do que complexo.
Envolveu vários temas constitucionais de alta indagação, arguidos em
petição com 74 páginas, e opostos em face de grande número de partes e
com múltiplos pedidos. E cada uma dessas partes se fez presente, sem
protelação e todos com seus advogados. Tudo seguiu rigorosamente dentro
da legalidade. Não o ocorreu o menor prejuízo para que todos pudessem
exercitar o amplo direito de defesa, escrita e oral. Foi histórico,
eloquente e didático. Quem viu, muito aprendeu. Como seria bom se na
Justiça todos os processos fossem assim! Nem era preciso que fossem tão
rápidos.
QUASE PERFEITO
Tudo foi perfeito. Ou quase perfeito. Isto porque caso a decisão de
ontem do STF fique como ficou, a votação secreta da Câmara que elegeu a
Comissão Especial formada pela chapa 2 (chapa avulsa) não foi alcançada
nem desfeita pelo resultado do julgamento da ADPF que decidiu pelo voto
aberto. O subtítulo da manchete de hoje do O Globo diz “comissão eleita
na Câmara por voto secreto é anulada”. Não, não foi.
Digo agora, neste artigo da Tribuna da Internet,
que aquela votação ainda se mantém, hígida e válida. Nem precisa ser
repetida, com nova votação, às claras. Pode até parecer heresia essa
afirmação, mas não é. Tudo por causa de um detalhe, de um pedido do
PCdoB que passou despercebido pelos ministros do STF e que ficou
pendente de exame e decisão.
EFICÁCIA E EFEITO
As decisões proferidas em ação de Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental (ADPF) têm efeito imediato. Valem desde o momento
que a votação é encerrada. Nem precisa aguardar que o acórdão (decisão
por inteiro) seja lavrado (redigido e assinado). É o que diz o artigo
10, parágrafo 1º, da Lei nº 9882/98 que cuida especificamente da
tramitação desta ADPF: “O presidente do Tribunal determinará o imediato
cumprimento da decisão, lavrando-se o acórdão posteriormente”. Portanto,
a eficácia, o cumprimento do que ficou decidido no julgamento é
instantâneo.
Porém, para o futuro. Vale dali em diante. É o natural efeito “ex
nunc”. Para que retroaja e alcance os atos já praticados em processos em
curso, é fundamental e imprescindível que o Tribunal disponha a
respeito da modulação temporal dos efeitos do julgamento. E isso não
aconteceu. Passou despercebido. Em nenhum momento, o ministro-relator e
seus pares examinaram e decidiram a respeito desse pedido, expressamente
formulado na petição no PCdoB.
Lá está, na letra “a” no item 97 da página 69, na letra “k” da página
71 e na letra “p” da página 73, reiteradamente pedido que fosse
emprestado efeito “ex tunc” (retroativo) à decisão da Corte “abrangendo
os processos em julgamento”. Vi e ouvi pela televisão todas as duas
sessões (quarta e quinta), por inteiro. E não vi nem ouvi nenhum
ministro levantar e debater tão importante questão. Nem na proclamação
do resultado final o ministro-presidente a ela fez menção. E para que o
efeito da decisão retroagisse (“ex tunc”) e alcançasse os atos já
praticados em processos em curso, a lei 9882/99 exige pronunciamento a
respeito, como previsto no seu artigo 11. Caso contrário, só vale para o
futuro.
ATÉ AGORA, ELEIÇÃO VÁLIDA
Logo, pela omissão a respeito de tão importante e crucial pedido
expressamente formulado pelo PCdoB (se a decisão de ontem do STF tivesse
o automático efeito retroativo, os talentosos advogados do PCdoB que
produziram tão exuberante peça nem precisavam fazer tal pedido, por sua
própria desnecessidade ), a votação secreta que elegeu a chapa 2 para
formar a Comissão Especial de que trata o artigo 19 da Lei do
Impeachment até agora continua válida, por causa da lacuna, da omissão
do STF em não ter fixado o efeito retroativo (“ex tunc”) para abranger o
processo de impeachment que corre na Câmara dos Deputados.
A omissão, se percebida pelo PCdoB e/ou por qualquer outra parte que
integra do processo, ainda pode ser corrigida em 5 dias, através da
oposição dos chamados Embargos de Declaração. Depois disso e sem
embargos nesse sentido, nada mais poderá ser feito. Nem ação rescisória,
visto que contra decisão que julga procedente ADPF não cabe rescisória.
Aliás, não cabe recurso algum. A decisão é irrecorrível, diz o artigo
12 da Lei 9882/99.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Dr. Béja realmente é um
dos maiores JURISTAS brasileiros e faz muita falta no Supremo. Se
estivesse em plenário, erros primários como este jamais seriam
cometidos. Por sua importância, vamos deixar este artigo na primeira página do Blog até amanhã. (C.N.)